Nelson Évora foi vítima de racismo em discoteca de Lisboa

30 de abril 2014 - 15:25

Grupo de 16 pessoas, que incluía muitos atletas que representam Portugal nas competições internacionais, foi impedido de entrar na discoteca “Urban Beach” por “haver demasiados pretos”. Semana foi marcada por incidentes de racismo no desporto.

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Évora ilustrou a nota no Facebook com uma fotografia em que aparece ao lado do colega Bruno Costa a comer uma banana. Trata-se de uma alusão ao caso de racismo mais falado da semana, que envolveu o futebolista brasileiro Daniel Alves. Foto de Nelson Évora
Évora ilustrou a nota no Facebook com uma fotografia em que aparece ao lado do colega Bruno Costa a comer uma banana. Trata-se de uma alusão ao caso de racismo mais falado da semana, que envolveu o futebolista brasileiro Daniel Alves. Foto de Nelson Évora

Um grupo de 16 pessoas, entre as quais o atleta Nelson Évora, campeão do mundo do triplo salto em 2007 e medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Pequim em 2008, foi impedido de entrar na discoteca “Urban Beach”, em Lisboa, na noite de 19 de abril, por “haver demasiados pretos no grupo”. A denúncia foi feita pelo próprio atleta no seu Facebook.

O incidente ocorreu no dia do 30º aniversário de Évora, por iniciativa de amigos que lhe quiseram fazer uma surpresa. “Éramos um grupo de 16 pessoas com mesas pré-reservadas e não é que somos surpreendidos pelos responsáveis daquele espaço público”, escreveu o atleta, esclarecendo ainda que mais de metade do grupo era composto por “atletas que representam as cores da nossa bandeira (eu, Francis Obikwelu, Naide Gomes, Carla Tavares, Susana Costa e Rasul Dabó).”

Foi triste”

O medalha do ouro das Olimpíadas de 2008 acrescentou que foi a primeira vez que sentiu essa discriminação em Lisboa. "Tive que viver cá 23 anos da minha vida para acabar por acontecer este incidente. Foi triste", lamentou à agência Lusa.

"Coloquei isso na minha página só para que as pessoas ficassem sensibilizadas. Foi um caso que aconteceu com pessoas que representam as cores nacionais e que dão o seu melhor e que cresceram cá", sublinhou. E concluiu: “Estou cá desde os meus sete anos e sinto que pertenço aqui, cresci aqui, a minha educação foi toda feita cá em Portugal e sinto-me português. Se puder fazer algo por esta nação e torná-la mais rica, vou fazer. Vou continuar a lutar, a ganhar medalhas e, sempre que tenha oportunidade, a enaltecer a cores da nossa bandeira”.

O presidente do conselho de administração do Grupo K, Paulo Dâmaso, proprietário da discoteca, disse à Lusa que o porteiro não permitiu que o grupo entrasse porque “havia uma ou duas pessoas que estavam desenquadradas em termos do ambiente que é normal no Urban Beach”, referindo-se à roupa com quem estavam vestidos.

"Coloquei isso na minha página só para que as pessoas ficassem sensibilizadas. Foi um caso que aconteceu com pessoas que representam as cores nacionais e que dão o seu melhor e que cresceram cá."

Mas Francis Obikwelu, atleta medalha de prata nos 100 metros das Olimpíadas de Atenas, ouvido pelo Público, desmentiu o empresário: “Isso é mentira, é brincar com a cara das pessoas.” E contou que o filho do treinador João Ganço na altura falou com um dos responsáveis da discoteca, que lhe justificou a decisão por “serem demasiados pretos” – tal como Nelson Évora relatou. “Não reagimos. Fomos a outra discoteca”, lembrou Obikwelu.

Banana

Évora ilustrou a nota no Facebook com uma fotografia em que aparece ao lado do colega Bruno Costa a comer uma banana. Trata-se de uma alusão ao caso de racismo mais falado da semana, que envolveu o futebolista brasileiro Daniel Alves, jogador do Barcelona. Num jogo com o Villareal no domingo, o jogador foi insultado por um adepto do clube adversário, que lhe atirou uma banana. Dani Alves, que se preparava para marcar um canto, sem hesitação, pegou a banana, descascou-a, comeu-a, e prosseguiu o jogo. O gesto, registado pelas câmaras, tornou-se viral e desencadeou uma campanha antirracista que teve inúmeros protagonistas, tendo o também futebolista brasileiro Neymar lançado a tag #somostodosmacacos.

Racismo no desporto

Os dois episódios coincidiram praticamente com outro do mesmo tipo ocorrido nos Estados Unidos e envolvendo também racismo no desporto. O dono da equipa de basquetebol Clippers, Donald Sterling, foi surpreendido a fazer comentários racistas enquanto falava com a namorada, criticando-a por ter publicado uma fotografia de Magic Johnson: “Incomoda-me que queiras transmitir a tua ligação aos negros. Precisas fazer isso? Podes dormir com eles, podes fazer o que quiseres. A única coisa que te peço é que não os leves aos meus jogos.”

As declarações geraram uma onda de indignação, os próprios jogadores protestaram, entrando em campo com as camisas do avesso, e Sterling foi multado em 1,8 milhão de euros e provavelmente será forçado a vender a equipa.

Já o dono do Grupo K, propriedade da família Rocha, dos filhos de João Rocha, ex-presidente do Sporting, não parece preocupado com as repercussões da atitude de flagrante racismo tomada na sua discoteca.

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