"Médicos pelo Sim" banidos da Universidade Católica

12 de janeiro 2013 - 1:01

A Universidade Católica suspendeu a pós-graduação em Serviço Social na Saúde Mental, que deveria começar em fevereiro. A decisão surge após um dos grupos que defendeu a criminalização das mulheres no referendo de 2007 ter contestado a participação de personalidades que fizeram campanha pela despenalização do aborto.

PARTILHAR

A Universidade apenas respondeu por escrito à Rádio Renascença a informar que o curso já não irá arrancar no próximo mês, alegando que "constatou entretanto ter havido um lapso de tramitação formal no processo de  aprovação interna, pelos órgãos legalmente competentes da Faculdade, do mesmo". Sem fazer comentários sobre a escolha dos docentes que convidara para lecionar a pós graduação, a Universidade Católica Portuguesa afirma apenas que "o curso já não está a ser oferecido pela Faculdade, e não irá sê-lo até que a proposta científica seja aprovada nos termos correctos."

A decisão surge depois do grupo 'Mulheres em Ação' ter contestado a presença de personalidades que apelaram ao 'Sim' no referendo que permitiu o fim da pena de prisão para as mulheres que fizessem uma interrupção voluntária da gravidez nas primeiras dez semanas em estabelecimento de saúde legalmente autorizado. O comunicado citado pelo 'Público' defende que dado tratar-se de “uma instituição da Igreja” na Católica devem “ser escolhidos docentes e investigadores que, além da idoneidade profissional, primem pela integridade da doutrina”. Entre os nomes banidos da Universidade Católica estão António Leuschner (presidente do Conselho Nacional de Saúde Mental e do Hospital Magalhães de Lemos), Álvaro de Carvalho (coordenador do Programa Nacional de Saúde Mental), José Miguel Caldas de Almeida (diretor da Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa) e Francisco George (director-geral da Saúde, o único dos quatro que não fez parte dos 'Médicos pelo Sim' no referendo mas igualmente apoiante da mudança na lei portuguesa).

“Uma atitude de ayatollahs no mundo muçulmano”

“Estava tudo preparado para avançar, com financiamento assegurado e os convites feitos e aceites”, afirmou Álvaro de Carvalho ao 'Público'. O médico que coordena o Programa Nacional de Saúde Mental diz ainda que apesar da "justificação formal", a Universidade Católica tomou uma “decisão profundamente ideológica”, comparando-a a “uma atitude de ayatollahs no mundo muçulmano”. “Lamento que uma instituição universitária que respeito confunda de forma grave posições pessoais com perspectivas ideológicas e religiosas e com a actividade científica”, acrescentou.

Também António Leuschner foi surpreendido pela decisão da Católica. “Tomei conhecimento através de uma noticia numa rádio e pelo email da pessoa que me convidou a dar conta da decisão da universidade”, disse ao Correio da Manhã, lamentando que “ainda existam pessoas que não conseguem conviver no mesmo planeta com outras, que têm opiniões diferentes”. O médico que preside ao Conselho Nacional de Saúde Mental e é professor catedrático convidado no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar informou a Universidade que deixará de participar na pós-graduação em Psicogeriatria.

Carvalho e Leuchner eram responsáveis por dois dos três módulos do início do curso, dedicados à lei de saúde mental, internamento compulsivo e ao sistema e as políticas nacionais de saúde mental. Francisco George e José Miguel Caldas de Almeida iriam participar nas Conferências de Abertura do Curso. A página com o programa do plano curricular foi retirada do site da Universidade Católica, mas ainda pode ser consultada aqui.