Brasil: Lula discursa em tom conciliador na manifestação pró-Dilma

19 de março 2016 - 19:50

Mobilizações a favor do governo, “em defesa da democracia e contra o golpe”, mobilizam centenas de milhares de pessoas, embora menos que as da direita. Discurso do ex-presidente retoma o “Lula paz e amor”. Juíz do Supremo suspende a posse do ex-presidente como ministro. Por Luis Leiria.

porLuís Leiria

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Lula discursa na manifestação de S. Paulo. Foto da Agência Brasil
Lula discursa na manifestação de S. Paulo. Foto da Agência Brasil

"Relutei muito, desde agosto do ano passado, para aceitar vir para este governo. E ao aceitar este governo, veja o que aconteceu comigo, eu virei outra vez o 'Lulinha, paz e amor'. Não vou lá para brigar, vou para ajudar a companheira Dilma a fazer as coisas que ela tem que fazer neste país.” Foi com este tom conciliador que o ex-presidente Lula da Silva discursou na manifestação da Avenida Paulista, em S. Paulo, desta sexta-feira, convocada “em defesa da democracia e contra o golpe”, pela Frente Brasil Popular em resposta às mobilizações que no domingo 13 de março pediram o impeachment da presidente Dilma Rousseff.

"Não vou lá para brigar, vou para ajudar a companheira Dilma a fazer as coisas que ela tem que fazer neste país", disse Lula

Houve manifestações da Frente em defesa do governo em pelo menos 25 cidades, com uma dimensão importante. Segundo levantamento feito pelo site G1, participaram 275 mil pessoas segundo a polícia e 1,3 milhão segundo os organizadores. A da avenida Paulista teve, segundo o Instituto Datafolha, 95 mil pessoas, o que seria apenas um quinto da de domingo; os organizadores contestam esse número e afirmam que estiveram 500 mil pessoas, sustentando que o cálculo o instituto o deixa desmoralizado.

Seja como for, a participação foi superior ao esperado. 

O Data Folha fez também um levantamento dos manifestantes por idade e rendimento. Assim, comparada com a de domingo 13, a manifestação desta sexta-feira teve mais gente com menos de 36 anos (48%, contra apenas 27% na manifestação pró-impeachment) e de rendimentos mais baixos: 48% ganhavam menos de 5 salários mínimos, quando na de domingo eram apenas 27%. Visualmente era fácil verificar uma presença maior de negros do que na mobilização pró-impeachment, predominantemente branca.

STF suspende posse de Lula

Na hora que Lula discursou, ainda era ministro do governo, depois de três decisões cautelares da Justiça que suspenderam a nomeação e foram derrubadas pelos advogados do governo. Mas pouco depois do final do discurso, de 25 minutos, chegaria a notícia de que o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, concedera nova liminar (medida cautelar) suspendendo a nomeação de Lula e remetendo o seu processo de investigação de volta ao juiz Sérgio Moro, da Operação Lava Jato. A decisão ainda é passível de apelo ao plenário do STF.

Diálogo com trabalhador e com banqueiro”

Havia uma expectativa de que Lula iria radicalizar o discurso, como prometera depois de ter sido detido para prestar declarações aos investigadores da Lava Jato (condução coercitiva). Essa expectativa era principalmente alimentada pela chamada esquerda petista. Mas o tom de Lula foi o oposto. Insistiu que entrou no governo para ajudar Dilma, até porque até o final do mandato da presidente, em 2018, há tempo "suficiente para virar a história deste país". E justificou a sua presença pela capacidade de diálogo: “Dilma sabe que eu posso dialogar com trabalhador, com sem-terra, com pequeno empresário, com médio empresário, com grande empresário, com fazendeiro, com banqueiro.” E prosseguiu: “Precisamos restabelecer a paz e esperança e provar que este país é maior do que qualquer crime do planeta terra, e que este país vai sobreviver e vai ter fé."

"Há tempo "suficiente para virar a história deste país", disse Lula

Lula acusou ainda os adversários políticos de não aceitaram os resultados das eleições do ano passado, quando Dilma derrotou Aécio Neves, do PSDB, por pequena margem.

“Eles acreditaram que iriam ganhar as eleições”, disse Lula. “Quando a presidente Dilma ganha, eles, que se dizem estudados, não aceitaram. Eles estão atrapalhando a presidente Dilma a governar”, afirmando que ele próprio teve uma atitude oposta quando perdeu: “Tem gente neste país que falava em democracia da boca para fora, eu perdi eleições em 89, 94, 98, e antes em 82, para o governo de São Paulo. Em nenhum momento vocês viram eu ir para a rua protestar contra quem ganhou."

A Frente Brasil Popular reúne o Partido dos Trabalhadores, o PC do B, a Consulta Popular, as centrais sindicais CUT e CTB, o Movimento dos Sem Terra e outras organizações sociais.

Comissão do impeachment

Também na noite de quinta-feira foi eleita a comissão da Câmara de Deputados que vai apreciar o pedido de impeachment, de 65 deputados, representando proporcionalmente 24 partidos. Segundo um levantamento feito pela Folha de S. Paulo, dos 65 deputados, 40 receberam dinheiro de empresas investigadas pela operação Lava Jato para as suas campanhas eleitorais, e quatro são mesmo investigados pelos juízes da operação. A comissão elegeu para relator um deputado aliado do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que por sua vez já foi tornado réu pelo STF, acusado de corrupção no escândalo da Petrobrás, dinheiro canalizado para contas na Suíça.

Luís Leiria
Sobre o/a autor(a)

Luís Leiria

Jornalista do Esquerda.net