p.sdfootnote { margin-left: 0.5cm; text-indent: -0.5cm; margin-bottom: 0cm; font-size: 10pt; }p { margin-bottom: 0.21cm; }a.sdfootnoteanc { font-size: 57%; }
A drástica reorganização laboral empreendida pelo presidente de Cuba, Raúl Castro, mantém a população entre o preocupada, pela possibilidade de perder o emprego, e o expectante, pelo real alcance da abertura à actividade privada, que segundo estimativas poderia acolher inicialmente umas 250 000 pessoas.
Segundo o previsto, as inscrições para exercer algum dos 178 ofícios por conta própria autorizados devem começar este mês. Mas funcionários do Ministério do Trabalho e Segurança Social e do Gabinete Nacional de Administração Tributária disseram aos jornalistas desconhecer detalhes a esse respeito.
Também não foi publicada a resolução do Ministério das Finanças e Preços, que estabelece o montante dos impostos a pagar. "Quero saber quanto me custaria ter uma licença. Se os impostos são muito altos, vou continuar como até agora", comentou Caridad, modista há vários anos.
O governo propõe-se prescindir de meio milhão de postos de trabalho de agora até ao primeiro trimestre de 2011, com o argumento de aumentar a eficiência e a produtividade do trabalho, o que considera imprescindível para elevar os salários e "sustentar os enormes gastos sociais" do seu sistema socialista.
O reordenamento laboral implica conseguir que pelo menos 80% do pessoal esteja ligado directamente à produção, serviços ou outra actividade considerada fundamental.
O trabalhador declarado "disponível" pode optar por lugares na agricultura, construção ou polícia que hoje apresentam défice de pessoal ou no trabalho autónomo.
Segundo as autoridades, a eliminação dos quadros inflacionados, subsídios excessivos e gratuitidades indevidas, juntamente com libertarem o Estado dum grupo de actividades, devem permitir o financiamento dos aumentos de salários num futuro imediato, uma reivindicação muito esperada nesse sector laboral.
"Eu não quero ser polícia, nem entendo porque devo deixar a capital onde vivo desde que nasci para trabalhar no campo. Nem sequer tenho dinheiro para lançar um ofício por conta própria. Não sei o que vou fazer se perco o meu emprego", disse à IPS um jovem afro-descendente de 26 anos empregado de serviços num hotel da capital.
Castro esclareceu em Agosto que "ninguém ficará abandonado à sua sorte" e que se apoiará quem "realmente não esteja com capacidade de trabalhar (noutros empregos)". Mas nem as palavras do governante nem as assembleias explicativas realizadas nos centros de trabalho conseguiram tranquilizar os trabalhadores que temem ficar entre os excluídos.
"É uma preocupação lógica. Romper com 50 anos de paternalismo estatal não é fácil, mas este ajustamento das forças produtivas é absolutamente necessário, se queremos manter outras coisas que são valiosas, como a gratuitidade dos serviços de saúde e a educação", comentou ao IPS um economista cubano que não quis ser identificado.
Estimativas oficiais indicam que só nesses dois sectores se empregam 46,7% dos gastos correntes do orçamento do Estado, necessitado portanto de novas fontes de rendimento. O direito de cidadania de gozar de forma gratuita de serviços educativos e sanitários está garantido pela Constituição.
O arcebispo de Havana, cardeal Jaime Ortega, não deixa de admitir inquietação com a possibilidade dos despedimentos, especialmente entre os que "têm algum cargo burocrático", mas considera por outro lado que "há um pouquinho de expectativa sobre as mudanças e o êxito que possam ter (...), e em alguns há aceitação".
Em pessoas "com habilitações especiais que as tornam aptas para uma pequena empresa, um pequeno negócio (...) pode haver alegria ou entusiasmo", comentou aos jornalistas Ortega, que vê uma volta "positiva em si" em "pensar as dificuldades económicas de Cuba e em como superá-las".
Contudo, muitas pessoas reagiram com pouco entusiasmo à ampliação de possibilidades de trabalho independente. Em parte porque já exercem algum dos ofícios sem pagar licença nem impostos por ganhos pessoais, ou então porque se prevê que estas cargas sejam maiores.
Em documentos filtrados de meios estrangeiros de comunicação sustenta-se que as propostas tributárias incluem impostos sobre ganhos pessoais, sobre vendas ou serviços, pela utilização da força de trabalho, contribuição para a segurança social e taxa por anúncios e propaganda comercial nos casos em que se apliquem.
O montante das cargas iria de 10 a 40% e seria pago em moeda nacional em todos os casos, pois quando se opera em pesos convertíveis (CUC), a divisa livremente convertível de circulação nacional, aplica-se a taxa de câmbio vigente no CADECA1.
Nessas casas estatais de câmbio, o CUC equivale a 24 pesos. Segundo cálculos preliminares do grupo de estudos tributários, a entrada na actividade por conta própria de 250.000 pessoas significaria uma entrada no orçamento do Estado de 1.000 milhões de pesos a partir de 2011.
Alguns economistas consultados consideram essa meta demasiado ambiciosa e pouco estimulante para a entrada massiva nessa alternativa laboral. "O regime tributário deveria ser mais discreto, pelo menos numa primeira etapa, para dar lugar a que as pessoas comprovem os benefícios", comentou uma fonte académica.
As informações oficiais disponíveis até ao momento permitem adiantar entre os novos aspectos da abertura ao trabalho por conta própria, a livre subcontratação de mão-de-obra em 83 actividades e a derrogação de regulações que impediam, entre outras, o arrendamento de casas inteiras em divisas, assim como de automóveis.
Essas possibilidades em matéria de aluguer estendem-se inclusive a pessoas que têm autorização para residir no estrangeiro ou a quem saia do país por mais de três meses. Também se estuda a possibilidade de que os que tenham actividade por conta própria possam aceder a um crédito bancário para pôr a andar a actividade escolhida.
Para os analistas, todas estas medidas começam a abrir uma porta que pode levar a resoluções mais audazes, embora de imediato, o reajustamento laboral e as suas consequências gerem novas tensões na família cubana, especialmente naquelas encabeçadas por pessoas de menor preparação profissional.
Tradução de Paula Sequeiros para o esquerda.net
1 CADECA - o mercado de câmbios criado para a população