Fazer um balanço dos resultados das últimas eleições municipais (autárquicas) do Brasil, que se realizaram no último domingo, não é tarefa fácil. Por vários motivos: trata-se de um país-continente (votaram 115 milhões de eleitores) e de estrutura federal, com um sistema partidário que soa muito estranho aos olhos europeus e, para complicar, muitas das eleições para prefeito (presidente de câmara) não estão ainda decididas, realizando-se em 28 de outubro a segunda volta entre os dois candidatos mais votados.
Feitas estas ressalvas, talvez a melhor forma de começar seja através de alguns dados objetivos que são já praticamente definitivos. Por exemplo, o número de vereadores que cada partido elegeu, comparando com as eleições anteriores. O quadro seguinte apresenta esses dados.
Verifica-se assim que o PMDB e o PSDB são os partidos que mais vereadores elegem, mas em queda acentuada: -8% o primeiro, -13% o segundo. Recorde-se que o PSDB é a principal oposição ao governo de Dilma Rousseff, como já era em relação ao governo Lula. O PMDB, em contrapartida, faz parte da chamada base governista (que dá maioria parlamentar ao governo) e é um partido que não se caracteriza exatamente pela sua coerência ideológica, mas sim pelo pragmatismo de gostar de estar sempre do lado do poder.
O Partido dos Trabalhadores, em contrapartida, praticamente se igualou em número de vereadores ao PSDB, crescendo 22%. O PSB, aliado do PT, também cresce significativamente (+18%), e, de um modo geral, os pequenos partidos todos crescem.
Note-se que a direita pura e dura continua com grande influência – a queda do DEM, o sucessor do antigo PFL, herdeiro do partido da ditadura militar, perde 33%, mas porque sofreu um rutura que deu origem ao PSD, que por sua vez elegeu 4.570 vereadores.
PSOL disputa segundo turno em Belém
À esquerda do PT e dos seus aliados, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), uma rutura de esquerda do PT nascido em 2005, cresce 96%. O PSOL conseguiu uma verdadeira proeza com os 28,5% obtidos por Marcelo Freixo, candidato à prefeitura do Rio de Janeiro, ficando em segundo lugar mas não conseguindo evitar a reeleição já na primeira volta do atual prefeito, Eduardo Paes, que tinha o apoio de Dilma Rousseff. Paes, do PMDB, foi apoiado por nada menos que 20 partidos (!!).
Mais sucesso ainda teve a candidatura do PSOL em Belém, onde Edmilson Rodrigues (PSOL), com 32% dos votos válidos, vai disputar a segunda volta com Zenaldo Coutinho (PSDB), que obteve 30% dos votos. Mas o PSOL ainda é um partido pequeno: “Estamos acumulando forças”, disse Plínio de Arruda Sampaio, ex-candidato presidencial do partido.
O PSTU elegeu os seus primeiros vereadores, sendo Amanda Gurgel – que ficou conhecida por um vídeo no Youtube que denunciava a má situação da Educação no seu estado, o Rio Grande do Norte – a vereadora mais votada da história da capital, Natal.
S. Paulo surpreendeu
Quanto à batalha pelas prefeituras, a eleição mais disputada e que mais surpresas causou foi a de S. Paulo, a maior cidade do país, com mais habitantes do que Portugal. Durante toda a campanha, o populista de direita Celso Russomano (PRB) parecia intocável na liderança, segundo todas as sondagens, e a disputa real parecia ser a do segundo lugar, entre José Serra, do PSDB (apoiado por PR, DEM e PSD) e Fernando Haddad, do PT (apoiado pelo PCdoB, PSB e o PP do ex-candidato à presidência da ditadura militar Paulo Maluf). No final, para surpresa geral, Russomano ficou de fora da segunda volta, que será disputada por Serra (30,7%) e Haddad (28,9%), no que foi considerado uma vitória pessoal do ex-presidente Lula, que se envolveu diretamente na campanha de Haddad.
Tal como em S. Paulo, o panorama eleitoral só ficará mais claro depois de 28 de outubro. Numa análise feita pelo diário Folha de S.Paulo às 83 maiores cidades do país, que têm mais de 200 mil eleitores e representam 36,5% do eleitorado, o PT venceu 8 prefeituras na primeira volta e disputará a segunda volta em 22. O PSDB elegeu seis prefeitos e disputa a segunda volta em 17. Mas das 83 cidades, haverá segunda volta em 50.
Para já, no entanto, muitos analistas apontam para uma vitória do ex-presidente Lula e da atual presidente Dilma.
“O grande vitorioso de domingo foi Luiz Inácio Lula da Silva e é por isso que os coveiros de sua força política passaram o dia de ontem trocando sorrisos amarelos”, escreve Paulo Moreira Leite, colunista da Época. E acrescenta: “a principal aposta de Lula em 2012 foi Fernando Haddad que, superando as profecias do início da campanha, não só passou para o segundo turno mas entra nessa fase da disputa em posição bastante favorável. Em São Paulo se travou a mãe de todas as batalhas. Imagino as frases prontas e as previsões sombrias sobre o futuro de Lula e do PT se Haddad tivesse ficado de fora...”
Para o sociólogo Ricardo Musse, “há um grande vencedor nas eleições municipais de 2012 é a presidente Dilma Rousseff.” E explica: “Ela conseguiu se desvencilhar com desenvoltura da armadilha inerente a uma disputa local na qual os partidos da base quase inevitavelmente tendem a se confrontar com certa dose de virulência. (…) Não só conseguiu evitar o descontentamento e a temida (e muitas vezes anunciada) desagregação de sua base de apoio, como logrou contentar a quase todos, desferindo golpes fatais sobre a oposição”.
No próximo dia 28, será possível confirmar ou não estas análises.