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Bloco considera que Tribunal Constitucional faz “parêntesis na Constituição”

O Tribunal Constitucional declarou inconstitucional o corte dos subsídios de férias e Natal a funcionários públicos e pensionistas, considerando que a medida “se traduzia numa violação do princípio da igualdade” e “restringiu os efeitos da declaração de inconstitucionalidade” ao ano de 2012. Bloco de Esquerda considera que o Tribunal Constitucional fez um “um parêntesis na Constituição”, ao determinar que a declaração de inconstitucionalidade não se aplica em 2012.
Foto de Paulete Matos

O líder parlamentar do Bloco de Esquerda, Luís Fazenda, afirmou à agência Lusa: "O Tribunal Constitucional declara inconstitucionais os cortes, mas diz que isso não vale para 2012 porque há um superior interesse que é o interesse da ‘troika' do cumprimento da meta do défice. O Tribunal Constitucional coloca ele próprio a Constituição entre parêntesis".

Luís Fazenda considerou ainda que com esta decisão do Tribunal Constitucional está "atestada a menoridade democrática do Estado português", "não é constitucional, mas como a ‘troika' exigiu, é inconstitucional mas agora não se aplica".

Questionado sobre o acórdão abrir a porta ao alargamento da aplicação de cortes aos 13º e 14º meses à generalidade dos trabalhadores portugueses, incluindo os do setor privado, o líder parlamentar do Bloco afirmou que o partido está "decididamente contra todos os cortes", frisando "que sobre isso não haja dúvida", sublinhando que tal hipótese seria igualmente inconstitucional e salientando que "não constava da petição que assinámos essa possibilidade".

O Tribunal Constitucional aceita cortes salariais, mas considera que a medida de cortar os subsídios a pensionistas e funcionários públicos “se traduzia numa imposição de um sacrifício adicional que não tinha equivalente para a generalidade dos outros cidadãos que auferem rendimentos provenientes de outras fontes”. Por isso, declarou que a medida é inconstitucional.

Para o ano de 2012, o Tribunal decidiu que a sua declaração de inconstitucionalidade não tem efeitos, considerando que “a execução orçamental de 2012 já se encontra em curso avançado” e a declaração de inconstitucionalidade podia “colocar em risco o cumprimento da meta do défice público imposta nos memorandos” da troika.

O primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, já disse que para 2013 o Governo vai respeitar a decisão do Tribunal Constitucional e alargar os cortes a todos os portugueses.

O secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos, diz que a decisão do TC "confirma que o Governo estava claramente a violar a Constituição Portuguesa" e exige que os trabalhadores e pensionistas que sofreram os cortes de subsídios de férias e Natal sejam ressarcidos. "Neste momento, os trabalhadores da função pública e da administração central do Estado têm de ser ressarcidos daquilo que ilegalmente lhes foi retirado e que pôs em causa um compromisso que estava estabelecido entre trabalhadores e o próprio Estado. O governo tem de assumir as suas responsabilidades, tem de haver consequências políticas", frisou Arménio Carlos.

É o seguinte o comunicado do Tribunal Constitucional na íntegra:

“Comunicado de 5 de julho de 2012

Acórdão n.º 353/12
Processo n.º 40/12
Relator: Conselheiro João Cura Mariano

Na sessão plenária de 5 de Julho, o Tribunal Constitucional aprovou o Acórdão nº 353/12 que julgou o pedido de declaração de inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 21.º e 25.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2012).

Pelas referidas normas foi suspenso o pagamento dos subsídios de férias e de Natal, ou de quaisquer prestações correspondentes aos 13.º e, ou, 14.º meses, quer para pessoas que auferem remunerações salariais de entidades públicas, quer para pessoas que auferem pensões de reforma ou aposentação através do sistema público de segurança social, durante os anos de 2012, 2013 e 2014.

O Tribunal verificou que esta medida se traduzia numa imposição de um sacrifício adicional que não tinha equivalente para a generalidade dos outros cidadãos que auferem rendimentos provenientes de outras fontes, tendo concluído que a diferença de tratamento era de tal modo acentuada e significativa que as razões de eficácia na prossecução do objectivo de redução do défice público que fundamentavam tal opção não tinham uma valia suficiente para a justificar.

Por isso entendeu que esse diferente tratamento a quem aufere remunerações e pensões por verbas públicas ultrapassava os limites da proibição do excesso em termos de igualdade proporcional.

Apesar da Constituição não poder ficar alheia à realidade económica e financeira, sobretudo em situações de graves dificuldades, ela possui uma específica autonomia normativa que impede que os objectivos económico-financeiros prevaleçam, sem qualquer limites, sobre parâmetros como o da igualdade, que a Constituição defende e deve fazer cumprir.

Por estas razões, o Tribunal concluiu que a dimensão da desigualdade de tratamento que resultava das normas sob fiscalização, ao revelar-se manifestamente desproporcionada perante as razões que a fundamentavam, se traduzia numa violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º, da Constituição, pelo que declarou inconstitucionais as normas constantes dos artigos 21.º e 25.º, da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2012).

Atendendo a que a execução orçamental de 2012 já se encontra em curso avançado, o Tribunal reconheceu que as consequências desta declaração de inconstitucionalidade, poderiam colocar em risco o cumprimento da meta do défice público imposta nos memorandos que condicionam a concretização dos empréstimos faseados acordados com a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional, pelo que restringiu os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, nos termos permitidos pelo artigo 282.º, n.º 4, da Constituição, não os aplicando à suspensão do pagamento dos subsídios de férias e de Natal, ou quaisquer prestações correspondentes aos 13.º e, ou, 14.º meses, relativos ao ano de 2012.

A decisão foi tomada por maioria. Votaram a declaração de inconstitucionalidade o Conselheiro relator, João Cura Mariano, e os Conselheiros Ana Guerra Martins, Catarina Sarmento e Castro, Joaquim Sousa Ribeiro, Carlos Pamplona de Oliveira, José Cunha Barbosa, Maria João Antunes, Carlos Fernandes Cadilha e o Conselheiro Vice-Presidente, Gil Galvão; votaram vencidos os Conselheiros Vitor Gomes, Maria Lúcia Amaral e o Conselheiro Presidente, Rui Manuel Moura Ramos. Votaram a restrição de efeitos desta declaração o Conselheiro relator, João Cura Mariano, e os Conselheiros Ana Guerra Martins, Joaquim Sousa Ribeiro, Vitor Gomes, Maria Lúcia Amaral, Maria João Antunes, Carlos Fernandes Cadilha, o Conselheiro Vice-Presidente Gil Galvão e o Conselheiro Presidente Rui Manuel Moura Ramos; ficaram vencidos quanto a este ponto os Conselheiros Catarina Sarmento e Castro, Carlos Pamplona de Oliveira e José Cunha Barbosa."

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