“Quase todos os partidos” portugueses estão ligados ao regime angolano

13 de janeiro 2014 - 17:37

Angola tem investido “especificamente em bens estratégicos” portugueses e, em troca, os governos de Lisboa têm servido a “estratégia de poder e reciclagem de capitais” dos dirigentes de Luanda, explicou Francisco Louçã.

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"Portugal, hoje, é um offshore de Angola”, defende Francisco Louçã. Na Foto: José Eduardo dos Santos, Presidente de Angola, e Cavaco Silva.

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“Não há nenhuma potência colonial que se tenha transformado numa espécie de offshore - paraíso fiscal - da família real do país que foi a sua antiga colónia, e Portugal, hoje, é um offshore de Angola”, afirmou à agência Lusa o coautor do livro “Os donos angolanos de Portugal” em conjunto com o sociólogo João Teixeira Lopes e o autor do documentário “Os donos de Portugal”, Jorge Costa.

Quando os três autores escreviam a obra “Burgueses”, sobre a burguesia portuguesa, consideraram que a ligação com Angola era “suficientemente relevante” para valer um livro separado, já que Luanda adquiriu “um enorme poder sobre a economia” nacional.

Para além de "único" e "atual", o assunto “é muito ameaçador”, considera Louçã, referindo-se à “ânsia dos setores do capital português” para terem parcerias com Angola “ou até para a venda pura e simples” dos ativos estratégicos.

O investimento estrangeiro sempre foi “vantajoso” para Portugal, mas a economia portuguesa tem, em relação a Angola, “uma dependência estratégica”, distingue.

As relações económicas entre Angola e Portugal tiveram, nos últimos anos, um “grande desenvolvimento”, com a banca como peça central, assinala o economista. “A dominação de setores que são bens estratégicos – que, aliás, deviam ser bens públicos – é o que permite que as escolhas sobre questões essenciais para o futuro da economia portuguesa passem a ser tomadas por lógicas de rentabilização e de acumulação que são totalmente incontroladas pela democracia portuguesa”, critica.

“O que é vantajoso para Portugal e para Angola é que haja relações económicas, políticas e diplomáticas normais”, contrapõe, frisando que “o grande problema” é que “a imensa fortuna que Angola produz é, em grande parte, acumulada por uma família e essa família confunde-se com o Estado”, o que faz de Portugal “um local de lavagem de dinheiro de uma operação de extração da riqueza angolana”.

Os dados referidos no livro são públicos, com origem em Portugal ou no estrangeiro, e as "várias" redes reveladas “são, muitas delas, muito recentes". A obra menciona vários nomes de ex-governantes portugueses – António Monteiro, Proença de Carvalho, Miguel Relvas, Fernando Nogueira, Armando Vara, Almeida Santos, António Vitorino, Anacoreta Correia, etc. –, listando a filiação partidária de cada um, com claro predomínio do PSD e PS, mas também do CDS-PP.

“Quase todos os partidos” estão ligados ao regime angolano, o que explica o “silêncio político em Portugal” sobre as relações bilaterais, entende Louçã.

Antecipando que o livro será "polémico” e “muitos ataques das pessoas que são listadas no livro e das empresas que são favorecidas" nas "redes de negócios”, o professor universitário crê que “o conhecimento ajuda à normalização das relações”.

Lembrando que “há muitos portugueses em Angola”, que “merecem trabalhar com toda a tranquilidade”, bem como “muitos angolanos em Portugal, que merecem ser vistos com toda a normalidade”, o autor critica “que em Portugal se aceite uma dependência estratégica”, de Angola, ou outra qualquer. Aliás, adiantou, outras obras serão dedicadas às relações de Portugal com a China e com o Brasil (que já é referido neste livro, a propósito do “triângulo dourado” Lisboa-Luanda-Brasília).

“Estamos absolutamente certos que os factos que tratamos são rigorosíssimos, fundamentados e importantes. O que achamos provinciano é que em Portugal haja medo de tratar as relações entre a política e os negócios, que são uma forma de diminuição da democracia, quando existe um abuso de poder”, sustenta.