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Trabalho para a vida: competência para a incompetência

É a própria política interna da União Europeia, definida pelos mesmos líderes que proclamam a ideologia da flexibilidade, que demonstra o quão erradas são as medidas que impõem aos povos da Europa.

Já conhecemos a narrativa da Europa dos tempos que correm, o tempo do trabalho para a vida acabou. A ideologia dos governantes europeus clama a flexibilidade para o mercado de trabalho. A estabilidade laboral é inimiga da produtividade e da qualidade, uma vez que permite que trabalhadores inaptos continuem nos seus postos, tapando-os a quem demonstre mérito para tal. É este o discurso que tem legitimado a desregulação laboral imposta a partir desta Europa e acolhida com entusiasmo pelos vários governantes. A reforma laboral em Espanha e Portugal são disso exemplo. Na Grécia, o segundo plano de “resgate” prevê que todos os novos contratos do sector público sejam contratos temporários. Proibir os contratos permanentes por lei, é esta a solução para relançar a competitividade do país. Para ajudar ainda mais, haverá uma redução massiva dos salários, nomeadamente com um corte mínimo de 22% do salário mínimo no sector privado.

Contudo, todo este discurso e todas estas medidas contrastam com a prática das instituições europeias. Nos próximos dez anos, 60% dos empregados das instituições europeias vão-se reformar, pelo que o recrutamento tem-se intensificado assim como a sua divulgação. Não é portanto raro ver notícias sobre o assunto, recheadas com declarações dos responsáveis pela área. Esta semana podemos ler na imprensa nacional que “a União Europeia quer recrutar mais e melhor”, que “há uma guerra pelo talento” e que “nós precisamos dos melhores para ajudar a fazer as políticas da União”. Portanto, como se propõe a União a conseguir atrair os melhores? Garantindo “um emprego para a vida” e “bem remunerado”. Ora, a política de recrutamento da UE está bem direcionada. Sabe que, para conseguir trabalhadores competentes e garantir um trabalho de qualidade, precisa de assegurar a permanência dos postos de trabalho.

É a própria política interna da União, definida pelos mesmos líderes que proclamam a ideologia da flexibilidade, que demonstra o quão erradas são as medidas que impõem aos povos da Europa. Infelizmente, por ora, a União procura trabalhadores competentes para aplicar políticas incompetentes no serviço à população. Por enquanto, a União é competente a impor o pagamento da crise aos trabalhadores, desempregados e pensionistas da Europa. Mas também isto muda, basta ter a força para aplicar as políticas competentes que ajustem a economia às necessidades das pessoas.

Sobre o/a autor(a)

Biólogo. Dirigente do Bloco de Esquerda
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