UE quer transparência em relação a empresas de mercenários

17 de março 2008 - 0:00
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A subcontratação de companhias para actividades militares tornou-se muito polémica desde que os Estados Unidos invadiram o Iraque há cinco anos, afirma um relatório apresentado no Parlamento Europeu.

Por David Cronin para a IPS, de Bruxelas



As autoridades iraquianas responsabilizaram a empresa de segurança norte-americana Blackwater por um tiroteio que terminou com 11 mortos em Setembro de 2007. As acusações de que mercenários da Blackwater dispararam indiscriminadamente foram seguidas por uma série de queixas de que essas companhias, que também oferecem guarda-costas a diplomatas europeus, demonstram ter pouco respeito pelos direitos humanos.



Os governos da União Europeia devem ser transparentes no tocante a essas firmas, afirma o documento debatido no Parlamento europeu. A menos que se estabeleçam regras claras para as actividades dessas companhias, "será extremamente difícil o Parlamento concordar com ampliar a presença física da UE no Iraque", alerta o documento. A Comissão, órgão executivo da UE, tem comprometidos mais de 800 milhões de euros desde 2003 para a reconstrução do Iraque. Mas os seus esforços "não conseguiram melhorar de maneira substancial a situação no terreno", diz o relatório.



A eurodeputada socialista portuguesa Ana Gomes, que redigiu o documento, não acredita que o Iraque precise de mais ajuda financeira, mas sim de assistência técnica para garantir o funcionamento do Estado e a maior liberdade na sociedade. A UE tem uma "oportunidade dos sonhos de influir positivamente na sorte do Iraque e de toda a região", afirmou, apesar do seu pedido de cautela no uso de empresas privadas de segurança. As estimativas do número de mortos na guerra do Iraque são muito variadas. Como os Estados Unidos não levam em conta as vítimas civis, o cálculo recaiu sobre cientistas e numerosas organizações não-governamentais.



A organização Iraq Body Count disse que o número de mortos documentado pelas forças da coligação lideradas pelos norte-americanos, grupos paramilitares e delinquentes desde a invasão de Março de 2003 supera as 89 mil pessoas. Por sua vez, entidade a norte-americana Just Foreign Policy estimou que os mortos após a invasão dirigida por Washington passam de um milhão de pessoas. Enquanto o Iraque luta para ressurgir da guerra, a UE está profundamente envolvida nas conversações para impulsionar o comércio com esse país do Oriente Médio.



Até o momento, houve quatro rodadas de negociações com vistas a assinar um acordo comercial e de cooperação entre as duas partes. A eurodeputada verde britânica Caroline Lucas pediu à UE que seja cautelosa nessas negociações. O director da agora desaparecida Autoridade Provisória da Coligação ocupante do Iraque, Paul Bremer, designado por Washington em 2003, emitiu decretos para privatizar 200 empresas estatais e permitir que companhias estrangeiras se apropriassem totalmente de bancos, das minas e das fábricas iraquianas. Após acusar os Estados Unidos de "privatizar a propriedade pública", Lucas disse que o objectivo da UE não deve ser o de apenas conseguir negócios para empresas europeias, mas "também construir companhias iraquianas".



O Parlamento Europeu também se mostrou preocupado com a difícil situação dos 4,5 milhões de refugiados da guerra, numa população de 25 milhões de habitantes. "O maior deslocamento de pessoas nessa parte do mundo desde 1948", disse a eurodeputada socialista francesa Béatrice Patrie. Há cerca de dois milhões de refugiados iraquianos na Jordânia e na Síria. A UE "deve receber alguns dos mais vulneráveis" no seu território, defendeu Patrie.



Por sua vez, o eurodeputado socialista português Paulo Casaca afirmou que o apoio da União Europeia aos refugiados foi "deplorável e inadequado. Há pessoas indigentes que não têm acesso aos benefícios da venda do petróleo. Devemos ajudá-las", afirmou. Por sua vez, o eurodeputado holandês da União Cristã Bastiaan Belder distanciou-se da proposta de receber refugiados iraquianos. "É realista pedir aos governos que recebem refugiados?", perguntou.



A comissária europeia de Relações Exteriores, Benita Ferrero-Waldner, disse que "a segurança melhorou, em parte", no Iraque devido ao chamado "embate", estratégia norte-americana de aumentar seus efectivos no terreno, e ao cessar-fogo proclamado pelo líder rebelde xiita Moqtada al-Sadr. Mas "o número de civis iraquianos assassinados ainda é muito alto", reconheceu, e acrescentou que as últimas incursões do exército turco no norte do Iraque contra o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), segundo a visão oficial, "contribui para complicar a situação".



O diálogo entre Turquia e Iraque é importante para "encontrar uma solução amistosa e evitar um conflito", disse Janez Lenarcic, secretário de Estado para Assuntos Europeus da Eslovénia, país que exerce a presidência rotativa da UE por seis meses. A eurodeputada liberal britânica Emma Nicholson, que presidirá a um novo órgão responsável pelas relações com o Iraque, disse que o preço para estabilizar esse país "merece o esforço". O Iraque terá fronteira com a União Europeia quando a Turquia for aceita como membro do bloco, acrescentou. 14/3/2008

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