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Saída do euro seria um “processo muito destrutivo”

Durante a sessão de abertura da conferência internacional “Portugal na encruzilhada da Europa”, organizada pelo Bloco, o economista Jan Toporowski defendeu que “a esquerda não deve abandonar a discussão sobre a reforma do euro, caso contrário a direita irá dominar esta agenda e irá impor um euro para a banca e para as elites europeias e não para o povo europeu”.

No primeiro dia da conferência internacional “Portugal na encruzilhada da Europa”, que tem lugar no pavilhão C3 da Faculdade de Ciências de Lisboa, Jan Toporowski afirmou opor-se à saída do euro, considerando que este seria um “processo muito destrutivo que abriria a porta ao nacionalismo e à direita nacionalista ou àqueles que estão preparados para colaborar com a elite europeia, ajudando-a a impor o seu modelo de euro”.

O economista recusou as teorias de que a competitividade é alcançada através da desvalorização da moeda, da redução salarial ou da combinação de ambas, frisando que mediante a redução salarial o resultado será a redução da procura interna, da produção e do emprego.

Este economista sublinhou ainda que, se, por um lado, a saída do euro com vista à desvalorização da moeda para resultar necessitaria de austeridade salarial, a mesma resultaria, dado a atual integração financeira, no colapso dos sistemas bancários não só do país que eventualmente abandonasse o euro como também dos sistemas bancários no âmbito da zona euro.

O exemplo muitas vezes avançado pelos defensores da saída do euro no que respeita à Argentina foi rejeitado por Jan Toporowski, que argumentou que o sistema bancário deste país era muito diferente do existente nos países da zona euro, sendo “relativamente isolado do sistema financeiro internacional”, mas limitado pela paridade cambial.

Mediante a criação do mercado único e a integração dos serviços financeiros, a saída do euro resultaria, para Toporowski, num processo deveras “destrutivo”. Os ativos dos bancos na nova moeda não seriam suficientes para cobrir os seus passivos em euros. Os clientes procurariam retirar dos bancos todos os euros possíveis e fixar os seus contratos e passivos em euros. A nova moeda apenas serviria “para pagar impostos” e o governo, que teria as suas dívidas em euros, estaria ainda mais falido.

“Graças à integração financeira, a desvalorização cambial não resulta de forma tradicional”, sublinhou Toporowski.

A ameaça da possibilidade de um default serve, desta forma, e segundo Jan Toporowski, como forma de pressionar as instituições internacionais, como acontece na Grécia, porque o que está em causa é “o próprio sistema financeiro da zona euro”.

Para o economista, mais do que de um conjunto de políticas erradas, a crise resulta de um desenho institucional defeituoso. Toporowski exemplifica: “A Zona Euro tem um banco central sem um governo, os governos não têm bancos centrais e os bancos não têm a quem recorrer para pedir empréstimos de último recurso. Com um regime de baixa inflação, agora a transformar-se em deflação, o sistema não tem qualquer mecanismo para eliminar a divida excessiva na economia”.

Este desenho institucional defeituoso terá sido, segundo Toporowski, incorporado no Tratado de Maastricht de 1992, com as restrições às dívidas dos governo e a imposição de limites aos défices fiscais públicos.

Mediante a obrigatoriedade da redução da dívida e dos défices, “o PIB acabará por encolher antes de serem gerados os excedentes necessários para reduzir a divida”, explica o economista, realçando que, face à redução do PIB, já não haverá lugar à criação de excedentes.

Para Jan Toporowski, a crise, que, na realidade, resulta da queda do investimento das empresas, constituindo uma crise de acumulação de capital, só “pode ser ultrapassada através da reflação da economia, fazendo com que a economia cresça, o que tem que ser suportado por um centro bancário ativo”.

“A única forma de aumentar o PIB é promover o crescimento económico”, frisou o economista, defendendo que o governo deve promover o “aumento dos salários na função pública e do salário mínimo” e uma reforma fiscal que permita a taxação progressiva, assim como o banco europeu de investimento deve financiar as obras públicas.

O encerramento da conferência internacional "Portugal na encruzilhada da Europa" terá lugar este sábado, pelas 17h, com a intervenção de Francisco Louçã.

Ver programa:

Sábado, 19 Maio

9h | Sessão Plenária
O que falta na arquitectura do Euro?

José Castro Caldas (Centro de Estudos Sociais)
Mariana Santos (Economista, Bloco de Esquerda)
Ricardo Cabral (Universidade da Madeira)
Moderação: José Gusmão

11h | Painéis

1. A Austeridade e o(s) Direito(s) do Trabalho
Isabel Moreira (Constitucionalista, Deputada independente PS)
Nuno de Almeida Alves (Observatório das Desigualdades, CIES-ISCTE)
Catarina Martins (Deputada, Bloco de Esquerda)
Ana Cordeiro Santos (Centro de Estudos Sociais)
Moderação: Ricardo Moreira

2. Há esperança para um Estado Social Europeu?
Bastiaan van Apeldoorn (Vrije Universiteit Amsterdam)
José Reis (Centro de Estudos Sociais-FEUC)
Pedro Filipe Soares (Deputado, Bloco de Esquerda)
Moderação: Helena Pinto

15h | Portugal, Europa e as Alternativas
Marisa Matias (Vice-Presidente do PEE, Eurodeputada do BE)
Eugénio Rosa (Economista, Partido Comunista Português)
Pedro Delgado Alves (Presidente da Juventude Socialista, Deputado)
Ricardo Cabral (Universidade da Madeira)
Moderação: Cecília Honório

17h | Encerramento
Francisco Louçã


* Jan Toporowski é professor de finanças e economia na International University College of Turin (IUC) e dirige o Departamento da Escola de Estudos Orientais e Africano (SAOS) em Londres. Toporowski é também associado de pesquisa no Centro de Investigação em História e Metodologia de Economia da Universidade de Amsterdão. Este economista trabalhou na gestão de fundos de bancos internacionais antes de se tornar académico, tendo passado pelo Standard Chartered Bank e a Economist Intelligence Unit e, mais recentemente, pelo banco da Finlândia. Toporowski  tem publicado extensamente sobre economia financeira e monetária.

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