"Uma vez combinada com meios tecnológicos de busca inteligente, a captação de imagens pelas câmaras instaladas em pontos estratégicos da cidade abre sem dúvida o caminho para a implementação de formas de tracking dos cidadãos e para a constituição de perfis quanto à sua vida privada e familiar", diz o relatório elaborado em Julho pela Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD).
"A instalação do sistema de videovigilância virá afectar ainda o direito de qualquer pessoa circular anonimamente nas ruas, ou o direito ao anonimato público, que decorre da articulação dos direitos ao livre desenvolvimento da personalidade e à intimidade da vida privada e familiar", acrescenta o parecer negativo às intenções do autarca socialista de vigiar os movimentos dos cidadãos de todas as freguesias da Amadora com câmaras que "captam cerca de 322 planos diferentes das ruas e praças da cidade, e com ruas vigiadas por vezes com 9, 8 e 7 câmaras à vez".
"Torna-se provável que o funcionamento do sistema implique que qualquer cidadão com uma vida mais activa venha a ser filmado dezenas de vezes", o que para a CNPD é um cenário considerado "altamente intrusivo". Comparando "os sacrifícios impostos aos direitos pessoais afectados com os benefícios obtidos" por este sistema proposto na Amadora, "os primeiros excedem manifestamente os segundos".
A CNPD baseou-se em estudos sobre as consequências do sistema de videovigilância em Inglaterra e nos Estados Unidos para dizer que eles mostram que "em ambientes suburbanos, a instalação de câmaras fixas tende a restringir sobretudo o exercício na via pública das liberdades cívicas das franjas ou grupos desfavorecidos da sociedade". Quanto ao projecto de Joaquim Raposo, a Comissão diz que "se nos recordarmos que na fundamentação do pedido, a Divisão da Amadora da PSP alude à dificuldade por ela sentida em separar os suspeitos dos crimes do resto dos residentes dos bairros e da população trabalhadora em geral, torna-se possível afirmar que este risco de violação do princípio da igualdade no exercício dos direitos pessoais não é totalmente imaginário".
A Comissão analisou igualmente os dados detalhados fornecidos pela PSP sobre a criminalidade nas freguesias da Amadora entre 2002 e 2008, referindo que o número de crimes de furto e roubo nas freguesias com taxas mais altas de criminalidade tem vindo a cair "de forma sustentada" desde 2005.
A Comissão refere-se também aos 520 agentes da divisão da PSP da Amadora (500 dos quais operacionais), comparando a presença policial do concelho com a das cidades de dimensão semelhante nos EUA, que têm um ratio médio de 1,9 polícias por mil habitantes. Na Amadora, o ratio é de 2,9 polícias por mil habitantes.
António Santos, deputado municipal do Bloco de Esquerda na Amadora, congratulou-se com a decisão da CNPD, por "vir dar razão a quem criticou e se opôs a este projecto megalómano de videovigilância, que mais não era que uma autêntica violência sobre a privacidade das pessoas". Por seu lado, o presidente da autarquia vai ainda tentar recorrer desta decisão, segundo avanço o semanrário Sol esta sexta-feira.
Protecção de Dados chumba videovigilância na Amadora
07 de agosto 2010 - 17:57
A autarquia presidida por Joaquim Raposo queria instalar 113 câmaras de vídeo em vários bairros do concelho, mas a CNPD deu parecer negativo ao projecto, por considerá-lo "altamente intrusivo".
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"Torna-se provável que o funcionamento do sistema implique que qualquer cidadão com uma vida mais activa venha a ser filmado dezenas de vezes", o que para a CNPD é um cenário considerado "altamente intrusivo". Foto mafate69/Flickr