CPLP: Alegre desafia Cavaco a recusar ditadura de Obiang

18 de julho 2010 - 14:35

Manuel Alegre acusa Cavaco de não tomar uma posição firme contra a adesão da Guiné Equatorial à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Mia Couto, Chico Buarque e Eduardo Lourenço são alguns dos subscritores duma carta aberta pelo veto à entrada da ditadura de Teodoro Obiang.

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O ditador Teodoro Obiang até prometeu tornar o português na língua oficial do país, apesar de ser totalmente desconhecida da população. Foto Jaume d'Urgell/Flickr

Numa entrevista de fundo à SIC-Notícias antes da partida para Angola, onde se realiza a cimeira da CPLP, o presidente da República não respondeu directamente sobre qual seria a sua posição quanto à proposta de adesão da Guiné Equatorial que será decidida nesta cimeira. Numa nota divulgada no site de Manuel Alegre, pode ler-se que Cavaco "refugiou-se atrás de declarações de Pedro Pires, Presidente de Cabo Verde, e dos estatutos da CPLP, para dar a entender que teria reservas a tal decisão, sem no entanto nunca as formular".



"Não tem qualquer sentido a entrada da Guiné Equatorial na CPLP”, defendeu Alegre no passado dia em 10 de Julho, apontando duas razões para recusar o pedido de adesão: “em primeiro lugar, a Guiné Equatorial não é um país de língua portuguesa. Em segundo lugar, é uma petro-ditadura”. “Os princípios e os valores da democracia e da CPLP têm de estar acima dos negócios e do cheiro do petróleo”, defende o candidato presidencial.



A contestação à entrada da ditadura de Teodoro Obiang na CPLP juntou vários intelectuais lusófonos numa carta aberta aos aos chefes de Estado e de Governo dos países da CPLP. "Este Chefe de Estado ilustra-se por ocupar os lugares mais altos dos ranking internacionais, tais como o dos piores ditadores ou o dos Presidentes mais ricos do mundo, por acumular referências nos relatórios internacionais de organizações de defesa dos Direitos Humanos que denunciam os abusos e violações nesta matéria na Guiné Equatorial, por ter visto a UNESCO recuar na criação de um Prémio associado ao seu nome…", dizem os subscritores da carta aberta.

 


Chico Buarque, Mia Couto, Eduardo Lourenço e Frei Betto são alguns dos 13 signatários da carta que o esquerda.net aqui reproduz:



CARTA ABERTA

aos Chefes de Estado e de Governo dos países da CPLP






Os princípios e os direitos não se trocam por negócios

A Guiné Equatorial não pode ser membro da CPLP



A CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa foi criada em 1996 e reúne o conjunto dos países que têm o Português como língua oficial. Tendo como objectivos a concertação politico-diplomática e a cooperação, a CPLP rege-se, entre outros princípios, pelo “...e) Primado da Paz, da Democracia, do Estado de Direito, dos Direitos Humanos e da Justiça Social;...”.



Em 2005 foi criado o estatuto de Observador Associado da CPLP, cujos titulares “terão de partilhar os respectivos princípios orientadores, designadamente no que se refere à promoção das práticas democráticas, à boa governação e ao respeito dos direitos humanos, e prossigam através dos seus programas de governo objectivos idênticos aos da Organização, mesmo que, à partida, não reúnam as condições necessárias para serem membros de pleno direito da CPLP”.



Em 2006 a Guiné Equatorial de Teodoro Obiang tornou-se membro Observador Associado da CPLP, pedindo agora a sua admissão como membro de pleno direito. A decisão será tomada no dia 23 de Julho em Luanda, no quadro da VIII Conferência de Chefes de Estado e de Governo da CPLP.



Teodoro Obiang é o Presidente da Guiné-Equatorial desde 1979, sendo recorrentemente reconduzido neste papel com percentagens eleitorais que ultrapassam os 95% ... 31 anos num poder que conquistou através de um golpe de Estado, num país rico, nomeadamente em petróleo, cuja população continua pobre.



Este Chefe de Estado ilustra-se por ocupar os lugares mais altos dos ranking internacionais, tais como o dos piores ditadores ou o dos Presidentes mais ricos do mundo, por acumular referências nos relatórios internacionais de organizações de defesa dos Direitos Humanos que denunciam os abusos e violações nesta matéria na Guiné Equatorial, por ter visto a UNESCO recuar na criação de um Prémio associado ao seu nome... E a “sua” Guiné Equatorial é também conhecida por ter sido excluída da iniciativa EITI - Extractive Industries Transparency Initiative, pelo facto de não cumprir as suas mais básicas obrigações.



Todos os membros da CPLP sofreram com as ditaduras que governaram os seus países ou dominaram os seus territórios não autónomos. Pela liberdade deram a vida milhares de cidadãos. Não queremos caucionar um ditador, nem reconhecer uma ditadura que só procura disfarçar a sua verdadeira natureza.



Defendemos um não inequívoco à admissão da Guiné Equatorial como membro de pleno direito da CPLP, na medida em que o país não preenche os requisitos para entrar na CPLP. Nem sequer tem o Português como língua oficial, apesar de inúmeras promessas feitas nesse sentido pelo seu Presidente. E a adopção da língua portuguesa por decreto ou qualquer outro tipo de mecanismo arbitrário resultaria em mais uma imposição brutal ao seu povo, no caso a de uma língua completamente desconhecida.



A admissão da Guiné Equatorial na CPLP constituiria um precedente inaceitável – com amplas consequências políticas - na prática e na ética da organização e levaria à sua grave descredibilização.



D. Basílio do Nascimento (Timor-Leste)

Frei Carlos Alberto Libânio Christo (Frei Betto) (Brasil)

Eduardo Lourenço (Portugal)

Elisa Andrade (Cabo Verde)

Francisco Buarque de Holanda (Brasil)

Inocência Mata (S. Tomé e Príncipe)

D. Januário Torgal (Portugal)

José Mattoso (Portugal)

Justino Pinto de Andrade (Angola)

Manecas Costa (Guiné-Bissau)

Margarida Pedreira Bulhões Genevois (Brasil)

Maria Victória Mesquita Benevides (Brasil)

Mia Couto (Moçambique)





 

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