Este CDS é o mesmo que partilhou com o PSD 4 anos de governo?

porDomicília Costa

04 de junho 2016 - 16:49
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Com o CDS no Governo, as pensões e os apoios sociais para idosos diminuíram ou desapareceram. Será que a Dra Assunção Cristas já não se lembra do seu próprio Governo?

Ler os 19 Projetos de Resolução do CDS, todos datados do final de maio de 2016, e todos eles dedicados exclusivamente à população idosa, é um deleite para o espírito de qualquer humanista. Mas lê-se e duvida-se: este CDS é o mesmo que partilhou com o PSD 4 anos de governo com maioria absoluta? Durante esses 4 anos não apresentaram estes projetos de resolução com receio de que os partidos de esquerda representados na A.R. os chumbassem?

Confesso que não tive tempo de os ler a todos com a atenção que certamente merecem. É que só tivemos acesso a eles demasiado em cima da hora. Mas pude apreciar que estes 19 projetos, do CDS repito, totalizam no seu conjunto mais de uma centena de páginas e nelas estão inseridos 60 quadros estatísticos do INE, além de outros dados avulsos. Sem dúvida, um trabalho exaustivo. Não fosse o facto de os quadros serem todos os mesmos.

Ao longo de 4 anos o governo do CDS e do PSD não aplicou a lei de atualização das pensões e deixou congeladas todas as pensões acima de 262 euros. E não hesitou até em fazer cortes inconstitucionais, que só foram revertidos porque a oposição, e desde logo o Bloco de Esquerda, recorreram ao Tribunal Constitucional.

Com o argumento da austeridade que nos era imposta pela troika, manteve congeladas 80% das pensões. Até mesmo quando, em 2015, Portugal já não estava sob o programa de ajustamento.

Mas os idosos, durante os 4 anos de governação PSD/CDS, não viram só as suas pensões e apoios sociais diminuírem ou desaparecerem. Como toda a restante população residente em Portugal, viram subir a alimentação, a água, a luz, as rendas de casa, os transportes, aumentar as taxas moderadoras nos Centros de Saúde e nos hospitais, sofreram o brutal aumento de impostos. E em muitas localidades viram fechar uns e outros por completo ou em parte, e ainda estações dos Correios onde muitos dos idosos, quantas vezes com enormes limitações de locomoção, iam receber as suas magras pensões.

Segundo os dados oficiais de que dispomos, em 2012 haveria 297 mil idosos pobres, em 2013, 313 mil; em 2014, seriam já 360 mil idosos em risco de pobreza.

Somos, pois, obrigados a reconhecer duas realidades: que o combate à pobreza nos idosos tem de ser uma prioridade e que, para o fazer, é necessário, desde logo, começar por reverter o caminho que a direita fez.

O Complemento Solidário para Idosos (CSI) foi criado em 2005 para combater a pobreza dos idosos. É uma prestação social que corresponde à diferença entre o rendimento do idoso e o limiar da pobreza, para garantir aos idosos que o seu rendimento não fique abaixo desse limiar.

Em 2010, recebiam CSI 235 mil idosos. Entretanto a legislação foi sendo alterada, tendo a maior alteração ocorrido em 2013 quando a direita baixou o valor de referência do CSI de 5022€ para 4900€/ano. No total, entre 2010 e 2014, o número de beneficiários do CSI desceu de 235 mil para 170 mil, uma quebra de mais de 25%.

É certo que governo PSD/CDS aumentou ligeiramente as pensões mínimas rural e social, mas nunca descongelou as pensões mínimas contributivas. Entre 2010 e 2015 não tiveram qualquer aumento as pensões mínimas de 274€/mês, 303,23€/mês e 379,04€/mês, correspondentes, respetivamente, a quem contribuiu 15 a 20 anos, 21 a 30 anos e 31 e mais anos. Por outro lado, o aumento de cêntimos por dia das pensões mínimas social e rural, que ficam abaixo de 270€/mês, não reduz a pobreza entre os idosos. A linha da pobreza em Portugal fica em cerca de 400€/mês e a da pobreza severa abaixo dos 300€/mês. O valor das pensões mínimas corresponde, pois, a uma situação de pobreza ou mesmo pobreza severa.

Ao mesmo tempo que os idosos pobres ouviam Paulo Portas na televisão a falar do aumento das suas pensões em 2€, viam ser-lhes retirados 9€ no CSI. Quem já não tinha quase nada, com a direita, perdeu 7€ a cada mês que passou.

Será que a Dra Assunção Cristas já não se lembra do seu próprio Governo?

Para proteger e dar direitos aos idosos há muitas coisas a fazer.

Uma delas é recuperar rendimentos.

O Bloco vai continuar a defender que se aprofunde a atualização das pensões.

E quanto ao Complemento Solidário para Idosos, que já subiu por nossa proposta cerca de 40 euros por ano, a verdade é que muitas pessoas de idade continuam a não saber que têm direito nem aonde se dirigir nem que papéis têm que apresentar. Por isso é preciso que saibam que têm direito ao CSI e deveria haver uma campanha que divulgasse esta prestação e as suas novas regras, inclusive na televisão e na rádio, porque há muita gente que ouve rádio e até não sabe ler ou escrever.

As tarifas sociais de água e eletricidade devem ser mais baixas para as pessoas que têm menos recursos.

Nós precisamos também dos serviços públicos, que a Direita degradou.

Precisamos de transportes e de horários melhores, houve carreiras encurtadas que já não vão onde iam anteriormente, os horários também foram encurtados. É preciso que os transportes sejam um serviço público que nos sirva. Para ir a um centro de saúde, para ir aos correios buscar a pensão, precisamos de transportes a preços que se possam pagar.

Precisamos de um Serviço Nacional de Saúde como resposta pública. A isenção que esta nova maioria fez em termos de taxas moderadoras foi um passo importante. É preciso concretizar o projeto de resolução do Bloco sobre o aumento de camas públicas na rede de cuidados continuados, até aproveitando alas de internamento que tenham ficado vagas, porque se sabe que mais de 90% das pessoas idosas têm um acesso dificultado a esta rede. Precisamos de reforçar o apoio domiciliário. O Serviço de Apoio Domiciliário tem de ter mais profissionais a trabalhar, os horários devem ser alargados. Há centros de saúde e Juntas de Freguesia que disponibilizam assistências várias em termos de refeições, limpeza quer dos utentes quer das próprias casas e das roupas. Mas isto não acontece em todo o território nem há ainda resposta a todas as necessidades.

Tenho conhecimento, como muitos de vós terão, de pessoas que estão institucionalizadas nos lares. Há falta de conhecimento por parte dos familiares do que lá se passa, das refeições que têm, os horários de visitas são frequentemente muito restritivos, muitas vezes há poucos incentivos ao que as pessoas lá fazem, estão sentadas num cadeirão e têm uma televisão ligada, que muitas vezes só está ligada por estar, mesmo quando ninguém olha para lá, é um ruído de fundo.

É preciso acabar com realidades de que tenho conhecimento que são prejudiciais ao nosso bem-estar e à nossa saúde física e mental. Entendo que deveria existir um manual de boas práticas, de aplicação obrigatória nos lares de idosos.

É necessária uma estratégia de combate ao abandono dos idosos e que se encontrem alternativas à institucionalização. É urgente resolver o problema das listas de espera nos lares e acabar com negócios vergonhosos em lares da segurança social.

Além disso, os idosos devem ter acesso à cultura e deve ser reconhecida a nossa participação política.

Sobre todas estas questões, o Bloco de Esquerda tem manifestado preocupação, tem apresentado propostas e tem-se batido no Parlamento e fora dele.

Independentemente de cada uma das propostas concretas que aqui estão em debate, e que teremos oportunidade de discutir na especialidade, em conjunto com muitas outras propostas de outros partidos, o que o CDS propôs neste debate foi uma operação de lavagem da sua imagem.

Quem transformou a nossa vida num inferno, quem nos enganou e maltratou durante os quatro anos em que esteve no poder, quer diretamente com cortes brutais em pensões e apoios sociais, quer indiretamente fechando serviços, aumentando taxas e desigualdades, vem agora apresentar-se como nosso defensor.

A nova maioria de que o Bloco faz parte tem feito um caminho importante na recuperação de rendimentos.

Está tudo feito? Não, não está!

Falta o caminho da convergência das pensões com o salário mínimo. Falta o direito de todos à reforma por inteiro depois de 40 anos de trabalho e de descontos. Falta rede de serviços públicos e apoios sociais capazes.

Mas estamos a introduzir significativas melhorias para as camadas mais envelhecidas e carentes da população trabalhadora. Não faltámos a este caminho no passado nem faltaremos no futuro, quer na discussão de propostas legislativas quer no debate sobre o próximo orçamento.

Como sempre, não desistimos de tudo o que falta fazer.

Intervenção na Assembleia da República no debate do CDS – Envelhecimento ativo e proteção de idosos em 2 de junho de 2016

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