Grande Muralha Verde não cala os críticos

13 de outubro 2010 - 13:22

A floresta artificial plantada na China para deter o rápido avanço do deserto ocupará 400 milhões de hectares em 2050. Porém, especialistas criticam os seus propalados benefícios para mitigar a mudança climática. Por Mitch Moxley, IPS/Envolverde.

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A floresta artificial plantada na China ocupará 400 milhões de hectares em 2050 e cobrirá mais de 42% do território nacional. Foto www.futureforest.org.

A China tem a maior floresta artificial do mundo – conhecida como a Grande Muralha Verde –, que cobre mais de 500 mil quilómetros quadrados. O Partido Comunista anunciou, este ano, que cumpriu seu objectivo para 2010 de alcançar 20% do território. O governo pretende plantar uma faixa de árvores de 4.480 quilómetros que se estenderá da província de Xinjiang, no extremo oeste, até a de Heilongjiang, no leste.  Em 2050, estima-se que cobrirá mais de 42% do território nacional.

O projecto começou em 1978. A Assembleia Popular Nacional, órgão legislativo da China, aprovou três anos depois uma resolução obrigando toda pessoa maior de 11 anos a plantar por ano pelo menos três álamos, eucaliptos ou outras espécies. As pessoas plantaram cerca de 56 mil milhões de árvores na China na década passada, segundo dados oficiais. Em 2009, foram semeados 5,88 milhões de hectares.

 

“É o maior programa já visto no mundo”, afirmou o ambientalista e ex-vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore. A China plantou duas vezes e meia mais árvores por ano do que os demais países reunidos, disse o prémio Nobel da Paz. A China superou os Estados Unidos como maior emissor de dióxido de carbono do mundo em 2007. A previsão é que a tendência seguirá ao lado do crescimento económico deste país.

Pequim investiu grandes quantias de dinheiro em tecnologia limpa e prometeu fechar milhares de fábricas altamente contaminantes. Mas sua falta de compromisso com padrões e acordos internacionais e a lentidão de seus avanços nessa área levaram a críticas de inúmeros países. Os benefícios do reflorestamento são evidentes, segundo seus defensores, porque ajuda a deter o rápido avanço do deserto no oeste e norte do país.

A China informou, em 2006, que 2,63 milhões de quilómetros quadrados, 27% de seu território, eram deserto, acima dos 18% registados em 1994, segundo informe da Convenção das Nações Unidas de Luta contra a Desertificação. Além disso, a pradaria perde 15 mil quilómetros quadrados por ano desde o começo da década de 1980.

As novas florestas absorvem mais dióxido de carbono do que as de crescimento lento, que quase não restam na China. Árvores de crescimento rápido, como álamo e bétula branca, talvez capturem o dobro de dióxido de carbono do que os abetos, alerces e pinheiros coreanos, segundo especialistas.

O governo serve-se da Grande Muralha Verde como propaganda dos seus esforços para combater a mudança climática. Cerca de três milhões de membros do Partido Comunista, funcionários e trabalhadores-modelo plantam árvores na Primavera, acontecimento bastante divulgado no país.

Em Abril, o presidente Hu Jintao plantou árvores em Pequim para comemorar o 26º aniversário do programa voluntário na capital. Dois milhões de pessoas uniram-se ao mandatário, segundo o estatal Diário do Povo.

O governo destaca a importância da floresta para combater décadas de danos ambientais, mas a campanha oficial tem vários críticos. Estes afirmam que as espécies plantadas e sua localização limitam a efectividade da iniciativa. 

De fato, a Grande Muralha Verde contribui com a significativa queda da qualidade da floresta, argumentam, mas pouquíssimos animais se adaptam a ela, segundo vários especialistas.

Além disto, a cobertura florestal acelerou a degradação ecológica ao exercer pressão sobre o precioso recurso hídrico em zonas áridas e semiáridas, explicou Jiang Gaoming, professor do Instituto de Botânica da Academia de Ciências Chinesa e vice-secretário geral da Sociedade para a Conservação Biológica. As espécies plantadas na Grande Muralha Verde não são autóctones, disse à IPS. “As árvores nativas não são mais eficazes para prevenir a desertificação”, insistiu.

O reflorestamento e a plantação de árvores em áreas que não eram florestais, na verdade, diminuem o potencial da cobertura vegetal para conter a mudança climática, segundo estudo das universidades de Oklahoma, nos Estados Unidos, e de Fudan, em Xangai, divulgado em Maio.

As regiões onde as árvores autóctones foram substituídas por novas espécies não ajudam a controlar as emissões de dióxido de carbono, conclui a pesquisa. Ao transformar terras agrícolas em florestas, é reduzida a capacidade do solo para absorver gases contaminantes.

O solo transformado perde 80% de sua capacidade para degradar o metano, outro gás-estufa que concentra mais calor na atmosfera do que o dióxido de carbono, segundo os autores do estudo.

A Grande Muralha Verde até ajudou um pouco a deter o avanço do deserto, reconheceu Jiang Fengguo, director da Estação de Supervisão da Conservação da Água e do Solo de Hexigtan Banner, na região autónoma da Mongólia Interior. Mas também preocupa o impacto que possa ter na cadeia biológica local, incluída a fauna, acrescentou Jiang Fengguo. É possível que não seja suficiente, disse à IPS. “Continuará a haver problemas. A desertificação existe e a deterioração contínua do meio ambiente não foi revertida”, destacou.

Artigo de Mitch Moxley, publicado em IPS/Envolverde.