A capa do “JN” de hoje não pode deixar ninguém indiferente: “Crise faz crescer número de alunos que dependem dos apoios do Estado”. Quando se entra propriamente na notícia nas páginas 4 e 5 do jornal, a apreensão aumenta. São quase 40% dos alunos que são abrangidos pela Acção Social Escolar, ou seja, 370.035 alunos num universo de 990.772. São dados do Ministério da Educação, mas os directores e as autarquias receiam que o número continue a subir devido ao agravamento da crise económica. O aumento tem-se verificado consecutivamente desde 2020, o qual o Ministério da Educação atribui aos “efeitos da pandemia”.
Quem está no terreno sabe que estes números, infelizmente, pecam por defeito, visto ser evidente uma pobreza encapotada que fica fora dos critérios e requisitos baixíssimos para se ser elegível aos apoios. Como refere Filinto Lima da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas “É preciso ser muito pobre para ter direito aos escalões A e B”, visto os apoios fornecidos para material escolar e refeições não passar de “uma aspirina”. Escolas e autarquias criam iniciativas, tais como recolha de alimentos para fornecimento de cabazes alimentares, lanches ou reforço dos valores em material escolar. Num agrupamento em Viana do Castelo, um dos exemplos referido na peça assinada por Alexandra Inácio, os cabazes distribuídos incluem não apenas produtos alimentares, mas também produtos de higiene. Qualquer país decente se envergonhará quando há casos como o de “uma aluna que faltava sempre que tinha período por não ter dinheiro para pensos higiénicos”, ou de alunos que não podem participar em visitas de estudo porque não podem pagá-las!
Claro que é impossível “ter alunos atentos e empenhados se não estiverem bem alimentados”. Num destaque na notícia com o título “Equidade” refere-se que “os resultados dos alunos com Acção Social Escolar nas provas nacionais do 9º ano e nos exames do Secundário são mais baixos em todas as disciplinas, comparativamente aos que não têm escalão, especialmente a Matemática A, Filosofia, Biologia e Geologia e Física e Química”, segundo o relatório sobre sucesso e equidade divulgado pela Direcção-Geral de Estatísticas de Educação e Ciência.
Quando os professores lutam pela dignificação da sua carreira e pelos seus direitos estão a lutar pela defesa da Escola Pública e por tudo o que ela representa. A insensibilidade que têm encontrado no ministério da educação e no governo é a insensibilidade com que um governo de maioria absoluta olha para os governados a quem dando esmolas e migalhas se ufana de ter contas certas e resultados admiráveis.
Mas a pobreza é indisfarçável. Nem é preciso o teste do algodão.
Artigo publicado em spgl.pt a 9 de maio de 2023
