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Um concelho em “ponto-morto”

Loures é hoje um concelho em “ponto-morto” e o grande perigo do “ponto-morto” é que ou a máquina para, quando perde a velocidade, ou descamba ribanceira abaixo.

A menos de dois anos da entrada (obrigatória) em vigor da municipalização aprovada por PS e PSD nos bastidores da AR, os sinais de que a coisa pode correr mesmo muito mal são por demais evidentes em diversos municípios de norte a sul do país. Apesar de não ser governado por nenhuma destas cores políticas, o município de Loures é um destes malogrados exemplos.

Sem uma estratégia de base que promova o desenvolvimento do sexto concelho mais populoso do país, a falta de capacidade de cooperação política com outras forças políticas e até com outros órgãos de poder tem promovido uma imobilidade sem paralelo.

Loures é hoje um concelho em “ponto-morto”, passe a analogia automobilística, e o grande perigo do “ponto-morto” é que ou a máquina para, quando perde a velocidade, ou descamba ribanceira abaixo.

Onde a falta de água é a norma

Um bom exemplo desta falta de visão e de organização é a falta de água recorrente. São frequentes as roturas em várias localidades do concelho de Loures, com especial incidência em São João da Talha e Bucelas. Na freguesia de Bucelas, por exemplo, esta situação já levou, inclusive, à realização de um abaixo-assinado com mais de 1200 assinaturas, promovido pela própria Junta de Freguesia, da mesma cor política do executivo municipal.

Existem hoje mais de 600 quilómetros de condutas de fibrocimento em todo o concelho de Loures, muitas delas degradas pelo tempo. Recorde-se que estamos a falar de material com décadas e que contém amianto, o que pode constituir um perigo real para a saúde pública.

A verdade é que não há um plano estratégico para a substituição destas condutas, calendarizado no tempo, de forma progressiva e com metas estabelecidas. Há reparações esporádicas, tapa-buracos e remendos temporários. Navegação em “ponto-morto” e à vista, portanto.

Um canil para 40 animais num concelho com mais de 205 mil habitantes

Outro exemplo flagrante desta falta de visão estratégica está na ordem do dia: a questão do CRO, ou Canil Municipal. Durante o mandato anterior, o Bloco de Esquerda alertou várias vezes para o facto do CRO estar perto da sua lotação máxima. Hoje, com matilhas de cães à solta em várias freguesias, com cães drogados e envenenados pelas ruas, a autarquia lá vem, à pressa, anunciar a criação de um gatil e a ampliação do Canil Municipal. Casa roubada, trancas à porta, lá diz o povo.

Mas, há mais exemplos desta falta de estratégia: no turismo, na educação, nos bairros sociais, só para citar alguns. Tomemos o exemplo do turismo: o Bloco apresentou, há algumas semanas, na Assembleia Municipal de Loures, uma proposta para a implementação de uma Taxa Turística Municipal a partir de 2020. A proposta foi rejeitada, sob pretexto de que o turismo ainda não teria expressão suficiente ou de que poderíamos estar a “matar a galinha dos ovos de ouro”.

Importa dizer que, em 2017, houve 121.300 dormidas no concelho de Loures, segundo dados do Pordata.

Neste momento, estão em construção nove novos hotéis de média dimensão no concelho de Loures, nomeadamente nas freguesias de Moscavide e Portela e Sacavém e Prior Velho. Além disso, com a construção do novo Aeroporto do Montijo, Loures ficará numa posição privilegiada entre os dois aeroportos da capital.

Segundo um artigo do jornal Expresso, de 30 de março, com a construção dos nove novos hotéis, a capacidade hoteleira no concelho de Loures vai quintuplicar. Isto significa que a Taxa Turística podia render mais de 650 mil euros por ano à Câmara Municipal de Loures. Isto sem contar com o alojamento local. São 2,5 milhões num mandato! Para uma autarquia que está constantemente a alegar falta de verba para a realização de vários investimentos prioritários, alguns deles tão elementares como a falta de saneamento básico, é, no mínimo, um pouco precipitado recusar receita extraordinária e que não onera sempre os mesmos.

A vergonha eternizada do Bairro da Torre

Há mais de um ano que a Câmara Municipal de Loures e o IHRU - Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana - andam em negociações para acabar com a situação vergonhosa do Bairro da Torre, bem conhecida de todos e que se arrasta há décadas. Este caso, como tantos outros, é bem elucidativo da gritante inabilidade da autarquia para criar pontes e fechar negociações com outras entidades com sucesso.

Em vez disso, joga com o tempo, num permanente pingue-pongue burocrático, empurrando a solução quiçá para tempos eleitoralmente mais favoráveis.

E o veículo (ou o concelho) lá vai andando, ao sabor do traçado mais ou menos sinuoso da estrada, umas vezes parado à espera de melhores ventos, outras despencando a toda a velocidade, num município onde o populismo espreita à esquina, à espera de uma oportunidade que já tardou mais ou que a população se farte de navegar à vista. Até quando?

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Jornalista
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