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Taxa turística, para nos entendermos

Os comunistas confundem-se sobre Taxa Turística. Municípios cobram taxas por serviços prestados e decidem como aplicar as receitas recolhidas. O Bloco quer tirar o dinheiro da Taxa Turística aos hoteleiros e passar a aplicá-lo em habitação acessível. Simples, não é?

Numa coluna no jornal i, Tiago Mota Saraiva, arquitecto e militante do PCP, criticou nesta segunda-feira uma das propostas que os candidatos do Bloco de Esquerda levaram aos debates pré-eleitorais em Lisboa e Porto: a fixação da Taxa Municipal Turística em dois euros (sendo hoje um euro em Lisboa e não existindo no Porto). Repetindo uma estranha alegação já ouvida a João Ferreira num recente debate eleitoral, Mota Saraiva escreve que “a taxa turística não pode ser aplicada na resolução do problema da habitação” porque “uma taxa implica a prestação de um serviço, pelo que a sua aplicação tem de ser, necessariamente, afecta à actividade turística”.

O ponto é de ordem jurídico-constitucional e Mota Saraiva está simplesmente errado. De facto, as taxas municipais implicam um serviço. A Taxa de Reforço de Infraestruturas é paga à Câmara por quem constrói um prédio. A Câmara, pelo seu lado, reforça esgotos, estradas, passeios, etc. A Taxa de Resíduos é paga pelos munícipes; os serviços da Câmara garantem a recolha dos resíduos. A Taxa Turística é paga pelos turistas por cada dormida num estabelecimento hoteleiro; a taxa justifica-se pela carga adicional do turismo... sobre os serviços garantidos pelo município (limpeza urbana, vias de circulação). Outro assunto é o destino a dar pela Câmara ao conjunto das suas receitas, incluindo as que são geradas por taxas municipais como estas. A decisão é dos órgãos municipais e é estritamente política. Por isso, o Bloco tem criticado a entrega destas receitas pela CML a um fundo gerido pelos donos dos hotéis e propõe a sua aplicação no reforço de políticas municipais de habitação acessível.

Definitivamente ilegal seria criar um imposto - que Mota Saraiva afirma apoiar - “cuja receita pudesse ser investida na minimização da pegada turística e, aí sim, na resolução dos problemas da habitação”. É que a lei, aqui sim, proíbe impostos consignados a despesas pré-determinadas. Naturalmente, a ideia de Mota Saraiva não teve cabimento no programa da CDU.

Mota Saraiva regista ainda que, em 2015, na Assembleia Municipal de Lisboa, o Bloco votou contra a taxa turística pela boa razão de esta estar nas mãos dos empresários do turismo. Ao contrário do que diz Mota Saraiva, o Bloco não mudou de posição e, ao invés, mantém a sua oposição a esta escolha. Já Mota Saraiva, que “nunca esteve em desacordo com a taxa”, deveria atentar no discurso mais ponderado e crítico da candidata comunista à Câmara do Porto. Em entrevista à Rádio Renascença, Ilda Figueiredo relativiza: “Tudo depende de que taxas estamos a falar, mas, sobretudo, tudo depende do destino dessa taxa. Porque se a taxa turística for para dar resposta a este grande desafio, parar a sangria da população do Porto e procurar, pelo contrário, reabilitar para os moradores todas as zonas degradas que temos no Porto, e que também sabemos que são muitas, então isso pode ter alguma vantagem. Agora, se a taxa turística for para ainda dinamizar mais o turismo e, com isso, contribuir para a expulsão de moradores da cidade, eu diria que isso é negativo”.

Na voz de Ilda Figueiredo, talvez as ideias do Bloco sobre a taxa turística soem menos “ilegais” a Tiago Mota Saraiva e o arquitecto possa assim rever a sua sentença inicial de que “a taxa turística não pode ser aplicada na resolução do problema da habitação”.

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda. Jornalista.
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