Sabedoria indígena

porCarlos Carujo

04 de abril 2010 - 0:00
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A crise ecológica do planeta é uma evidência, apesar do negacionismo ambiental continuar a espreitar todas as janelas de oportunidade para fazer a sua propaganda. Mesmo contra os seus interesses, os donos do mundo são obrigados a reconhecê-la e a demonstrar a sua incapacidade de resposta. A cimeira de Copenhaga foi o símbolo do falhanço do mundo dos ricos e dos governos em combater as alterações climáticas.

Viver

Mas os/as índios/as andam atrevidos e estão decididos a não se deixar matar pelos cowboys. Por isso, Evo Morales convocou a Conferência Mundial dos Povos sobre Alterações Climáticas que se reunirá de 19 a 22 de Abril em Cochabamba, Bolívia. Esta será um sinal da determinação dos movimentos sociais em apresentar alternativas ao modelo capitalista de produção e de consumo. A sua agenda inclui desde a proposta de referendo mundial sobre as alterações climáticas, à criação de um tribunal internacional para a justiça climática, ao projecto de declaração universal dos direitos da terra. E se os ricos que não se entenderam sobre quem pagaria um pouco da factura vêem-se agora confrontados pelos/as índios/as e amigos/as com a questão da dívida climática que têm face ao resto do mundo, em nome da justiça climática e da sobrevivência da espécie humana ameaçada pelo capitalismo.

Viver bem

Os/as índios/as andam mesmo inquietos/as e inquietam. Falam em descolonizar-se e acabar com os Estados. Falam em "viver bem", uma estranha forma de vida comunitária em harmonia com a Terra, em equilíbrio de género, eliminando a exploração num paradigma incompatível com o capitalismo. Opõem-se à acumulação desenfreada, ao produtivismo e ao consumismo predadores da Terra. Recusam o falso "bem-estar" consumista. Criticam o suposto desenvolvimento e as ideologias do crescimento económico. E, se os indígenas fossem tugas, talvez os víssemos chegar ao ponto de querer substituir o PEC por um Pacto de Bem-viver solidário e sustentável.

Revoltar

Os índios não têm papas na língua. Por exemplo, David Choquehuanca, Ministro das Relações Exteriores da Bolívia, na reunião preparatória do Fórum Permanente sobre questões indígenas da ONU afirmava (revista-amauta.org) : "durante 500 anos, tentaram fazer-nos desaparecer. Não apenas fisicamente, uma vez que tentaram matar a nossa língua, musica, comida, cultura. Trabalhámos na clandestinidade, preservando os nossos saberes, porque sabíamos que um dia voltaríamos ao caminho do equilíbrio, o Pachakuti (...). Dividiram-nos com bandeira, hinos. Mas nós sabemos que um dia não existirão fronteiras. (...) Queremos voltar a ser rebeldes outra vez, mas rebeldes com sabedoria."

Revoltar para viver Revoltar para viver bem. O nosso projecto é, portanto, índio. Sejamos rebeldes com sabedoria. Aprendamos novas línguas. Pela Sumac Kawsay e em defesa da Pachamama, é tempo de sermos todos/as índios/as.

Carlos Carujo

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Carlos Carujo

Professor.
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