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Quantos pobres são precisos para produzir um rico?

Os 25 mais ricos do país viram a sua fortuna crescer 17,8% em 2010 e é agora superior a 17,4 mil milhões de euros.

A crise está a verificar-se um bom negócio para a acumulação dos mais ricos e a austeridade a forma mais célere de transferência de rendimentos do trabalho para o capital.

A questão levantada por Almeida Garrett, e que dá o título a este artigo, está plena de actualidade. Enquanto os mais ricos aumentam as suas fortunas, as desigualdades grassam pelo país. Hoje são já cerca de dois milhões os portugueses que vivem abaixo do limiar de pobreza. Se as transferências sociais forem eliminadas, este número passa para mais do dobro. São precisos cada vez mais pobres para fazer um rico e as políticas de austeridade agudizaram esta realidade. Vivemos o tempo do saque máximo. Quando nos dizem que o país vive acima das suas possibilidades, só podem estar a falar das imensas fortunas que se alimentam do roubo que nos estão a fazer!

O Governo já fez a sua escolha: decidiu que nada pedirá às grandes fortunas. Quem pagará a crise serão os mesmos de sempre. O Ministro das Finanças apontou o imposto extraordinário aos trabalhadores e pensionistas, deixando escapar propositadamente de qualquer sacrifício os rendimentos de juros de capital e os dividendos. Com esta escolha, por exemplo, o Governo levará metade do subsídio de Natal aos trabalhadores da Corticeira Amorim, mas nada pedirá a Américo Amorim sobre os dividendos que retirar da empresa. Para uns, atacam-se os tostões, enquanto para os outros se perdoam os milhões. Só em 2010 foram mais de 7 mil milhões de euros distribuídos em dividendos, o que dá conta dos montantes que o Governo prefere não taxar. Este é o caminho que agudiza as desigualdades e que torna o país mais insustentável.

Aos portugueses está a ser pedido um esforço imenso e diariamente nos impõem as mensagens de que a austeridade é inevitável. A realidade demonstra que a austeridade é uma escolha ao serviço daqueles que nunca fizeram sacrifícios. No tempo das inevitabilidades, lembremos Garrett para vencer as desigualdades: “E eu pergunto aos economistas, políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infâmia, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico?”

Sobre o/a autor(a)

Deputado, líder parlamentar do Bloco de Esquerda, matemático.
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