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Os tempos da desigualdade de género

Os usos que damos ao tempo não são iguais e a maneira como mulheres e homens ocupam o tempo reflete as desigualdades de género que existem na nossa sociedade.

Em Portugal, grande parte das pessoas passa férias cá dentro durante o mês de Agosto sendo as praias o destino mais escolhido. Nas férias, os usos do tempo alteram-se e procura-se quebrar a rotina do quotidiano. No dia a dia, os usos que damos ao tempo não são iguais e a maneira como mulheres e homens ocupam o tempo reflete as desigualdades de género que existem na nossa sociedade.

No passado dia 28 de Junho, o Centro de Estudos para a Intervenção Social (CESIS) e a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE) apresentaram um primeiro conjunto de resultados do Projeto INUT – Inquérito Nacional aos Usos do Tempo de Homens e de Mulheres.

Os resultados revelam que a maioria das pessoas questionadas durante o estudo encontra-se em profissões remuneradas exercidas a tempo inteiro no contexto do mercado de trabalho. Segundo este Inquérito Nacional aos Usos do Tempo, os homens ocupam em média 42 horas e 55 minutos ao trabalho pago por semana e as mulheres cerca de 40 horas e 47 minutos.

É preciso reorganizar o trabalho e sobretudo reduzir o tempo efetivo de trabalho para que homens e mulheres tenham mais tempo para a vida pessoal

No que se refere aos tempos médios dedicados ao trabalho não pago, isto é às tarefas domésticas e ao trabalho do cuidado as diferenças acentuam-se revelando uma assimetria de género, em particular em relação às tarefas domésticas. Em média, os homens ocupam cerca de 2 horas e 38 minutos ao trabalho não pago diariamente ao passo que as mulheres ocupam cerca de 4 horas e 13 minutos por dia.

Estes tempos marcam o ritmo das desigualdades entre mulheres e homens em Portugal e fazem-nos pensar sobre a importância de, por um lado, melhores políticas de articulação entre a vida pessoal e profissional e de organização do trabalho e de, por outro lado, repensar a educação para a igualdade.

No âmbito do trabalho pago, homens e mulheres passam demasiadas horas no trabalho sendo difícil assegurar o tempo necessário para assegurar as outras tarefas necessárias à vida e quase impossível o exercício de uma cidadania ativa. É preciso repensar a maneira como se organiza o trabalho e impedir que o progresso nas carreiras (e em alguns casos a manutenção do posto de trabalho) dependa da disponibilidade para trabalhar para além das 35 horas semanais. Soluções a tempo parcial e outras ensaiadas a pensar nas mulheres só vão agravar as disparidades existentes e criar sérios problemas de futuro para as mulheres. É preciso reorganizar o trabalho e sobretudo reduzir o tempo efetivo de trabalho para que homens e mulheres tenham mais tempo para a vida pessoal.

No âmbito do trabalho não pago é preciso investir na sensibilização e na formação para a igualdade

No âmbito do trabalho não pago é preciso investir na sensibilização e na formação para a igualdade e ser criativa na criação de medidas que promovam a partilha do trabalho doméstico. Se no que diz respeito às tarefas do cuidar, provavelmente por influência do aumento das licenças de paternidade e da sensibilização para a partilha das responsabilidades parentais, o tempo que homens e mulheres dedicam ao cuidado das crianças aproximou-se, o mesmo ainda não acontece quando pensamos nas tarefas domésticas como limpar, cozinhar entre outras. Como estamos em Agosto talvez um bom exemplo seja olhar para as famílias que estão ao nosso lado na praia e pensar quem fez as sandes e arrumou a lancheira, as tolhas e o protetor solar bem cedo antes de todas e todos tomarem o pequeno almoço ou quem irá lavar os fatos de banhos e estender as toalhas para que tudo esteja pronto no dia seguinte? Na maioria dos casos provavelmente foi uma mulher.

Os usos do tempo tem um papel preponderante na luta pela igualdade entre homens e mulheres e deve ser um fator a pensar nas relações laborais e nas relações sociais. Todas/os precisamos de tempo para poder ser feliz!

Sobre o/a autor(a)

Licenciada em Relações Internacionais. Ativista social. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990
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