Está aqui

O problema dos professores tem solução

Quem pensa que a vida de professor é fácil está redondamente enganado, a profissão não é atrativa, os salários são baixos… O problema tem solução e a solução tem custos. A falta de solução, essa, tem custos bem mais graves e definitivos.

Todos sabemos que os docentes constituem uma classe envelhecida. Em 2021 foi divulgado um relatório do Conselho Nacional da Educação, mais um, que salientava o envelhecimento progressivo e acentuado dos docentes da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário.” (CNE, 2021)

Já em 2016, quando António Costa chegou ao governo, o Conselho Nacional da Educação questionava o Governo sobre a necessidade de planeamento: “os dados do envelhecimento da população docente, conjugados com os referentes à redução dos candidatos e diplomados nos mestrados em ensino, devem merecer uma análise profunda da caracterização das condições de sustentabilidade do sistema de ensino”. O CNE recomendava “a integração urgente de mais professores no sistema e o aumento da estabilidade dos docentes nas escolas”. Em 2019, o CNE estimou o número de aposentações de docentes do quadro nos anos seguintes, a partir de um modelo desenvolvido pela Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência: até 2030, 58% dos professores do quadro vão aposentar-se. Um quarto dos professores no ativo tem mais de 60 anos e muitos deles sentem-se esgotados com a quantidade de trabalho que lhes é solicitada.

Muitos professores foram obrigados ao “caminho das pedras” até conseguirem alcançar um lugar no quadro: a grande maioria percorreu o país de mala às costas sem quaisquer ajudas de custo. Só por volta dos 47 anos conseguiram a tão almejada vinculação. Mas o que hoje se verifica nas escolas é diferente e não é melhor. Face ao défice de formação de novos docentes, regista-se a chegada às escolas de colegas sem qualquer tipo de formação pedagógica ou experiência no ensino. E, mesmo assim, continua a falta de professores nas escolas. Há alunos sem professor, pelo menos a uma disciplina, um ano letivo inteiro. Nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, tal como o Algarve, o problema de recrutamento é dramático. São regiões praticamente inacessíveis para quem precisa de habitação. Mesmo o simples aluguer de um quarto, com o atual custo de vida, não é comportável para quem inicia a carreira de professor.

O modelo de recrutamento que o Ministério da Educação quer levar avante também não servirá para “aproximar, fixar e vincular”, como diz o ministro. Os dez Quadros de Zona existentes passarão a ser 63. O professor que vincule no QZP X tem, no ano seguinte, a possibilidade de concorrer apenas aos três QZP adjacentes. Na prática, um professor que seja de Braga e seja colocado em Beja, poderá tardar, neste modelo, mais de dez anos a aproximar-se da sua residência.

Outro aspeto a considerar é a progressão na carreira, nomeadamente, no que diz respeito ao acesso ao 5.º e 7.º escalões da profissão que é feito de forma penosa e pouco transparente. Este acesso é baseado num sistema de quotas e está dependente de uma avaliação externa e interna e, por isso, tem como consequência o estrangulamento da progressão na carreira dos docentes, ficando estes, muitas vezes, anos a fio à espera de vaga.

A juntar a tudo isto, nada se conhece que possa aliviar a sobrecarga de trabalho, que é outro fator que torna a profissão indesejada. Para desenvolverem o seu trabalho corretamente, os professores são obrigados a levar muita dessa labuta para casa, somando umas 48 horas de trabalho por semana, muito longe das 35 horas estabelecidas no Estatuto da Carreira Docente (ECD). Quem não está dentro do processo / carreira não sabe do que vai acontecendo pelas escolas deste país: desde a convocação de professores para reuniões fora do seu horário de trabalho e em período pós-laboral, à frequência de ações de formação de “carácter obrigatório” a maior parte das vezes não coincidentes com o horário da componente não letiva, participação em atividades no período de intervalo dos docentes e a reposição de horas nos cursos profissionais fora do horário do professor, entre outras.

Quem pensa que a vida de professor é fácil está redondamente enganado, a profissão não é atrativa, os salários são baixos, os congelamentos, as ultrapassagens, o modelo de avaliação caquético, o excesso de alunos por turma e de turmas por docente, o número de níveis atribuídos a cada docente, as reuniões, a burocracia… Quando o governo acordar, não tem professores para ensinar.

O problema tem solução e a solução tem custos. A falta de solução, essa, tem custos bem mais graves e definitivos. É por tudo isto e muito mais que os professores estão e continuarão em luta.

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda. Professora.
Comentários (1)