Está aqui
O povo nicaraguense não mudou, a Frente Sandinista sim
A revolução da minha juventude foi a da Nicarágua!
Quando eu tinha 18 anos, o comandante Zero tomou o palácio nacional em Manágua numa ação espetacular e vitoriosa e, um ano depois, a Frente Sandinista vencia as tropas da ditadura, cidade por cidade, até chegar a Manágua.
O ditador fugiu, mas anos depois, refugiado em Assunção no Paraguai, o seu carro foi atingido num atentado por um tiro de bazuca.
O novo governo foi a esperança de uma geração em todo o mundo.
Aqui em São Paulo fazíamos campanha no centro da cidade com banquinhas de material em solidariedade e, após a queda de Somoza, em 1979, gritávamos nas passeatas contra a ditadura que "Somoza já caiu, agora é o Brasil".
Apoiamos o envio de uma brigada internacionalista para lutar com os sandinistas. A Nicarágua era a nossa Espanha, Manágua a nossa Madrid. Mas, dessa vez, eles não passaram e nós vencemos!
O governo sandinista resistiu duramente ao cerco militar e bloqueio económico estadunidense e aos mercenários da extrema-direita que operavam desde Honduras com o apoio de Washington.
Mas, o sandinismo também optou por conciliar com a burguesia, reprimir as greves e os movimentos de esquerda, balcanizar a revolução centro-americana e, a partir de 1990 a direita retorna ao poder nas eleições.
Quando o sandinismo ressurge e consegue eleger Daniel Ortega, em 2007, esse partido e esse líder eram muito diferentes do passado.
Após a saída de uma ala esquerda, alia-se com a antiga direita somozista do ex-presidente Alemán, com quem estabelece um pacto, converte-se ao catolicismo e se reconcilia com Monsenhor Obando y Bravo, cardeal que fora um oponente do sandinismo.
Além de ter sido acusado de abuso sexual pela filha adotiva e de ter se tornado um milionário com ostentação de consumos de luxo, Ortega aliou-se com os setores ex-somozistas e do conservadorismo católico e evangélico.
Essa figura grotesca, que degenerou o sandinismo, mantendo o nome de um herói como seu rótulo político, passou no último mês a enfrentar uma revolta popular que se iniciou contra um ataque à Previdência social e agora se tornou um movimento pela saída de um governo assassino.
Já passam de 130 os mortos, a enorme maioria abatida pela repressão governamental.
Assim como me emocionei quando adolescente, pela luta do povo nicaraguense que conseguiu derrubar uma ditadura, me comovo novamente pelo levante atual.
O povo nicaraguense não mudou e continua o mesmo: combativo e solidário. O sandinismo mudou muito e se tornou um orteguismo. Eu espero não ter mudado no essencial e continuo ao lado dos povos e contra os governos assassinos.
Adicionar novo comentário