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O nosso dinheiro pela água abaixo

O governo prepara-se para construir mais nove barragens. Ao todo, serão gastos dezasseis mil milhões de euros com as barragens, podendo-se antecipar um aumento de 10% nas tarifas de eletricidade como consequência.

Em tempos de cortes brutais nos salários, nos subsídios e nos serviços públicos, o governo prepara-se para construir mais nove barragens, ao abrigo do Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico (PNBEPH). Ao todo, estimam as ONGs ambientalistas com base em dados da EDP, serão gastos dezasseis mil milhões de euros com as barragens, podendo-se antecipar um aumento de 10% nas tarifas de eletricidade como consequência1. Os benefícios, contudo, são modestos, estimando-se que as novas barragens vão abastecer 3% da procura de eletricidade e vão contribuir para uma redução de 0,7% nas emissões de gases com efeito de estufa e de 0,8% na importação de combustíveis fósseis.

Falar de mau negócio neste caso é um eufemismo. As novas barragens vão destruir ainda mais os nossos rios, dado que são uma ameaça à qualidade da água e à sobrevivência de espécies animais e vegetais. Com o alagamento de vastas extensões de terras, solos agrícolas e florestas naturais serão perdidas e o mundo rural sofrerá mais um golpe em nome do “desenvolvimento”. O nosso último rio selvagem, o Sabor, será destruído e uma das últimas linhas férreas do interior, a Linha do Tua, foi já desmantelada. Estes custos sociais e ambientais, imensuráveis por definição, deveriam ser suficientes para que, pelo menos, fosse estudada uma alternativa às barragens. Mas o governo de Passos Coelho segue os passos do governo de Sócrates e quer-nos convencer de que não há alternativa.

Não é preciso tirar uma licenciatura em Economia ou Contabilidade para perceber que fica muito mais barato para o Estado investir em medidas de redução da procura de energia que investir no aumento da oferta. Com um correto investimento em medidas de eficiência e conservação de energia, podemos reduzir o consumo de energia em bem mais que os 3% que as novas barragens vão oferecer, a uma fração do custo. Como bónus, nós veríamos as nossas faturas de eletricidade a baixar, em vez de aumentar, sem passar frio no inverno e sem desligar as luzes. Numa altura em que nos são exigidos tantos sacrifícios, optar pela “betonização” dos rios em vez de ajudar as famílias a reduzir consumos não é apenas revoltante, é mesmo criminoso.

Sobre o/a autor(a)

Ricardo Coelho, economista, especializado em Economia Ecológica
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