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Naturalmente, Sr. Governador demita-se!

Quantas vezes até agora fomos todos ludibriados pelo Governador do Banco de Portugal?

1. Um trimestre político a um ritmo alucinante. Este final de ano tem sido próprio de um policial. Em outubro foi a enorme alegria de assistir ao Bloco alcançar uma votação histórica, conseguindo tornar-se a terceira força política mais representada no Parlamento. Responsabilidades acrescidas, com certeza, mas venham elas. Depois foram as negociações que haveriam de desembocar no Acordo (também ele histórico) acarretando ainda mais responsabilidades para o Bloco. Tudo a exigir uma enorme coerência, determinação em lutar, em colocar as pessoas no centro das nossas vidas. Ou seja, da política. Logo a seguir, começam as sessões parlamentares desta legislatura e o acordo à esquerda a funcionar. Respiramos, todos. Não durou muito este interregno, esta espécie de tranquilidade. Tal qual um tsunami, o Banif cai-nos em cima. Paf! Com o choque, começa o rol interminável de perguntas dirigidas ao governo da direita deposto. Então, o governo da direita tinha as contas limpas? Tudo em ordem como se gabava Passos. Ah, publicidade enganosa em período eleitoral. Uma ignomínia. O riso mefistofélico de Passos no Parlamento, bem acolitado na bancada pelos seus iguais, não prenuncia nada de bom. Porque se ri assim, o que é que ele ainda esconderá?! A entrevista despudorada de Albuquerque na televisão, tamanha desfaçatez, não tem classificação. Diz-se que está de saída para a Europa. Magnífico processo para a Europa escolher os seus quadros, outra desvergonha que aguentaremos.

2. Até quando teremos de aguentar o Governador do Banco de Portugal? O governo resolveu como pôde o problema Banif e nós, contribuintes, ficamos com mais este imbróglio no colo. Já não temos mais força, já não chegam os nossos braços para pagar as contas dos outros, o tempo foge; teremos de manter a calma e conformarmo-nos? Mas 2015 não terminou e no horizonte adivinham-se os contornos do Montepio enquanto a sombra do Novo Banco se adensa. E vem António Costa dizer que o Governador do Banco de Portugal lhe assegurou que não havia fumo para as bandas da Rua do Ouro. Nem acredito no que ouço. Porque diabo há-de o Primeiro-Ministro fazer fé na palavra do Governador? Quantas vezes até agora fomos todos ludibriados pelo Governador do Banco de Portugal? Não há forma de empurrar o homem para o lado e ir verificar se, de facto, não está a tapar o fogo, a disfarçar outro enorme buraco abusando da impunidade que lhe foi atribuída? Houve tempos em que os direitos divinos deram mau resultado. Que coisa é essa o Banco de Portugal que age contra nós ao serviço do Banco Central Europeu? Tem de haver uma forma de acabar com o trabalho danoso de Carlos Costa e apeá-lo quanto antes. Agora, claro, o pelotão de comentadores, jornalistas, políticos, economistas, fazedores de opinião mostram indignação com o que emergiu à tona de água (exceto, claro, o próprio ex-Presidente do Conselho de Administração do Banif que tinha – pasme-se! – uma solução melhor), tendo perdido oportunidades enquanto apoiaram o governo da direita para repudiar o que ia mal no reino de sua majestade. Os bancos, a atividade financeira gananciosa, nunca mereceram críticas ou ataques claros, verticais da maior parte desses mesmos comentadores. Arranjavam sempre boas explicações tendo como justificação as leis do mercado… Agora, com as barbas a arder porque lhes estão a ir ao bolso, gritam e barafustam aqui d’el-rei! Afinal, as pessoas interessam. E eu, como contribuinte e pensionista, ainda gostava que me explicassem porque não utilizou o governo da direita, na íntegra, a verba que havia sido posta ao dispor de Portugal para sanear a banca. E se a Europa tem responsabilidades nesta [má] gestão, não é altura de reconsiderar essa situação? Invocar os prazos ultrapassados não é resposta. Impõe-se clamar alto que as medidas de carácter técnico e político-administrativo podem sempre ser alteradas pelos próprios que as criaram sendo apenas intocáveis se o objetivo não for resolver os problemas. Será isto pragmatismo ou ideologia?

3. Em democracia, nomeações definitivas são inaceitáveis. O governo da direita deixou o caminho minado, os ex-governantes vão gozando com a nossa ingenuidade e nós, governo e contribuintes, continuamos a dar a outra face numa putativa manifestação de boa vontade mas chega. É mais que tempo de dizer não, de revolver céus e terra e indicar o caminho da porta da rua ao Governador do Banco de Portugal. Há seguramente outros responsáveis que o inquérito parlamentar se encarregará de apurar mas este nem precisa de esperar pelo fim do inquérito. Quanto aos outros, era bom que ao inquérito se seguissem lesto os trâmites previstos para quem prevarica. Desculpem, para quem reincide na prevaricação.

Sobre o/a autor(a)

Bibliotecária aposentada. Activista do Bloco de Esquerda. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990
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