Está aqui

Manuel Heitor: a arte de baralhar e voltar a dar

O Governo decide informar parte dos Centros de Investigação que obtiveram notas altas que não estão livres de cortes nos Orçamentos Plurianuais. I3S, IMM, ICS (apenas para dar alguns exemplos) vão sofrer uma quebra de financiamento na ordem dos 40% a 70%.

Durante o fim de semana, investigadores e responsáveis de vários Centros de Investigação em Portugal receberam uma notícia agridoce: a Fundação para a Ciência e a Tecnologia constatou que a qualidade da investigação levada a cabo lhes conferia uma nota de Muito Bom ou Excelente, porém, o seu financiamento sofrerá cortes que podem chegar a 2/3 dos valores atualmente praticados. Será isto possível? É possível e, por isso, é uma afronta.

A expectativa para que a avaliação aos Centros de Investigação fosse diferente da elaborada pelo anterior Governo era grande. Não podíamos manter uma lógica de "excelência" onde só sobrevive meia dúzia de laboratórios e tudo à volta é paisagem. Desta feita, as notas foram bem mais simpáticas e realistas: em Portugal, faz-se Ciência de qualidade, que é reconhecida. Muito Bom e Excelente voltaram a fazer parte dos quadros finais, o que antevia uma lufada de ar fresco.

Mas como em tudo onde Manuel Heitor toca, em geral, se transforma num presente envenenado, eis que o Governo decide informar parte dos Centros de Investigação que obtiveram notas altas que não estão livres de cortes nos Orçamentos Plurianuais. I3S, IMM, ICS (apenas para dar alguns exemplos) vão sofrer uma quebra de financiamento na ordem dos 40% a 70%. O absurdo vestiu-se de convite ao despedimento em massa. Senhor Ministro: combater as desigualdades da Troika não se faz puxando os financiamentos (comparativamente) mais elevados para baixo; faz-se apoiando os que menos ou nada tiveram no passado.

Nivelar por baixo não faz parte do léxico da maioria parlamentar que lhe conferiu mandato político. Baralhar e voltar a dar, num setor que perdeu 1/3 do seu orçamento desde 2010, confere uma escolha dramática para a área da Investigação. Para quem se apresentou como o principal defensor do objetivo "3% do PIB para a Ciência", parece continuar somente como tema de conversa do chá das 5, no Palácio das Laranjeiras.

Sobre o/a autor(a)

Museólogo. Investigador no Centro de Estudos Transdisciplinares “Cultura, Espaço e Memória”, Universidade do Porto
(...)