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Mais Transparência, sff

Uma vez que o Governo tão prontamente se dispôs a fornecer informação sobre as nomeações governamentais, do que está à espera para o fazer nos processos de privatizações que se avizinham? E a nível da dívida pública, do que está à espera para avançar com uma auditoria nestes domínios?

A publicação das nomeações dos gabinetes governamentais num único local online, permitindo a sua fácil consulta, tem-se afirmado como medida bandeira da tranparência governativa que o actual Executivo diz assumir como prioridade. No entanto, o teor da medida tem vindo a ser ofuscado por notícias excessivamente centradas na nomeação A ou na quantidade de nomeações feitas pelo Ministério B. No Expresso da semana passada, Pedro Adão e Silva (PAS) falava inclusive numa transparência que parece apenas promover o voyeurismo e a desnecessária intromissão na vida privada de quem assume responsabilidades governativas. Sublinha ainda que tal transparéncia das nomeações estava a desviar a atenção da opinião pública dos domínios que mereciam esses sim grande transparência, como as privatizações, por exemplo.

 

A opinião de PAS acerta a, nossa ver, em cheio na dimensão de propaganda que não raras vezes envolve as medidas de transparência governativa. Ou seja, a coberto da transparência em alguns domínios, acaba-se por conseguir erguer verdadeiras cortinas de fumo noutras áreas da governação. Acrescentaríamos até que a forma propositadamente desorganizada como algumas destas medidas são promovidas acaba por conseguir gerar uma ilusão de transparência. Veja-se por exemplo a forma como as nomeações governamentais são expostas. A não apresentação dos currículos dos nomeados, a falta de clareza quanto à inclusão nos vencimentos de complementos como os subsídios de representação ou a ausência de listagens que permitam uma fácil comparação da informação apresentada, são apenas alguns exemplos.

 

Mas se os pontos acima são exemplos de algumas limitações nestes domínios, mais do que desvalorizar as práticas de transparência seguidas, deverão sobretudo levar-nos a ser mais exigentes com este tipo de medidas. Ou seja, uma vez que o Governo tão prontamente se dispôs a fornecer informação sobre as nomeações governamentais, do que está à espera para o fazer nos processos de privatizações que se avizinham? E a nível da dívida pública, do que está à espera para avançar com uma auditoria nestes domínios?

 

A transparência governativa é um dos baluartes das tão actuais teorias da Administração Aberta. E os seus princípios são dificilmente discutíveis: o direito democrático dos cidadãos acederem a informação que lhes permita melhor acompanhar e auditar a actividade governativa. Neste sentido, as medidas neste domínio deverão ser acompanhadas, no momento actual, com particular atenção e exigência. E tratando-se de uma dimensão que tem vindo a obter um tão grande destaque e aplauso generalizado, a esquerda não pode deixar que seja a direita política a apropriar-se da mesma. Até porque sejamos claros: dotar os cidadãos de melhores instrumentos para participar na actividade governativa enquadra-se muito melhor nos ideários e projectos da esquerda do que nas visões e concepções da direita política.

Sobre o/a autor(a)

Politólogo, autor do blogue Ativismo de Sofá
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