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Jovens: os verdadeiros lesados da pandemia

O que faz falta à nossa juventude – deprimida, irritada, ansiosa – é a devolução de anos de vida, de experiências, de convivência, de amores e desamores. E não é com receitas policopiadas de Valdispert que vamos compensar toda uma geração que foi maltratada sem piedade pelo país onde nasceu.

É de lamentar todas as pessoas que perderam a vida, os negócios, o emprego e entes queridos durante o período mais gravoso da pandemia, quando ainda não havia vacinas. É igualmente de lamentar os lucros absurdos das multinacionais farmacêuticas, dos gigantes da tecnologia e das multinacionais do retalho. Mas há uma perda imensa que nos esquecemos de referir e que afetou uma parte fulcral da nossa sociedade: os jovens adolescentes.

Criticados, chamados irresponsáveis até por membros dos poderes institucionais, obrigados a usar máscara, a tentar aprender atrás de um ecrã durante mais de dois anos, os nossos jovens são, na realidade, as maiores vítimas dos tempos pandémicos.

Não é por isso de estranhar que um estudo recente da Universidade de Lisboa revele que mais de metade dos jovens do primeiro ano daquele estabelecimento de ensino superior se sintam “tristes, deprimidos, irritados e nervosos, pelo menos uma vez por mês”.

Entre vários “problemas de saúde mental, privação de sono, preocupações, má alimentação, sedentarismo ou o uso excessivo de ecrãs”, são várias as sequelas da pandemia e de todo o mal que fez a uma geração inteira.

Uma geração que se viu privada de boa parte da sua juventude, do contato social, das aprendizagens em grupo, das paixões de adolescente, dos passeios, das viagens e de toda uma vivência social que poderá ter comprometido as suas vidas nos anos mais próximos.

Segundo o estudo, cerca de 24,5% dos inquiridos refere ter “uma preocupação intensa que não os larga e não os deixa ter calma para pensar em mais nada”.

Não será fácil para o leitor imaginar o que seria perder parte da sua juventude trancado entre quatro paredes, comunicando com o mundo exterior e tentando aprender através de um ecrã de um PC, um tablet ou um telemóvel. Mas foi o que aconteceu.

O poder político assobiou para o lado e foi atrás de mensagens populistas que exigiam a condenação de festas, ajuntamentos na rua ou até dos jovens que não usavam máscara quando perto dos mais velhos. Errou, errámos, fustigámos toda uma geração sem razão, à boleia de uma chibata emocional e de um controlo de vão de escada que parece ter vindo para ficar.

O Governo ficará para todo o sempre marcado nas memórias dos nossos jovens adolescentes e pode ser que se arrependa do fervor inquisitório que assumiu então. O tempo o dirá. Quer agora, à boleia do mesmo populismo, “tratar” da saúde mental destes jovens que sofrem, quiçá com recurso a medicamentos das mesmas farmacêuticas que encheram os bolsos com a expansão do vírus.

De Espanha, bons ventos… e boas ideias

Não é com psicologia de alcova nem com ansiolíticos que vamos devolver a esta geração tudo aquilo que perdeu. Às escolas, às Câmaras Municipais e ao Executivo exige-se muito mais: iniciativas de promoção do convívio, permutas com outros países, projetos para aproximar os jovens estudantes de uma realidade com a qual perderam contato, eventos culturais e muito mais.

Em Espanha, o Governo de Sánchez distribuiu um abono cultural de 400 euros a cada jovem para gastar em cultura. O objetivo é levar os jovens a sair de casa e a frequentar espetáculos e outros eventos presenciais.

Esta é uma medida exemplar, positiva e que pode ter um efeito muito benéfico na juventude do país vizinho. Por cá, continua a assobiar-se para o ar e a tentar levar a todo o custo a malta nova para o divã. Não percebemos nada. Ou não queremos perceber.

O que faz falta à nossa juventude – deprimida, irritada, ansiosa – é a devolução de anos de vida, de experiências, de convivência, de amores e desamores. E não é com receitas policopiadas de Valdispert (passe a publicidade) que vamos compensar toda uma geração que foi maltratada sem piedade pelo país onde nasceu.

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