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A jovem homofobia laranja

Na próxima quinta-feira, a AR pronuncia-se sobre o referendo à lei da coadoção. Contra a manobra de retrocesso inventada pela direita com a proposta de referendo, reivindicamos a vitória da lei da coadoção como um passo no sentido do progresso.

Na próxima quinta-feira, dia 16 de janeiro, a Assembleia da República terá de se pronunciar sobre o referendo à lei da coadoção proposto por um conjunto de jovens deputados do PSD que não encaixou a aprovação desta lei em maio passado por 99 contra 94 votos.

Dirá Hugo Soares, presidente da JSD e autor da ideia do referendo, que o debate não está feito na sociedade. Que ter obtido maioria num Parlamento onde a direita tem 132 dos 230 deputados não chega, que a sua aprovação terá sido fruto da lamentável ausência de uns quantos deputados da direita, e não de uma maioria de razão sobre Direitos Humanos, justiça e progresso. Dirá que está em causa um “modelo de sociedade”.

O que Hugo Soares não é capaz de esconder é que a sua proposta não passa de uma manobra de diversão cativa de uma campanha homofóbica para impedir que a lei da coadoção, já aprovada, volte a plenário para votação final. A iniciativa da JSD prova que o conservadorismo não olha a gerações: mudam-se os tempos mas os preconceitos permanecem.

É que, para além de tentar travar no Parlamento o que sabe ter de acontecer, a JSD traz outra carta na manga. Ao propor duas perguntas para serem referendadas em simultâneo, uma sobre coadoção e outra sobre adoção plena, a direita reacionária apela à unidade no preconceito, à confusão sobre a realidade do que está agora em causa, numa tentativa de que a coadoção possa vir a ser rejeitada, por arrasto, no Parlamento e fora dele.

No mesmo dia em que a projeto de lei sobre a coadoção foi aprovado, o Bloco de Esquerda apresentou uma proposta sobre adoção plena por casais homossexuais. Fizemo-lo pela consciência de que de nenhuma outra forma se cumpriria plenamente a justiça e a igualdade.

O nosso projeto foi rejeitado. Mas isso não nos impediu, quando votámos a favor da proposta da coadoção, de suspender a respiração na contagem e de vibrar com a maioria. Não é tudo para quem, como nós, defende os direitos por inteiro; mas é muito para tantas famílias que vivem todos os dias com a incerteza e o medo de que à mãe ou ao pai sem vínculo jurídico com a criança não seja reconhecido qualquer direito ou dever de parentalidade. Sobretudo, é muito para afirmar que a orientação sexual dos pais e das mães não pode prejudicar a vida das crianças.

Claro que não ficamos satisfeitos. Sabemos que a lei da coadoção mantém um principio de discriminação. Continuaremos a lutar e não baixaremos os braços até que a lei da adoção seja aprovada. Foi sempre assim no caminho percorrido desde a alteração ao artigo 13º da Constituição até à lei que legalizou o casamento de pessoas do mesmo sexo. Quisemos sempre mais, queremos sempre ir mais longe.

E é por isso que recusamos voltar atrás. Contra a manobra de retrocesso inventada pela direita com a proposta de referendo, reivindicamos a vitória da lei da coadoção como um passo no sentido do progresso. É pequeno e vem tarde, mas não o deixaremos escapar entre os dedos.

No “modelo de sociedade” que Hugo Soares defende, o obscurantismo e o preconceito sobrepõem-se aos interesses das crianças e aos direitos de igualdade entre seres humanos. É apanágio de uma direita reacionária que nos empobrece em todos os sentidos, e é próprio de quem já se habitou a negar-nos o futuro.

Hugo Soares foi recentemente protagonista de um vídeo da campanha “Tudo Vai Melhorar”, promovida pela associação LGBT do Porto CASA. "Vale a pena acreditar que tudo vai ser diferente. Vale a pena ter esperança” afirma o líder da JSD no vídeo. Sim, tudo vai ser diferente, tudo vai melhorar. Mesmo contra ele.

Sobre o/a autor(a)

Deputada e dirigente do Bloco de Esquerda, licenciada em relações internacionais.
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