Ideologia & política científica

porJoão Teixeira Lopes

04 de fevereiro 2014 - 19:14
PARTILHAR

O Presidente da FCT admitiu na AR que as classificações do último concurso para atribuição de bolsas tinham efetivamente sido alteradas sem conhecimento dos painéis de avaliação. A justificação é de índole burocrática...

Em primeiro lugar, um registo interessante: sob pressão, o Presidente da FCT admitiu no Parlamento que as classificações do último concurso para atribuição de bolsas de Doutoramento e Pós-doutoramento tinham efetivamente sido alteradas sem conhecimento dos painéis de avaliação. A justificação é de índole burocrática: para não atrasar a divulgação dos resultados, cometem-se ilegalidades. Os resultados saem a tempo, mas feridos de morte.

Em segundo lugar, Pires de Lima anuncia que o seu Ministério vai assumir as quotas da Agência Espacial Europeia, libertando verbas para o Ministério de Crato atribuir mais bolsas. Mas, atenção, há condições: as bolsas terão obrigatoriamente de se destinar a pesquisas em contexto empresarial. Já não bastava o facto de Portugal apresentar das mais baixas taxas europeias de investimento privado em I&D, agora passará o Estado a financiar o que seria obrigação das empresas. Qual risco, qual inovação, qual empreendedorismo. O grosso das empresas não vislumbra utilidade na I&D a não ser que…o Estado pague. Eis o velho espírito rentista que aprisiona os dinheiros públicos e os canaliza, em nome de todos, para o interesse particular de poucos.

A ideologia deste Governo é despudoradamente concretizada. Não se olha a meios para atingir os selváticos fins. De uma assentada, cai até o discurso de valorização do mérito e do talento, a par do mais elementar respeito pela legalidade. Quanto há pressa e a sede é muita, nem a honra conta.

João Teixeira Lopes
Sobre o/a autor(a)

João Teixeira Lopes

Sociólogo, professor universitário. Doutorado em Sociologia da Cultura e da Educação, coordena, desde maio de 2020, o Instituto de Sociologia da Universidade do Porto.
Termos relacionados: