Dentro de menos de quatro horas, saberemos os primeiros resultados das eleições gregas. Em qualquer dos casos, a esquerda será, com o Syriza, a grande vencedora.
Se o Syriza for o primeiro partido, começará uma viragem decisiva para a Europa. A morte do memorando e o fim do protectorado da troika seria a melhor notícia para a Grécia e para a Europa. É verdade que será sempre difícil formar o governo de esquerda que possa conduzir as novas negociações e recuperar a decisão democrática para os gregos, mas a viragem terá começado. E se esse governo se puder formar – contra toda a coligação do centro e da direita e contra Merkle, Draghi, Barroso e todos os líderes europeus -, merece toda a nossa solidariedade em todas as suas decisões para recuperar os salários, defender o trabalho e salvar a economia da bancarrota. Não lhes faltaremos.
Mas, mesmo que a direita da Nova Democracia seja o primeiro partido e forme governo com o PASOK (o PS grego) e com outras forças de centro e direita, também a vitória da esquerda será notável. Porque o Syriza se terá transformado de um partido de 4,5% numa força de mais de 25%, sendo a única força que fala pelo país contra a tutela de Merkel e contra a barbárie financeira. Será por isso uma esquerda popular com uma força jamais alcançada e que será determinante em cada dia que passe. Se não for governo agora, continuará a ser amanhã a única alternativa de governo para a Grécia.
Por isso, recomendo a todas as leitoras e leitores que mantenham a perspectiva ao lerem os resultados: a esquerda ganhará se formar governo e ganhará mesmo que todas as direitas se juntem contra ela, porque é na esquerda que está a força que cresce, que dá confiança, que responde pela Grécia e pela Europa, que será hoje ou amanhã governo para responder à bancarrota. O Syriza merece a nossa solidariedade porque soube fazer o combate mais difícil. Festejaremos a sua vitória nos dois casos porque sabemos da dificuldade da luta e do significado destes resultados imensos e prometedores.
Há ainda que assinalar quatro grandes derrotas nestas eleições.
Em primeiro lugar, a derrota das políticas de Merkel e da liderança europeia. O povo já não pode mais. “Isto não é vida”, como dizia um reformado grego na RTP. E respondeu. A democracia assusta, não assusta, sra. Merkel? As medrosas mudanças que estão em curso na Europa nunca ocorreriam sem esta voz da democracia. E, claro está, a liderança europeia quer transformá-las numa viragem autoritária, acentuando o federalismo que dê todos os poderes a um governo europeu, a uma “união bancária”, a uma “regra de ouro” para controlo dos orçamentos. Sem destruir esta ameaça autoritária, a Europa não poderá sobreviver.
Em segundo lugar, perde o PS grego, que quase desaparece do mapa eleitoral. Apoiou a troika, promoveu a destruição da economia, comprometeu-se com a submissão ao governo alemão, e paga um preço eleitoral por isso. Ainda bem que é assim. O centro é cada vez mais radical na defesa da austeridade e a esquerda precisa de vencer o centro.
Em terceiro lugar, o sectarismo está condenado à morte. O KKE, partido comunista grego, recusa participar num governo de esquerda contra a troika e fez do Syriza o seu principal alvo eleitoral. É difícil compreender como degenerou um dos principais partidos gregos, com uma história heróica na luta contra o nazismo e a ditadura, mas o KKE é hoje uma força com um comportamento reaccionário que é alimentado pelo sectarismo. A violenta crítica que o PC Cubano se sentiu obrigado a fazer-lhe por recusar um governo de esquerda de nada serviu.
Em quarto lugar, perdem os que quiseram que a esquerda se suicidasse com a proposta da saída do euro. O Syriza recusou essa linha, e fez muito bem. Os gregos percebem que os economistas fantasiosos que acham que uma desvalorização do salário e das pensões é um bom modelo para a recuperação da rentabilidade do capital conduziriam a um aumento do desemprego e das dificuldades da vida. Há uma diferença de um mundo entre estes planos de acumulação de capital e a necessidade de medidas excepcionais que possa decorrer do confronto com a sra. Merkel. Mas do que a esquerda grega não pode desistir é de uma prioridade: defender salário e emprego. É por isso que o programa do Syriza serve para hoje, para governar, ou serve para amanhã, para mobilizar o povo para vencer a troika.
Parabéns, Syriza.
Publicado às 14h de domingo 17 no Facebook