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Entradas de Macron e saídas de sendeiro

A 31 de julho, Costa e Macron aproveitaram uma rotineira cimeira sobre ligações energéticas, em Lisboa, para receberem na Gulbenkian um “Encontro com cidadãos”. Esta reunião é a ressurreição de uma ideia que Macron incluiu com alguma ingenuidade mas muito europeísmo no seu programa eleitoral.

Na sexta-feira passada [31 de julho], Costa e Macron aproveitaram uma rotineira cimeira sobre ligações energéticas, em Lisboa, para receberem na Gulbenkian um “Encontro com cidadãos”. Durante hora e meia, os dois governantes responderam a perguntas sobre a Europa, como já antes tinha sido feito por Costa e Merkel, na sua recente visita ao Porto. Tudo cordial, não se regista nenhuma vaga de fundo, conversamos e vamos à nossa vida.

Pode no entanto quem lê este jornal ser apanhado de surpresa, pois esta reunião representa mais do que o seu modesto título indica. É um “encontro”, pela certa, com “cidadãos”, também é evidente. Mas é mais do que isso, é a ressurreição de uma ideia que Macron incluiu com alguma ingenuidade mas muito europeísmo no seu programa eleitoral. Pois ele prometia, o que só um candidato francês se lembraria, que de maio a outubro de 2018 se realizariam “Convenções Democráticas” em todos os países para preparar as eleições europeias, ouvir o povo e, a palavra é dele, iniciar a “reconstrução” da União. O menu era entusiasmante, consultas abertas na internet, debates locais, convenções nacionais, tudo em linha.

Se já tropeçou na vontade napoleónica de definir em eleições francesas o que devem fazer os restantes países europeus, não se preocupe, é mesmo assim. La France c’est la France. O problema é que o patusco da iniciativa não comoveu as chancelarias, que têm mais com que se entreter e trataram o assunto como uma bizarria do homem que se faz apodar de Júpiter. Entretanto, para satisfazerem o presidente francês deram-lhe esta terminação, de convenções nacionais passou-se a encontros com cidadãos, menos refundadores, mas a pose é tudo. Curiosamente, não consta que os euroentusiastas de sempre se tenham manifestado com particular fulgor na Gulbenkian. Temo que estejam à coca das prometidas convenções para dizerem das suas e que vamos ter que esperar.

Artigo publicado no “Expresso” de 31 de julho de 2018

Sobre o/a autor(a)

Professor universitário. Ativista do Bloco de Esquerda.
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