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Cultura? Isso ainda existe?

A Comissão Europeia propôs um aumento de 37% dos programas para a Cultura do próximo quadro comunitário. Portugal devia estar a preparar-se para o aproveitamento eficaz desses fundos. Mas se no atual quadro já ninguém se lembra da Cultura...

O Governo criou um mini Conselho de Ministros presidido pelo Ministro das Finanças para tratar do QREN. Nasceu como truque de mágica, no meio de cortinas de fumo e entre aplausos e apupos de Gasparistas e Alvaristas. Um número de circo para tentar esconder oito meses de governação sem uma única ideia para o QREN, mais de 6 mil milhões de euros que podiam ter sido usados e não foram, uma economia que se afunda enquanto o Governo brinca ao desenho dos organigramas com nomes sonantes como interministerial e estratégico. Uma farsa.

No meio da farsa, esqueceram-se da Cultura. Não foi por mal, com certeza. É de tal modo insignificante que ninguém se lembraria. 0,1% do orçamento do Estado, sem Ministério nem Secretaria de Estado. Só um secretário, vagamente representado por um outro no Conselho de Ministros, que lá vai dando pareceres negativos sobre uma barragem que ninguém lê e que não merece sequer uma cortina de fumo quando o anuncia em público. Enfim, um setor que tem um orçamento a descer 75% em 10 anos não é propriamente um setor de governação. Nem chega a flor na lapela.

E então lá surge a comissão estratégica interministerial onde estão todos os setores que podem recorrer a financiamento via QREN menos a Cultura. O que já não admira ninguém, mas não deixa de ser grave. Hoje o financiamento do QREN, mesmo que pouco tarde e a más horas, é parte essencial das políticas públicas para a cultura em áreas tão diversas quanto a preservação e promoção do património, o financiamento ao cinema e às artes performativas ou o funcionamento das redes de equipamentos culturais (museus, bibliotecas e teatros) espalhados pelo país. Mas o que é que isso interessa?

Entretanto a Comissão Europeia propôs um aumento de 37% dos programas para a Cultura do próximo quadro comunitário. E, pareceria lógico, Portugal devia estar a preparar-se para o aproveitamento eficaz desses fundos1. Mas se no atual quadro já ninguém se lembra da Cultura, alguém acredita que este Governo sequer pensou no que aí vem?


1 O Bloco de Esquerda apresentou um Projeto de Resolução que Recomenda a adoção de medidas que permitam um efetivo aproveitamento dos fundos comunitários dedicados ao setor cultural que será votado esta semana na Assembleia da República.

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda. Atriz.
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