A OCDE apontou como objetivo para 2020 Portugal ter 40% de diplomados, entre os 30 e os 34 anos. Esse horizonte, apontado há sensivelmente uma década, era possível ser alcançado. Com as medidas de austeridade e o empobrecimento do país, o acesso ao ensino superior diminuiu. Tivemos menos estudantes a ingressar e mais estudantes a desistir no primeiro ano da licenciatura. Tornou-se, assim, praticamente impossível essa meta. Estamos a remar contra a maré porque dificilmente recuperaremos todos os alunos que desistiram de prosseguir estudos, mesmo com o esforço na implementação de políticas criadoras de modelos alternativos ao regime geral de acesso. Se, a somar a esse esforço, esticarmos as vagas nos regimes especiais - bolseiros dos PALOP, naturais de Timor-Leste, estatutos profissionais, como são os diplomatas em missão no estrangeiro ou os praticantes desportivos de alto rendimento – aproximar-nos-emos mais dos objetivos, mas sem garantias de sucesso.
Por isso é que a proposta lançada pelo atual Governo que restringia o número de vagas nas universidades de Lisboa e Porto para as transferir para os politécnicos do interior do país é descabida.
O debate sobre a democratização do acesso ao ensino superior deve apontar como objetivo abrir mais portas e não o contrário. Se criarmos mais restrições no acesso, será uma medida penalizadora e ficaremos ainda mais longe de concretizar uma real democratização do acesso ao ensino superior.
Como é que se pode fixar estudantes nas regiões com baixa densidade populacional? Antes de responder a esta pergunta, traço alguns considerandos sobre a desertificação destes territórios. O problema, ao contrário do que muitas das vezes é sugerido, não está numa ‘fuga’ destes jovens para as universidades dos grandes centros urbanos porque procuram (só) uma melhor qualidade de ensino. O fecho de serviços públicos fundamentais nestas localidades, como postos dos correios, centros de saúde e tribunais, atiraram para o esquecimento uma geração inteira, já por si penalizada na falta de emprego qualificado devido a um modelo económico que concentra cada vez mais o investimento nas capitais e não nas periferias.
Dito isto, garantir que os estudantes acabam por se fixar nas instituições das regiões do interior não passa por diminuir o numerus clausus no litoral, mas sim valorizar as instituições do Ensino Superior Politécnico do interior, seja do ponto de vista da sua oferta pedagógica - com emprego de qualidade para os seus profissionais e financiamento condigno, e de medidas de ação social, até para garantir que conseguem ocupar as vagas todas que têm. Essa valorização passa por garantir residências e cantinas de qualidade, eliminar o entrave das propinas, alargar o número de bolsas de ação social, alterando os seus critérios de elegibilidade e os valores máximo e mínimo. Ao invés de criar universidades de primeira e politécnicos de segunda, para onde são escoados os que não conseguem entrar na primeira opção da candidatura, é preciso democratizar o acesso ao ensino superior como um todo, seja no interior ou no litoral, nas universidades ou nos politécnicos.
Para alargar a base social do ensino superior, incluir nesse objetivo uma maior aposta nas vias de ingresso alternativas não é descabido. O programa ‘maiores de 23’, que permite o ingresso de cidadãos com mais de 23 anos que não possuem habilitações de grau superior, é um dos mecanismos que merece ser alargado no número de vagas que admite.
Em suma: não temos estudantes a mais, continuamos a ter estudantes a menos. A solução não pode passar por restringir o acesso nas Universidades das duas grandes cidades e esperar que esses estudantes e essas famílias escolham, quase como obrigação inconsciente, o interior do país. Sem medidas que apoiem o Ensino Superior em todo o território, só estaremos a assistir a uma espécie de parceria público-privada no Ensino Superior, entregando massa crítica que estudaria no Ensino Público ao Ensino Privado.