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CGD – A responsabilidade dos trabalhadores…

Na visão liberal da UE, importa reduzir a CGD a um pequeno banco de implantação local, que não tenha capacidade de apoiar o Estado.

Os lucros consolidados da CGD desde o ano 2000 até ao ano de 2008, inclusive, ascendem a um valor total de 5.533,1 Milhões de euros…

Isto, se somarmos os valores de lucro obtido em 2009 e 2010 (278,9 e 150 milhões de euros, respetivamente), verificamos que as notícias atuais que versam sobre a CGD (Grupo CGD) e as consequentes opiniões a favor desta administração e das suas medidas, não passam de assomos ideológicos, fora de um contexto mais vasto que, forçosamente, tem que ser tido em consideração.

Nessa altura, os lucros não eram responsabilidade dos trabalhadores, nem se os “privilégios” (leiam-se direitos consagrados e negociados!!!) eram motivo de falta de competitividade.

E a questão da ideologia surge reforçada ao fazer uma leitura atenta dos média nacionais, em verificamos que o prejuízo acumulado da CGD entre 2011 e 2017 ascendeu a perto de 3.900 milhões de euros, não atingindo este valor.

Ou seja, com mais empregados, com o mesmo Acordo de Empresa (ou melhor com a versão anterior deste que agora se denunciou) e com o aumentos de salários até 2009, a CGD tem, entre o ano de 2000 e o ano de 2016, um resultado positivo de mais de 2.000 milhões de euros (para quem não leu bem, coloco por extenso: dois mil milhões de euros!!!)

Curiosamente, as perdas apuradas em 2017, que se deveram ao facto de se considerar como incobrável a totalidade dos créditos em atraso, ascenderam a perto de 2.000 milhões de euros… E são estes incobráveis assumidos em 2017 que permitem que este ano apresentemos lucros.

Mesmo assim, tudo domado, temos uns “pozinhos” de lucro, entre o quase e o mais.

O que os números demonstram é que com mais trabalhadores, com este acordo de empresa e com alguns anos de aumentos de salários, a CGD deu um pequeno lucro, no período considerado entre 2000 e 2018, ou seja nos últimos 18 anos de atividade, e depois de atravessarmos a maior crise desde a grande depressão de 1929. Não será isto relevante?

Então sobra a questão: - A que se deveu todo este problema em torno da CGD?

Basta ler alguns livros para se entender… leiam a “Caixa Negra”, do Diogo Cavaleiro, por exemplo, e poderão ficar com uma ideia.

Mas subitamente nada disso importa.

A ideologia reforça e propagandeia aos quatro ventos dos média nacional: - A culpa é dos trabalhadores…!

A culpa da situação atual da CGD não é do BPN, que a CGD teve que “salvar” de forma encapotada e indireta (ver aqui e aqui)

A culpa da situação atual da CGD não é dos negócios ruinosos que entretanto as diversas administrações fizeram, com poucas ou nenhumas garantias na concessão dos empréstimos, ou em créditos que a análise de risco interna da CGD (os tais trabalhadores) deu o seu parecer negativo, como o Artland- La Seda, o Vale de Lobo, a Acuinova - Pescanova, a Reyal Urbis, a Finpro, sociedades do Grupo Espírito Santo, a Soares da Costa, entre outros que ainda não são públicos.

As tabelas salariais da banca 2009, disponíveis num estudo para tese de mestrado publicado aqui, mostram que a CGD tinha, já então, tabelas bastante aproximadas às que têm hoje em dia.

Nessa altura não eram um fator de perda de competitividade, assim como não o são atualmente.

O que temos é parte do modelo de António Borges a ser implementado, não com a privatização do banco em si mesmo, mas com a privatização do seu negócio, e tudo sem se subirem os salários, e coma implementação de cortes nos direitos dos trabalhadores. (o que Borges dizia que se devia fazer, após estabilizar a banca, era subir salários!)

A privatização do negócio que está em curso, com o alto patrocínio do BCE e da Comissão Europeia, não é mais que a passagem de 5 a 10% da quota de mercado da CGD, para os outros grandes bancos privados, com especial enfoque no Santander-Totta, que passou a uma quota de mercado de cerca de 17%, quando em 2015 tinha uma quota de mercado de cerca de 12%.

É sabido que o BCE e a Comissão Europeia acham que temos bancos a mais na Europa (vá-se lá saber o que aconteceu à defesa do modelo concorrencial?!?) e consequentemente começaram a implementar um processo de concentração na banca, sendo que ao nível Ibérico não pretendem a existência de mais do que 2, ou 3 bancos de média dimensão.

Isto significa que aqueles “escolhidos” têm de ganhar mercado aos que já existem, e logo aí temos metade da ideia conseguida.

Na visão liberal da UE, em Portugal importa, também, retirar ao Estado capacidade de resposta ou de intervenção no setor financeiro. Logo, importa reduzir a CGD a um pequeno banco de implantação local, que não tenha capacidade de apoiar o Estado, ou o governo que na altura esteja no poder, nas decisões financeiras e económicas.

Mais um instrumento nacional a ser retirado ou reduzido, que enfraquece a capacidade de resposta de cada país, tornando-o ainda mais dependente da Europa e dos eurocratas.

Mas a culpa é dos trabalhadores…!

Sobre o/a autor(a)

Trabalhador do grupo CGD, delegado sindical e membro do Conselho Nacional do STEC (Sindicato de trabalhadores das empresas do grupo Caixa Geral de Depósitos). Membro da Assembleia Municipal de Cascais.
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