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A atual crise do sector automóvel e o emprego

A crise do sector automóvel é hoje essencialmente europeia. Aos trabalhadores não basta lamentarem-se, é necessário apresentar alternativas.

A crise do sector automóvel é hoje essencialmente europeia. Por isso, diferente da que presenciámos no final da década passada (2008/2009), na Europa Central, e essencialmente na Europa Ocidental, assistimos à redução de vendas em mercados significativos como Espanha, Inglaterra, França e Itália a que não escapa Portugal.

Em todos estes países, a situação é idêntica, há desemprego, redução do poder de compra e dificuldades no acesso ao crédito.

A crise, sendo europeia é sem sombra de dúvida resultado da chamada crise do Euro, que se traduz pela imposição de fortes limites ao défice nos países que fazem parte deste “clube”, pelo desinvestimento, pela opção bancária de especulação bolsista em detrimento de políticas de crescimento e de emprego.

Em Portugal, temos ainda dos maiores impostos sobre os automóveis (IA) a que se junta o preço dos combustíveis, os baixos salários, o desemprego real, (hoje na casa dos 20%), a precariedade e o desemprego jovem são dos mais elevados da Europa.

No campo laboral, temos uma longa prática de políticas de revisão parcial de contratação coletiva, (salários no essencial), a que se junta hoje uma ofensiva governamental e patronal contra a contratação existente visando à sua total supressão, o apelo ao contrato individual de trabalho é uma realidade aproveitada e estimulada pelo Governo e apoiada numa reduzida taxa de sindicalização. Políticas que contribuem para a dependência da legislação laboral no essencial de Códigos do Trabalho contra o que é prática na Europa.

A política laboral no país vem-se agravando desde 2003 com o célebre Código de Trabalho “Bagão Félix”, a que se juntou o Código “Vieira da Silva” e agora o Codigozinho, (mas não menos perigoso) “Santos Pereira”.

De Código em Código, e contrariamente aos proclamados objetivos dos mesmos, o desemprego continua a aumentar e os salários a reduzir, seja por via da inflação seja por políticas de lay-off.

O Codigozinho de “Santos Pereira” vem agravar tudo isto ao aumentar em 56 horas anuais (3 dias de férias mais 4 feriados) o já maior horário de trabalho anual da Europa a 16, uma decisão que colocada em prática, levará ao aumento do desemprego no sector da construção automóvel, com incidência sobre os trabalhadores das empresas fornecedoras, onde, como sabemos, a relação de emprego ou desemprego é na ordem de 1 para 5.

O aumento do horário de trabalho é já por si contranatura numa altura em que se produz riqueza a uma velocidade e enormidade como nunca se viu em séculos de história da humanidade, e muito mais contranatura se revela, numa altura de crise da economia, crise que afeta os países para os quais exportamos.

Compete-nos a todos combater estas medidas, não (apenas) com os argumentos de perda de direitos, mas essencialmente com o argumento de que tais medidas só trazem crise à crise que o sector atravessa.

Mas aos trabalhadores não basta lamentarem-se, é necessário apresentar alternativas, e estas passam por exigir:

Um novo programa Europeu de incentivo ao abate que vise a retirada do mercado de carros altamente poluentes e de elevado consumo, e a sua substituição por carros menos poluentes e consumos mais económicos, com uma política de financiamento a baixo custo.

Redução dos custos logísticos e energéticos, e uma maior integração de componentes nacionais na construção de automóveis produzidos em Portugal. Apoio à participação dos fornecedores de componentes instalados em Portugal em Feiras da Industriais-Internacionais e junto das sedes das marcas na Europa ou no mundo.

Exigir a redução para níveis europeus do IA e a sua desmultiplicação pelos primeiros 10 anos de vida do carro, independentemente do seu proprietário, (anexado ao Imposto Único de Circulação).

Denunciar como enganadoras da opinião pública as afirmações governamentais que comparam direitos dos trabalhadores entre os países da Europa e Portugal, porque estas são feitas tendo por base legislação de cada país e tem um objetivo claro que é o de voltar gerações contra gerações, omitindo a verdade, ao não revelar que os direitos que os trabalhadores têm nesses países são com base na Contratação Coletiva, onde, por exemplo, o horário de trabalho é em média de 37 horas contra as 45 da legislação.

Por isso entendo ser necessário para Portugal no sector automóvel e não só:

a) Sindicatos que não se orgulhem de não ter Contratação Coletiva com o argumento de não perder direitos, direitos que na esmagadora maioria das pequenas e médias empresas já não são aplicados e que servem essencialmente ao patronato revanchista para aumentar os despedimentos coletivos e a precariedade.

b) Contratação Coletiva que contribua para o aumento da produtividade através de medidas de formação que garantam emprego de qualidade principalmente para os jovens, que enfrentem oscilações da produção com garantia de emprego e salários justos.

Como ultrapassar estas práticas patronais e sindicais a favor dos trabalhadores, dos desempregados e essencialmente dos jovens?

Há, certamente, muitas respostas, as oficiais, as oficiosas e as ideológicas, mas as que os trabalhadores, os desempregados e os jovens exigem é as que tragam crescimento, emprego estável e salários que permitam uma vida digna.

Encontrá-las, é obrigação moral de todos os que fazem parte do tecido sociolaboral.

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda. Coordenador da CT da Volkswagen AutoEuropa. Deputado municipal no concelho da Moita.
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