O brutal aumento do IRS ocorreu apesar do desastroso desempenho económico do país, afogado em austeridade. Deveu-se, sobretudo, a duas medidas impostas pelo Governo PSD/CDS: uma sobretaxa de 3,5% sobre todo o rendimento anual acima de 6790 euros, e a alteração de oito para cinco escalões.
Embora a sobretaxa fosse mais diretamente sentida pelos trabalhadores, o grosso da receita, mais de dois terços, proveio da alteração dos escalões.
O efeito mais direto destas medidas foi a redução do rendimento das famílias. Mas não fica por aí. Este aumento do IRS contribuiu não só para agravar o desequilíbrio já existente entre o contributo do capital e do trabalho para o financiamento do Estado, mas também para aprofundar as desigualdades entre trabalhadores.
Ao cobrar uma sobretaxa igual, independentemente do rendimento, e ao reduzir os escalões, o Governo de Passos e Portas impôs um aumento de impostos proporcionalmente maior aos trabalhadores mais pobres. Segundo os cálculos da PwC, um casal com dois filhos com um rendimento de 28 mil euros passaria a pagar mais 101% e igual família com 280 mil euros pagaria mais 22,9%.
Com a nova maioria parlamentar, a sobretaxa foi eliminada, entre outras coisas. Como resultado, a receita de IRS caiu 500 milhões em 2016, prevendo-se nova redução em 2017. São medidas importantes, mas ainda insuficientes.
As alterações ao IRS estão inscritas nos vários acordos que sustentam a atual governação. A sua prioridade é incontestável. Essas alterações devem respeitar dois princípios: aumentar a progressividade e aliviar fiscalmente, não apenas os trabalhadores mais pobres, mas também a classe média-baixa. É ela que, em bom rigor, suporta uma boa parte da receita de IRS.
Os 200 milhões que o Governo tem avançado não permitem cumprir estes objetivos. Só o desdobramento do segundo e terceiro escalões em outros dois adicionais custaria cerca de 440 milhões, corrigido o efeito nos escalões mais elevados.
Para ser efetiva, qualquer alteração ao IRS exigirá sempre um esforço financeiro considerável, mas que tem de ser assumido para cumprir o propósito, assumido pelos partidos da maioria parlamentar, de reverter o brutal aumento de impostos de Vítor Gaspar. Se for necessário compensar financeiramente esta escolha, há alternativas. Nomeadamente o aumento da derrama de IRC sobre as empresas com mais lucro. Esta medida não só já estava prevista aquando da última descida do IRC como permitiria corrigir os ganhos excessivos que estas empresas tiveram com o regime de reavaliação de ativos e o programa de redução do endividamento ao Estado.
Artigo publicado no “Jornal de Notícias” em 12 setembro de 2017