Activismos e Redes

porJoão Teixeira Lopes

28 de dezembro 2011 - 12:28
PARTILHAR

As potencialidades dos novíssimos movimentos sociais são inúmeras, mas permanecem em estado de crisálida.

Temos muito a aprender com os novíssimos movimentos sociais sobre a agilidade e a fluidez comunicativa das redes. Na verdade, elas permitem a instantaneidade, a interactividade e mesmo a sincronização, à escala planetária, de um calendário de iniciativas e lutas. Mas parece-me crucial, ao mesmo tempo, não resvalarmos para um exagerado optimismo quanto a uma espécie de admirável mundo novo.

Atentemos nos já referidos “novíssimos movimentos sociais” (por oposição aos “velhos”, com génese no século XIX e o auge nos primeiros sessenta anos do século XX e aos “novos”, oriundos no Maio de 68 e na onda de revoltas de então, com proliferação de temas e activismos – feminismo, ambientalismo, etc.). Nestes, temos já a possibilidade de distinguir entre duas fases: uma primeira, nos anos 90, centrada na alterglobalização e na consigna de “um outro mundo é possível” e os emergentes, a partir dos indignados e acampadas. Num e noutro caso destes “novíssimos” é visível o uso das novas tecnologias da informação e da comunicação. Mas os emergentes estão indissociavelmente ligados à Web 2.0 e aos avanços na microelectrónica – avanços que fazem de nós autênticos ciborgues – seres humanos com prolongamentos ou próteses tecnológicas, como parece evidente, por exemplo, nos usos das novas gerações de telemóveis.

Mais importante ainda, muda o enfoque. Se a rede é simultaneamente metáfora e realidade (os novíssimos constituem-se como rede, através de uma rede – a net – enquanto ferramenta e unindo indivíduos que são eles próprios, em termos identitários, uma rede de papéis sociais), os movimentos alterglobalização possuíam uma visão de síntese e de totalidade que entretanto se desvaneceu. Os emergentes não construíram até ao momento uma visão alternativa estruturada, movendo-se no zapping de um caos de contradições, com apropriações populistas, carismáticas e vagamente anti-sistémicas.

Nenhuma concepção de determinismo tecnológico parece ter validação nos factos. Existem inúmeras mediações entre as tecnologias e os indivíduos: graus desiguais de cognição e percepção, de literacia, de recursos (económicos, políticos, culturais, simbólicos) e pesadas hierarquias. Os estudiosos do capital social mostram, aliás, como as redes assentes na Web 2.0 são profundamente hierarquizadas, ao contrário do que propaga a vulgata.

Se superarmos visões ingénuas, seremos capazes de não idolatrar o que merece passar pelo crivo da crítica. As potencialidades dos novíssimos movimentos sociais são inúmeras, mas permanecem em estado de crisálida. Não poderia ser de outra forma, num tempo em que o modo é avesso a formas de consciência colectiva.

João Teixeira Lopes
Sobre o/a autor(a)

João Teixeira Lopes

Sociólogo, professor universitário. Doutorado em Sociologia da Cultura e da Educação, coordena, desde maio de 2020, o Instituto de Sociologia da Universidade do Porto.
Termos relacionados: