Decorreu neste fim-de-semana no Coliseu dos Recreios o Congresso do PSD. O partido tentou demonstrar a mais de 900 mil pessoas desempregadas, a 2 milhões de pobres e a milhares de pensionistas e de jovens que emigraram do país que esta nobre e honrada terra corre em ventos brandos para o admirável mundo do progresso, do sucesso e da prosperidade económica. Para isso devem ter contratado nos últimos tempos algumas centenas de assessores de comunicação. Não é fácil explicar a alguém que tem menos salário ou pensão, que não tem emprego, que emigrou ou que vive na pobreza, que o país melhora consoante mais degradada esteja a vida de quem nele vive. Mas isso vai ser a política dos grandes. O que queria mesmo falar é da política dos pequenos. Dos pequeninos. Da jovem ninhada social-democrata.
Na boa tradição paternalista e conservadora de dividir a política em termos etários, o PSD criou um quintal para a sua juventude. A JSD lá vai brincando aos políticos no seu parque infantil onde os baloiços são substituídos por odes a entrudos tão incomodativos como tem sido um tal de Hugo Soares, que aparentemente, estranhe-se, é o líder da JSD. Mas o problema é que estes entrudos ganham mesmo vida e de repente, enquanto esfregamos um olho, já são secretários de estado voando da universidade para o aparelho de estado num golpe de magia que faz impressionar os mais céticos.
A JSD apresentou uma moção estratégicaao Congresso do PSD. Vale a pena lê-la. É que mesmo que nós achemos que os dirigentes da JSD são meia dúzia de papalvos a brincar à política - e são -, algumas das estranhas criaturas acabam mesmo por se tornar ministros, primeiros-ministros ou secretários de estado. O que levou a Congresso esta nova ninhada de jotinhas?
Um país dominado pelo bloco central. Propõe uma reforma do sistema político para que o bloco central consiga dominar ainda mais o país. A ideia é reduzirem o número de deputados para concentrarem a quase totalidade do parlamento no bloco central, ao mesmo tempo que definem círculos uninominais para esvaziar a capacidade dos partidos mais pequenos elegerem. Para ajudar à festa do bloco central propõe ainda um aumento do mandato presidencial para 7 anos.
Ajustar contas com Abril. A JSD não tem gostado que o Tribunal Constitucional proteja quem trabalha. Por isso, estes jovens propõem-se a liderar uma grande revisão constitucional. Dizem que os valores de Abril estão ultrapassados. Na verdade, eles têm vergonha dos valores de Abril e concretizam: é preciso acabar com a gratuitidade tendencial dos serviços públicos de educação e de saúde para criar serviços públicos apenas para os pobres. E vão mais longe: é preciso que a segurança social tenha noção de que o Estado não tem dinheiro e que alguns dos seus princípios de solidariedade devem ser abandonados.
Criminalizar… o PSD. A JSD diz que há um desfasamento entre os cidadãos e os “políticos” e por isso acha que se deve criminalizar a má gestão pública. Desse ponto de vista, por princípio, nada contra. Isso podia ter duas vantagens. A primeira era a JSD começar a candidatar-se à Procuradoria-Geral da República deixando o Parlamento em paz. A segunda é a de que talvez pudéssemos, com a ajuda da JSD, começar por responsabilizar criminalmente o conjunto de dirigentes do PSD que andou metido na vergonha BPN e aqueles que têm vivido à sombra do Estado há décadas. Por onde querem começar?
Austeridade perpétua. A JSD encontrou a solução mágica para a economia. Consiste em meter na Constituição uma chamada “Regra de Ouro” para limitar o défice. Isto é, passa a ser expressamente proibido e inconstitucional numa altura de crise o Estado poder ser chamado a gastar mais em investimento público para criar emprego e a dar mais proteção social para evitar a pobreza e recessão (como aliás se resolveu a crise de 1929). Trocado por miúdos, a forma de garantir a “sustentabilidade” do Estado é estarmos enterrados até ao pescoço em políticas de austeridade até que alguém decida deitar a “Regra de Ouro” para onde ela tem de estar: no lixo onde estão as piores ideias da história económica, social e política.
A JSD é o elefante na sala do congresso. Só que é elefante que fala. É um elefante pronto para, assim que o dono der ordem, se levantar e exprimir com total veemência meia dúzia de frases feitas para testar as hostes.
A eloquência digna destes competentes empreendedores do aparelho estado soou no Congresso do PSD como a voz de Hugo Soares soa no Parlamento: acalma as consciências dos conservadores, testa publicamente a repugnância de um projeto ideológico totalizante e envergonha a modernidade que se construiu neste país.
É preciso muito cuidado com eles. Eles andam mesmo aí.