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Na falta de argumentos, atacam a Constituição

Os mesmos que se queixam da programaticidade da nossa Constituição, sobretudo quando referida aos direitos sociais lá consagrados, não são os mesmos a defender a imposição, no texto constitucional, de limites do déficee dívida pública?

 

No Prós e Contras da passada segunda-feira - RTP, os detratores da reestruturação da dívida quando ficaram sem argumentos puxaram dos galões e desataram a atacar o alvo preferencial da direita portuguesa: a Constituição.

Questionados sobre o que mudariam na Constituição, engasgaram-se, soluçaram e disseram umas banalidades sobre o preâmbulo e a "inexplicável” presença, segundo os próprios, do princípio da proibição de despedimentos sem justa causa.

Mas o argumento mais divertido de todos eles, prendia-se com a programaticidade da Constituição, que, segundo eles, não é conforme as regras de um regime democrático.

É verdade que a Constituição Portuguesa tem um carácter marcadamente programático e dirigente, isto é, "enuncia programas (valores, metas), os quais como normas que são, vinculam a atuação do Estado, dos Governos, através de pautas formais e materiais, sujeitando negativa e positivamente a conduta de cada um dos três poderes, direcionando, conforme um balanço entre abertura e fechamento, a vontade e o proceder do Poder Público, bem como conformam, ainda quando em outra medida, grau e qualidade, os cidadãos, a sociedade, isto é, a deliberação e o agir comunitários"1.

Mas o que dizer dos tratados Europeus, do pacto orçamental Europeu, que impõe aos Estados o cumprimentos de metas orçamentais rígidas, irrealistas e com consequências sociais devastadoras? Estes critérios e regras orçamentais não são também eles o rosto visível de um programa político-social do neoliberalismo reinante? Os mesmos que se queixam da programaticidade da nossa Constituição, sobretudo quando referida aos direitos sociais lá consagrados, não são os mesmos a defender a imposição, no texto constitucional, de limites do déficee dívida pública? E isso não seria também um programa político, com assento constitucional, e que, por isso, se impõe ao Legislador?

Ainda que sem uma Constituição Formal, não será o projeto Europeu o exemplo mais evidente do recurso à programaticidade transconstitucional?

Uma vez mais o problema não está na forma, programática ou não, mas no conteúdo específico do programa e das metas a alcançar. O programa da Constituição Portuguesa é claro: respeito pelos direitos de quem trabalha, liberdade, igualdade, justiça e solidariedade social. A sua meta é a construção de um Estado Social. O programa da União Europeia é o oposto. A meta, sentimo-la na pele todos os dias: empobrecer os mais pobres, enriquecer os mais ricos. Simples.


1 OLIVEIRA, Fábio, Morte e vida da Constituição Dirigente, Rio de Janeiro, Editora Lumen Juris, 2010, p. 14.

Sobre o/a autor(a)

Advogado
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