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A CPLP e a Guiné Equatorial

Quais são as verdadeiras razões para se aceitar a adesão de uma ditadura à CPLP? A resposta é dolorosamente simples: Petróleo. Negócios.

A CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, cujo primeiro impulso data de 1989 e é fruto da vontade dos países em plena igualdade, tem, desde a sua fundação, um conjunto de princípios orientadores.

Destaco dois dos seus princípios:

e) Primado da Paz, da Democracia, do Estado de Direito, da Boa Governação, dos Direitos Humanos e da Justiça Social;

2. A CPLP estimulará a cooperação entre os seus membros com o objetivo de promover as práticas democráticas, a boa governação e o respeito pelos Direitos Humanos.

A estes princípios junta-se, a promoção e difusão da Língua Portuguesa.

Os povos dos países que integram a CPLP acompanham a sua atividade no contexto mundial, enquanto organização com papel na diplomacia internacional, que se credibiliza ao defender e sustentar práticas democráticas ou quando promove a cooperação multilateral para o desenvolvimento.

Não podemos pois, ficar indiferentes, à decisão da cimeira extraordinária dos ministros dos negócios estrangeiros, realizada em Maputo, no passado dia 20, que recomenda à cimeira dos chefes de estado, que se realizará em Timor no próximo mês de Julho, a aceitação da adesão da Guiné Equatorial à CPLP.

Quais são as verdadeiras razões que levam a esta decisão? É a pergunta que tem que ter resposta.

A Guiné Equatorial é um país governado por um ditador – Teodoro Obiang. Um país com pena de morte! Um país, como denuncia uma ONG portuguesa, e passo a citar: onde “há prisões arbitrárias, julgamentos sumários, perseguições”.

Mas falemos da pena de morte, senhoras e senhores deputados.

Em 2010, repito 2010, foi estabelecido com a Guiné Equatorial um “roteiro” com vista à sua entrada na CPLP – aí era exigida uma moratória sobre a pena de morte, que seria um pequeno primeiro passo para a sua abolição. Mas, só agora, em vésperas da cimeira dos ministros dos negócios estrangeiros foi declarada esta moratória, que tem tudo a dever à dissimulação e nada a uma verdadeira vontade de abolir a pena de morte.

O mesmo em relação ao segundo ponto do dito “roteiro” – a língua portuguesa. É o próprio ministro dos negócios estrangeiros da Guiné Equatorial que assume que o Português será inscrito na Constituição como o seu terceiro idioma, depois do espanhol e do francês.

Perante este quadro, repito a pergunta: Quais são as verdadeiras razões para se aceitar a adesão de uma ditadura à CPLP?

E a resposta é dolorosamente simples: Petróleo. Negócios.

Sim, a Guiné Equatorial é o terceiro produtor de petróleo e gás do continente africano, mas o seu povo vive na mais absoluta das misérias, ao mesmo tempo que uma elite enriquece e se dedica a negócios corruptos investigados em diversos país, desde a França aos Estados Unidos, com sentenças proferidas para a apreensão de bens de luxo e condenações pelo crime de apropriação indevida de bens públicos.

Um povo na miséria – 70% da população muito abaixo do limiar da pobreza e enriquecimento despudorado de uma elite é este o retrato, dramático, mas real.

Mas ficamos a saber que uma empresa estatal da Guiné Equatorial vai injetar 133 milhões de euros no BANIF, o banco dirigido por Luis Amado, um banco intervencionado pelo Estado português.

O BANIF precisa deste capital, não lhe importa a sua origem, quer recapitalizar-se.

O regime ditatorial de Obiang precisa da CPLP para lavar a sua imagem no plano internacional.

Tudo o resto, princípios, direitos humanos, credibilidade de uma organização internacional, como e onde ficam?

Não endeusamos a CPLP, nem alimentamos ilusões num irreal carácter imaculado da organização, sabemos que assim o não é.

Mas não desistimos de preservar a identidade deste espaço particular e do seu papel na conjuntura internacional, que só terá a ganhar ao colocar-se do lado da democracia e da defesa intransigente dos direitos humanos.

O ministro Rui Machete na comissão de Negócios Estrangeiros assumiu uma posição contrária à adesão.

Para espanto de muitos, no final da cimeira veio dizer “que Portugal se sente à vontade com a decisão”. O Governo claudicou, perante a força dos interesses económicos.

Daqui até à Cimeira de Chefes de Estado da CPLP, muitas vozes se levantarão contra esta decisão.

Portugal pode e deve exercer o seu direito de veto em nome da história dos povos, da lusofonia e dos direitos humanos.

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda. Vereadora da Câmara de Torres Novas. Animadora social.
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