Dizem que a guerra é linda, mas não sabem quem ganha

porFrancisco Louçã

13 de September 2022 - 16:24
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A novidade histórica é que esta disputa de hegemonia no Pacífico e global ocorre ao mesmo tempo que a integração entre as duas economias gera dependências mútuas irreparáveis. Se alguém pensa que uma guerra resolverá a atual disputa pela hegemonia, é melhor perceber que o seu resultado é incerto.

O frenesim de viagens oficiais e oficiosas a Taiwan tem mais leitura pelas eleições intercalares norte-americanas do outono do que por uma putativa mudança de estratégia da Casa Branca em relação à China, que, a bem dizer, é desde há muito uma política de confrontação em crescendo. Trump, amigo de Putin e beneficiário do seu jogo nas eleições de 2016, foi escalando o conflito com Pequim em termos comerciais e não é dele o início deste xadrez com Taipé; os sinais de uma ameaça regional foram depois expandidos por Biden, com a consagração maior que é o AUKUS, o acordo militar entre os EUA, o Reino Unido e a Austrália. O tempo de Nixon ao lado de Mao, quando ambos jogavam num espaço tripartido (e com a guerra do Vietname no meio), já acabou há muito.

A novidade histórica é que esta disputa de hegemonia no Pacífico e global ocorre ao mesmo tempo que a integração entre as duas economias gera dependências mútuas irreparáveis. Só assim acontecera, em pequena escala, entre o Reino Unido e a Alemanha no virar do século XIX e levou a duas guerras mundiais no século passado. No entanto, ao contrário desse tempo, a China criou uma grande rede de alianças (concede mais créditos do que o FMI, emprestando a 100 países), realizando investimentos expressivos. O domínio norte-americano é militar (um orçamento de 750 mil milhões de dólares, o triplo do da China), com 800 bases no mundo, e tecnológico em algumas áreas, incluindo a produção cultural na base da língua universal, o que não é pouco mas tem sido desgastado — os EUA fracassaram em todas as guerras em que se envolveram diretamente nas últimas décadas: o Vietname, a Somália, o Afeganistão, o Iraque. Se alguém pensa que uma guerra resolverá a atual disputa pela hegemonia, é melhor perceber que o seu resultado é incerto.

Artigo publicado no jornal “Expresso” a 2 de setembro de 2022

Francisco Louçã
Sobre o/a autor(a)

Francisco Louçã

Professor universitário. Ativista do Bloco de Esquerda.
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