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Dia Mundial da Saúde – A diabetes e os cidadãos 100 anos depois da descoberta da insulina

Através deste manifesto, a Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal vem propor ao Governo português que considere três desafios para fazer a diferença no combate à diabetes.
Através deste manifesto, a Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal vem propor ao Governo português que considere três desafios para fazer a diferença no combate à diabetes.

Neste ano de 2021, sob o signo da pandemia da covid-19, comemoramos 100 anos da descoberta da insulina e 95 anos da Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal (APDP).

A introdução de um dos primeiros medicamentos “milagre” e o aparecimento do movimento associativo de cidadãos com doença leva-nos a lançar esta reflexão para o Dia Mundial da Saúde sobre saúde e cidadania:

Inovar para salvarNos últimos 100 anos, a investigação científica e o desenvolvimento tecnológico, a par do crescimento económico e de novos modelos sociais, permitiram maior qualidade de vida e o aumento da esperança média de vida.

A descoberta da insulina representou uma das maiores inovações em medicina e introduziu o conceito de doença crónica – uma doença mortal tornou-se uma condição para a vida, onde o cidadão é chamado a assumir o seu auto-tratamento. Além dos medicamentos, a tecnologia desenvolvida permitiu maior controlo das pessoas na gestão da sua doença.

Educar para capacitarA inovação só funcionou porque desde cedo se percebeu que a gestão da diabetes tinha de ser centralizada nas pessoas. Para cumprir esse objetivo, definiu-se um novo papel para os profissionais de saúde – o de educadores. Os profissionais têm de ser capazes de usar recursos adequados aos conhecimentos das pessoas de modo a que elas estejam efetivamente capacitadas para as suas novas funções.

O aumento da literacia em saúde, enquanto objetivo relevante para políticas de saúde, não esgota as responsabilidades dos sistemas de saúde para desenvolverem e reconhecerem o papel fundamental da educação para melhores resultados de saúde.

Este processo de educação é hoje entendido também com o envolvimento dos pares e com a participação das associações de doentes, um elo mais próximo das necessidades das pessoas e dos recursos da comunidade (assim nasceu a APDP).

Adequar para melhorarAs doenças crónicas representam hoje o maior consumo de recursos de saúde e são apontadas como uma das maiores ameaças à sustentabilidade dos sistemas de saúde e ao desenvolvimento económico e social. Precisamos de discutir alternativas. Precisamos de melhor atuação na prevenção da doença para termos mais recursos para melhor tratar quem está doente. A organização e os processos de cuidados de saúde têm de estar associados a modelos de financiamento que valorizem os melhores resultados e a eficiência. A avaliação dos resultados deve ser uma constante neste processo que queremos de melhoria.

três desafios para fazer a diferença no combate à diabetes:
Reduzir o risco,
Integrar cuidados,
Garantir o acesso aos cuidados de saúde

É preciso compreender a complexidade da diabetes e abordá-la de uma forma integrada, reconhecendo a importância da ação sobre os seus determinantes sociais e da reforma do próprio sistema de saúde, transformando-o num sistema resiliente e mais bem equipado para cuidar das pessoas que vivem com doenças crónicas, incluindo a diabetes.

Neste Dia Mundial da Saúde, no qual a Organização Mundial da Saúde destaca a importância dos Trabalhadores de Saúde e Cuidadores, é importante que as entidades oficiais e governamentais assumam a implementação de ações sustentadas na experiência e no conhecimento existentes, incluindo o das associações de doentes. Este período de pandemia que vivemos foi e é uma tremenda amostra da importância quer na morbilidade quer na mortalidade das doenças crónicas em geral e da diabetes em particular.

A APDP vem propor ao Governo português que considere três desafios para fazer a diferença no combate à diabetes:

1. Reduzir o risco

É necessário acabar com a visão de que a diabetes é uma doença provocada pelo estilo de vida, sem considerar a sua complexidade, a influência da genética, dos ambientes obesogénicos e o impacto das desigualdades sociais. Uma abordagem da “saúde em todas as políticas” ajuda a projetar comunidades mais favoráveis à saúde e não à doença, através de melhores condições de habitação, emprego, transportes, entre outras políticas sociais. As escolas, de todos os níveis de ensino, devem integrar no seu currículo perspetivas práticas de educação para a saúde. As estratégias de prevenção e diagnóstico precoce devem envolver as organizações de base comunitária, além das unidades de saúde.

2. Integrar cuidados

É fundamental reforçar os cuidados de proximidade, assegurando a sua agilização, garantindo um médico para cada cidadão, e criando uma forte articulação com as autarquias e o sector social. Devem ser implementados novos modelos de prestação de cuidados através da criação de unidades integradas e multidisciplinares, a exemplo do trabalho desenvolvido pela APDP, com objetivos centrados em resultados de saúde relevantes para as pessoas e que promovam a autonomia e os cuidados personalizados e centrados na avaliação de necessidades.

3. Garantir o acesso aos cuidados de saúde

É essencial assegurar o acompanhamento, a vigilância e os cuidados de qualidade das pessoas com diabetes. A aposta na educação terapêutica e no apoio pelos pares deve ser incluída nos serviços de saúde, dada a evidência da sua eficácia para o apoio psicológico, melhoria dos resultados de saúde e bem-estar. O acesso à inovação deve ser garantido com base em modelos de avaliação que incluam as pessoas com diabetes e resultados que, para elas, sejam relevantes. A integração de novas tecnologias e a digitalização da saúde devem ser acompanhadas de estratégias de aumento da literacia em saúde e de mecanismos que assegurem que ninguém fica para trás.

Este é um tempo de mudança que nos desafia e nos desperta para a necessidade urgente de medidas concretas e eficazes. A resposta a estes desafios será tanto mais eficaz quanto melhor formos capazes de incluir as pessoas com diabetes em todos os níveis dos processos de decisão. É necessário mudar o paradigma da comunicação entre as pessoas com diabetes e o sistema de saúde e aproveitar todo o conhecimento que elas podem introduzir.

Artigo publicado no jornal Público a 5 de abril de 2021

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