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A Comuna e a Primeira Internacional
A decisão de criar uma Associação Internacional dos Trabalhadores, chamada mais tarde Primeira Internacional, foi tomada em Londres, a 28 de setembro de 1864, num congresso operário europeu. A AIT atribui-se o objetivo de unir os proletários de todos os países na luta pela sua emancipação, para lá das divisões artificiais criadas pelos Estados.
A ideia de uma tal organização começou a ganhar forma depois dos acontecimentos revolucionários de 1848. A oportunidade para avançar nesta via foi dada pela Exposição Universal de Londres em 1862 à qual assistiram 83 operários parisienses que, nesta ocasião, criaram laços com os seus homólogos ingleses já bem organizados sindicalmente nos Trade Unions.
O Discurso Inaugural da Internacional, redigido por Karl Marx, especificava que “a emancipação dos trabalhadores deve ser obra dos próprios trabalhadores” e declarava agir “pela emancipação definitiva da classe trabalhadora, ou seja pela abolição definitiva do trabalho assalariado”.
Um Conselho Geral, eleito em cada congresso anual, estava encarregue de coordenar a atividade das secções nacionais ou locais de AIT. Estava sediado em Londres.
A história da Internacional em França distingue-se em dois períodos: uma fase “mutualista” ou “proudhoniana”, de 1865 ao primeiro semestre de 1868, seguida de uma fase “coletivista” ou “sindicalista”.
O período mutualista
Os mutualistas proudhonianos eram contrários ao trabalho das mulheres e hostis à greve. Consideravam que as associações mutualistas e as cooperativas eram suficientes para combater o capitalismo. Os coletivistas pronunciavam-se pela luta de classes como o melhor meio de combater o capitalismo e como motor da emancipação dos trabalhadores.
Em França, em janeiro de 1865, é criado um gabinete parisiense da Internacional que se instala na rua des Gravilliers, no IIIº arrondissement. Os seus correspondentes junto do Conselho Geral de Londres são os mutualistas Henri Tolain e Édouard Fribourg que tinham participado no congresso fundador de Londres em 1864. Eugène Varlin, operário encadernador e Benoît Malon, tintureiro, aderem à Internacional desde a sua implantação em Paris.
Em França, de 1865 a 1867, são fundadas secções da Internacional em quatro dezenas de localidades. Estas implantações eram em numerosas regiões à volta de centros importantes: Paris, Caen, Rouen, Lyon, Marselha. O mais das vezes são grupos que contam apenas com algumas dezenas de aderentes. Os primeiros aderentes pertencem ao meio das cooperativas. Em Paris é esse o caso com Camélinat e os trabalhadores das fundições de bronze e com Varlin e os tintureiros.
Em setembro de 1865, ocorreu uma conferência da Internacional em Londres. Eugène Varlin participa. De regresso a Paris, é eleito secretário correspondente, ao lado de Tolain e Fribourg.
O primeiro congresso da Internacional acontece em Genebra de três a oito de setembro de 1866. vota moções a favor da jornada de trabalho de oito horas e da proteção da mulheres e crianças. Os delegados parisienses são os mutualistas Tolain e Fribourg e os coletivistas Varlin, Camélinat e Malon. Varlin fica em minoria no seio da delegação francesa ao pronunciar-se pela melhoria das condições de trabalho das mulheres e não pela sua manutenção no lar.
Em finais de 1867, os quinze membros do secretariado parisiense, entre os quais Tolain, são presos e perseguidos pelo poder imperial por “constituição interdita de associações de mais de vinte pessoas”.
Demitem-se do secretariado. Uma nova comissão parisiense é implementada com Eugène Varlin e Benoît Malon, designados como correspondentes junto do Conselho Geral de Londres. Os novos responsáveis são favoráveis à ultrapassagem do mutualismo e à defesa do coletivismo e do sindicalismo. É o começo do segundo período da Internacional em França.
O período coletivista ou sindicalista
O segundo congresso da Internacional desenrola-se em Lausanne de dois a sete de setembro de 1867. A moção final estipula que “a emancipação social dos trabalhadores é inseparável da sua emancipação política”.
Na década de 1860, numerosas greves tiveram lugar nos principais centros industriais. A lei de 25 de julho de 1864 torna-as menos difíceis porque suprime o delito de coligação. Contudo, a repressão é brutal. Em 1869, treze mineiros são mortos pelo exército em Ricamarie no Loire e catorze em Aubin no Aveyron. Nestes conflitos, a Internacional está presente e ativa. Apoia as reivindicações dos grevistas e organiza a solidariedade financeira. Esta é desenvolvida em Paris, Rouen, Lyon, Marselha e nos arredores destas cidades.
No que diz respeito a Paris, citemos as greves dos encadernadores no Verão de 1864, animados por Eugène Varlin e Nathalie Le Mel, dos trabalhadores das fundições de bronze, em fevereiro e março de 1867, com Camélinat e Theisz, dos cordeeiros, dos curtidores de peles, dos alfaiates...
Estas greves muito duras necessitam da criação de verdadeiras câmaras sindicais e de caixas de solidariedade para ajudar materialmente os operários grevistas. A greve dos encadernadores em 1864 tinha conseguido obter a redução da duração da jornada de trabalho e a abolição do trabalho noturno. Eugène Varlin e Nathalie Le Mel criaram, em 1866, a Sociedade Civil de Poupança e Crédito Mútuo dos Operários Encadernadores de Paris, uma verdadeira câmara sindical que aderiu à Internacional. No Primeiro de Maio de 1866, os encadernadores implementaram um Caixa de Solidariedade e de Luta Interprofissional, a “Caixa dos Centavos”, que ajudava financeiramente os grevistas.
Para ripostar à subida das lutas operárias, o poder tenta, em maio de 1868, um segundo processo contra a secção parisiense da Internacional. Varlin assegura a defesa dos internacionalistas. O tribunal ordena a dissolução da associação e condena os seus dirigentes a três meses de prisão. Por isso, os responsáveis parisienses não poderão participar no 3º Congresso da Internacional em 1868 em Bruxelas, marcado pela predominância das ideias sindicalistas e coletivistas. Estas opção são confirmadas em 1869 no Congresso de Basileia. Nesse mesmo ano, a Aliança Internacional da Democracia Socialista de Bakounine adere à Internacional. Em França, influenciará principalmente as secções de Lyon e Marselha.
Em 1869 e 1870, as numerosas associações operárias transformam-se em sociedades de resistência que já se podem chamar sindicatos, mesmo que o termo seja interdito pelas leis bonapartistas. Um grande número destas associações adere à Internacional como por exemplo os ovalistes (operários da seda) de Lyon.
Sob a égide da Internacional, a 14 de novembro de 1869, uma Federação Parisiense das sociedades operárias é criada. Fica sediada na rua de La Corderie em instalações da Internacional. Em 1870, agrupa 56 sociedade e 40.000 membros.
A 22 de junho de 1870, um terceiro processo é levantado contra a secção parisiense. Malon e três outros réus são condenados a um ano de prisão. Varlin escapa à prisão e exila-se na Bélgica. No momento da queda do Império Francês, em 1870, a situação da Internacional em França é paradoxal. Atingiu um máximo de aderentes, estimados como sendo à volta de 100.000, mas a sua ação está travada pela prisão ou exílio dos seus dirigentes mais emblemáticos.
A 12 de julho de 1870, face às ameaças de guerra, as secções parisienses da Internacional dirigem-se aos seus “irmãos da Alemanha” para lhes dizer que “as nossas divisões apenas levariam a triunfo completo do despotismo nas duas margens do Reno.” Não são escutados e a guerra franco-prussiana, desejada por Bismarck e Napoleão III, eclode.
Os internacionalistas, entre os quais os principais dirigentes que saem da prisão ou voltam do exílio, vão envolver-se, a partir de quatro de setembro de 1870, nas lutas por uma República democrática e social e pela defesa de Paris que fica cercada.
Muitos deles participam na Guarda Nacional e muitos dos seus responsáveis são eleitos oficiais dos seus batalhões. A partir de cinco de setembro, desconfiam do governo dito de Defesa Nacional sediado na Câmara Municipal, o que os leva a implementar e animar nos arrondissements Comités de Vigilância Republicana que se federam no Comité Central Republicano dos vinte arrondissements que fica sediado na rua de la Corderie nas instalações da International.
A sete de janeiro de 1871, no seu célebre “cartaz vermelho”, o Comité dos vinte arrondissements denuncia a incapacidade do govern e lança o apelo: “Lugar ao povo, lugar à Comuna!”
A Internacional e a obra social da Comuna de Paris
Nas eleições legislativas de fevereiro de 1871, dois candidatos da Internacional são eleitos, Malon e Tolain. O primeiro demite-se depois do 18 de março para se consagrar à Comuna; o segundo alinhar-se-á do lado de Versalhes.
A insurreição de 18 de março e as eleições que se seguem fazem nascer a Comuna.
Em 88 eleitos para a assembleia da Comuna, 25 são operários e 38 membros da Internacional. Desempenharão um papel preponderante à frente de serviços públicos como Camélinat responsável pela moeda, Theisz nos correios, Léo Fränkel que anima a Comissão de Trabalho e que se torna desta forma na verdade, apesar de não no nome, o primeiro ministro do Trabalho.
Os membros da Internacional estão presentes e ativos na Guarda Nacional, nos clubes, nos comités da União das Mulheres, nas câmaras sindicais. Deve-se a estes dedicados militantes a obra social considerável da Comuna e as primícias de um direito do Trabalho que não existia anteriormente.
Os internacionalistas pagaram um pesado tributo à repressão. Numerosos pereceram nas barricadas e face aos pelotões de execução como Eugène Varlin massacrado em Montmartre, a 28 de maio de 1871. Sofreram as agrurar da deportação para a Nova Caledónia como Nathalie Le Mel. Muitos exilaram-se para escapar à repressão como Malon, Theisz, Fränkel, condenados à morte à revelia, Camélinat à deportação…
Esta terrível repressão acabou com a ação da Internacional em França. A reação vitoriosa compreendeu o papel emancipatório da Internacional. Com a lei de 14 de março de 1872 coloca-a fora da lei.
No plano internacional, a Internacional gere dificilmente as diferentes tendências do socialismo que a compõem desde 1869. As suas divisões e a queda da Comuna contribuem para provocar o seu fim em 1876.
Em França, antes e durante a Comuna, realizou uma obra de emancipação humana e social considerável que abriu caminho às lutas emancipatórias do século XX. A modernidade dos seus ideais ainda hoje nos interpela.
Yves Lenoir era membro da Associação dos Amigos e Amigas da Comuna de Paris, militante comunista e jornalista.
Texto publicado no site da Associação dos Amigos e Amigas da Comuna de Paris. Traduzido por Carlos Carujo para o Esquerda.net.
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