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Ética e democracia

Ao optar pelo voto contra do Orçamento do Estado para 2021, o Bloco de Esquerda fê-lo consciente por este não assegurar as condições mínimas de eficácia no combate à pandemia sanitária e à crise económica e social que se avoluma.

O Bloco de Esquerda não tem por hábito criticar gratuitamente as forças de esquerda, não se auto-considera o detentor de toda a verdade, nem o único marco aferidor das políticas de esquerda. Não deserta das políticas mais favoráveis aos portugueses, nem transige, com desculpas fáceis dos princípios democráticos e socialistas.

Ao optar pelo voto contra do Orçamento do Estado para 2021, o grupo parlamentar do Bloco de Esquerda fê-lo consciente por este não assegurar as condições mínimas de eficácia no combate à pandemia sanitária e à crise económica e social que se avoluma. Não o fez de ânimo leve, mas teve em conta o acumular de actos de não cumprimento de compromissos anteriormente assumidos pelo governo.

As trapalhadas, que são a fórmula com que no seu entendimento, os dirigentes do PS, se referem aos negócios escuros que envolvem o Novo Banco, são uma razão mais do que suficiente para que o Bloco de Esquerda tenha muitas dúvidas acerca da bondade deste Orçamento e da aplicação dos fundos para ele disponibilizado.

Pode parecer redundante voltar à questão do Novo Banco e da sua entrega ao fundo abutre Lone Star, em condições de secretismo, que não se compaginam com o regime democrático em que vivemos, mas nunca é demais exigir o conhecimento do que o Estado faz com cerca de 4.000 milhões de euros, que já entregou ao Novo Banco.

A transparência absoluta em todos os negócios de Estado constitui um poderoso antidoto contra o populismo galopante.

O anúncio da vinda de um conjunto de fundos europeus para tentar equilibrar a situação económica e social debilitada pelo COVID 19, que foi crismada de bazooka por António Costa, não pode servir para que os chicos-espertos do costume, que abundam na sociedade, deles se apropriem em proveito próprio, para o que se impõe um controlo democrático rigoroso e transparente na forma como se procede à aplicação desses fundos, para que sejam úteis à comunidade e não sirvam apenas para aumentar a riqueza e o aparato de alguns, como o inusitado aumento da compra de automóveis de luxo que se verificou durante a primeira fase da pandemia.

Não é aceitável que continuem a ocorrer os erros de sempre, que levam ao empobrecimento dos trabalhadores e ao desencanto geral da população, pois a extrema-direita capitaliza o medo e aproveita-se muito bem do descontentamento, mantendo-se atenta à espera que o poder lhe caia no colo, mercê dos erros cometidos pelos governos liberais que não conseguem vislumbrar até onde podem errar.

Por todo o mundo, a extrema-direita prolifera com os erros cometidos pela democracia, como os cogumelos na floresta após a chuva.

Às forças de esquerda compete a denúncia permanente dos erros cometidos, mas igualmente promover a sua superação apresentando propostas claras e credíveis que impeçam a classe média de cair nos braços dos populistas e da extrema-direita.

O primado da ética republicana e da Democracia devem ser encarados como a saída para as crises, sejam de carácter sanitário, social ou económica. Quando a Democracia adoece, é sinal que a ética falhou.

Pactuar com o populismo e seus representantes que, como sempre, se procuram afirmar com discursos tonitruantes, substituindo as ideias por decibéis, com chavões de teor fascizante, mentindo, mentindo sempre, pois da mentira alguma coisa fica, como faz André Ventura, não contribui para debelar crises, mas para as aprofundar.

Esta é a situação a que acabamos de assistir nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, onde Donald Trump, o expoente máximo do populismo, da demagogia e da mentira ao não conseguir impor-se eleitoralmente acicatou as hordas de seguidores, com um discurso de ódio, responsável pela invasão do Capitólio, numa desmonstração de que não pode haver democracia sem que ela própria se proteja e sem combater os seus inimigos.

As atitudes racistas e xenófobas, o apontar a culpa ao outro, seja aos ciganos, aos estrangeiros, aos pobres, às mulheres ou a quem quer que seja, devem ser combatidas tenazmente, com coragem e com argumentos políticos.

A direita tradicional, aliada ao liberalismo autoritário, ao não encarar seriamente este problema está a cavar o seu próprio túmulo com as alianças que vai estabelecendo com a extrema-direita, em Portugal e no Mundo, visando responder à insaciável fome de poder e acumulação de riqueza daqueles que representa.

Os sociais-democratas em Portugal, nomeadamente os que se reveem no PS, não devem cometer os erros que os seus parceiros da Europa cometeram. Não é possível, sequer, considerar a possibilidade de estabelecer qualquer forma de acordo com a extrema-direita, que tem como finalidade a destruição da democracia.

Nas próximas eleições, os democratas, devem dar uma resposta clara pela Democracia e pela Liberdade, sem confundir o descontentamento com o apoio à demagogia e à mentira que procura instalar-se com um discurso racista, xenófobo e mentiroso.

Quanto ao Bloco de Esquerda é sabido que sempre manifestou uma oposição clara às políticas de direita e não há quaisquer circunstâncias que levem a alterar essa posição.

Os portugueses sabem que poderão contar com o Bloco para ajudar a implementar políticas que façam uma oposição firme a qualquer transigência à Democracia e à perda de direitos dos cidadãos.

Sobre o/a autor(a)

Reformado. Ativista do Bloco de Esquerda em Matosinhos. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990
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