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Açores: o orçamento a falar mais alto do que a saúde

Foram conhecidas as orientações da Direção Regional da Educação para o próximo ano letivo. Não podendo desdobrar turmas nem tendo salas maiores, as escolas terão de deixar tudo como dantes, não cumprindo o distanciamento que se impõe atualmente em todos os espaços fechados.

Foram conhecidas esta semana as orientações da Direção Regional da Educação (DRE) para o próximo ano letivo.

Surpreendentemente essas orientações não foram apresentadas publicamente pela DRE ou pelo Governo Regional. Numa altura em que o Governo se desdobra diariamente num carnaval de inaugurações de obras já em funcionamento, de apresentações de projetos já apresentados, de anúncios de novas pedras da calçada, seria de esperar que algo tão importante como as regras para o próximo ano letivo merecessem, pelo menos, uma notinha no GACS. No entanto, nada.

Milhares de alunos, pais e encarregados de educação, professores, funcionários não docentes aguardavam por estas orientações. A esmagadora maioria dos açorianos e açorianas. No entanto, o Governo Regional considerou que é mais importante fazer uma inauguração pública de um parque de estacionamento. São prioridades.

No entanto, ao lermos o documento enviado às escolas percebe-se o motivo pelo qual o Governo quis que estas orientações passassem despercebidas.

Sendo impossível neste espaço fazer uma análise completa do mesmo, centrar-me-ei num aspeto essencial.

A pandemia Covid-19 veio trazer a necessidade de impor um conjunto de regras muito rigorosas que todos temos de cumprir e que as entidades públicas e privadas, nas suas instalações estão obrigadas a implementar. Algumas das mais importantes, segundo o conhecimento científico atual, são sem dúvida o distanciamento físico, a utilização de máscara, a lavagem e desinfeção das mãos e as regras de etiqueta respiratória.

De facto as orientações da DRE prevêem que todas estas medidas sejam implementadas nas escolas. Nos refeitórios é necessário manter a distância de pelo menos um metro. Seria de esperar que a mesma regra fosse praticada na sala de aula, onde alunos e professores passam a maioria do tempo. Mas não, diz-se apenas que não há “previsão de redução do número de alunos, ajustando-se, sempre que possível, o tamanho das turmas à dimensão de cada sala”.

Esta “orientação” é profundamente hipócrita. Não estabelecendo um distanciamento mínimo nas salas de aula, a DRE apenas aponta a possibilidade de se fazerem ajustes das turmas às salas. Ou seja, não podendo desdobrar turmas nem tendo salas maiores, as escolas terão de deixar tudo como dantes, não cumprindo o distanciamento que se impõe atualmente em todos os espaços fechados.

Esta orientação tem claramente um caráter economicista inaceitável. Como desdobrar turmas implica contratar professores, ajustar horários de funcionamento das escolas, aumentar frequências de transporte escolar custa dinheiro, então a saúde pública passa para segundo plano. E qual foi o parecer do Diretor Regional da Saúde a estas orientações? Seria importante que se pronunciasse sobre elas.

Garantir a autonomia das escolas é dar-lhes a capacidade para aumentar esses recursos, assim como para reforçarem o seus quadros de pessoal não docente em face das exigentes regras de higienização e desinfeção em vigor.

Parece que a partir de agora, para o Governo Regional, o custo falará mais alto do que a proteção da saúde dos açorianos e açorianas. Já se adivinhava quando, no Orçamento Suplementar, a educação não teve mais um cêntimo do que já tinha anteriormente.

Claramente, esta orientação tem ainda outro problema: o de minar a confiança nas medidas de proteção que estão em vigor e que têm sido aceites e cumpridas de forma generalizada pela população. Esse é um perigo muito sério.

Sobre o/a autor(a)

Deputado do Bloco de Esquerda na Assembleia Regional dos Açores e Coordenador regional do Bloco/Açores
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