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As juras de amor ao Serviço Regional de Saúde dos Açores
Fico deveras impressionado com os sentidos discursos em defesa Serviço Regional de Saúde (SRS) proferidos pelos membros do Governo Regional, especialmente pelo Presidente do Governo, que o repetiu no Dia da Região.
Esses eloquentes elogios ao SRS e aos seus profissionais não poderiam ser mais justos e merecidos. Não desvalorizo essas palavras. Mas as palavras, sem a âncora das ações, são levadas pelo vento. E os Açores são conhecidos pelas suas brisas permanentes e até por violentos vendavais.
Olhemos para os números: anos de sub-orçamentação dos hospitais na região que nem o orçamento da região para 2020, apesar do aumento, debelou...
Olhemos para os números: anos de sub-orçamentação dos hospitais na região que nem o orçamento da região para 2020, apesar do aumento, debelou; redução do orçamento de unidades de saúde de ilha em 2020; intermináveis listas de espera para cirurgias no período pré-pandemia, com doentes anos a fio à espera de uma cirurgia a que se junta a brutal redução de cirurgias durante a pandemia que até atingiram de forma brutal as cirurgias urgentes - números que merecem uma cuidada análise e explicação imediata.
Mas para além dos atos ou omissões com implicações diretas sobre o SRS, há ainda os atos praticado pelo Governo Regional. Há muito que o Bloco de Esquerda alerta para o erro que constituiu o apoio público milionário ao hospital privado que se constrói na Lagoa, ilha de São Miguel. Foram quase 15 milhões de euros de dinheiros públicos para a sua construção. Até teve direito ao estatuto de Projeto de Interesse Regional que lhe garante atrativos benefícios fiscais.
Há muito que o Bloco de Esquerda alerta para o erro que constituiu o apoio público milionário ao hospital privado que se constrói na Lagoa, ilha de São Miguel
E porque consideramos que este investimento é um erro? Em primeiro lugar, esse dinheiro público poderia ter tido outros destinos, a começar por investimentos públicos na área da saúde.
Em segundo lugar, porque num contexto nacional de escassez de médicos, especialmente de médicos especialistas, contexto que se agrava numa região como a nossa que tem enorme dificuldade em atrair médicos de diversas especialidades para o SRS, financiar um hospital privado é um verdadeiro tiro no pé. Neste caso um tiro no SRS.
E não é difícil perceber porquê. Há muito que o Bloco de Esquerda alerta para o perigo de fuga de recursos humanos do Hospital de Ponta Delgada para o novo hospital privado. Aliás, basta olhar para a lista de especialidades dos dois hospitais para encontrar uma curiosa e quase perfeita sincronização.
Mas se o Governo não ouviu o Bloco de Esquerda, terá de ouvir agora também o Sindicato Independente dos Médicos que neste mesmo jornal alertou para o aliciamento aos médicos do SRS com atrativos salários. Os danos que essa fuga de médicos para o privado pode causar no SRS são incalculáveis.
A solução passa pelo investimento no SRS e não por financiar o setor privado
Não tenho grandes dúvidas de que, daqui a algum tempo, o hospital privado da Lagoa será apresentado pelo Governo e pelo PS como uma solução para as listas de espera do SRS que, neste contexto de pandemia, ainda mais se agravaram. Enviar doentes do SRS para o privado será a vendida como a cura para as listas de espera. O problema é que essa “cura”, para além de lucro garantido para o privado será muito mais cara, e terá como consequência o definhar do SRS a prazo, esvaziado-o dos seus recursos humanos e da sua capacidade de resposta.
É preciso que as palavras batam certo com as ações. E até aqui, as juras de amor ao SRS por parte do Governo Regional não batem certo com a realidade.
A solução passa pelo investimento no SRS e não por financiar o setor privado. E por falar em investimento, assinalo um facto sui generis: a nível nacional está em discussão o orçamento suplementar. Na Região o governo nem se compromete com datas nem sequer fala do assunto. É a maioria absoluta no seu melhor: nem se digna a, no mínimo assumir, nem que seja formalmente, a suas responsabilidades democráticas perante o parlamento e os açorianos e açorianas.
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