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Voluntários pelas pessoas sem-abrigo, fotogaleria

Fotogaleria e texto de Ana Feijão.

Quando ficamos em casa, porque temos essa responsabilidade, há quem saia para garantir a saúde e segurança de quem não tem casa. Às pessoas que já se encontravam em situação de sem-abrigo, juntaram-se as que viram a sua vida transformada pela pandemia: a imigrante que vivia e trabalhava no hostel e acabou de ficar sem rendimento e sem tecto e sem possibilidade de voltar à sua rede de apoio, a mulher que perdeu a independência há uns anos depois de ter sido atirada pela janela e de outros actos de violência doméstica, o casal de jovens namorados que terão sido expulsos de casa pela homofobia da sua família, o homem que é analfabeto e não sabe aumentar o volume do rádio no telemóvel para ouvir as notícias da doença, o rapaz que consome heroína e que fazia revelação e impressão de fotografia analógica antes de lhe roubarem a máquina.

Mas isto não é sobre estas pessoas, é sobre a complexidade do que está por trás do que parece ser, simplesmente, o apoio a pessoas em situação de sem-abrigo. É um pequeno retrato do que fazem as outras pessoas que saem das suas casas por solidariedade e respeito, um pequeno retrato da teia de preocupações que não se vê e que circula, invisível, entre os quatro centros de acolhimento e todos os outros lugares onde se lavam as toalhas de banho, se confeccionam as refeições, se compra papel higiénico ou gel desinfectante, onde dezenas de outros bens ou serviços são garantidos.

Quando lá cheguei pela primeira vez, ouvi uma das responsáveis a dizer “já estou a fazer maçãs assadas. Hoje vêm para cá quatro tabuleiros e amanhã faço para lá”. Ela é apenas uma das pessoas que têm de saber se são precisos mais cobertores ou pratos de papel, que têm de saber se todos os turnos dos quatro centros têm técnicas e voluntários suficientes, que têm de gerir os conflitos inesperados, que têm de articular com a equipa médica ou com as equipas de acompanhamento das pessoas que usam drogas. Tudo tem de ser gerido. Lado a lado, estão dezenas de pessoas que saem de casa de forma voluntária e solidária para entregar a toalha de banho e a roupa lavada, cada uma das refeições, ou manter tudo organizado para que tudo seja possível e mais fácil.

Quem constrói diariamente estes espaços sabe que tudo tem de acontecer e que o contexto das pessoas que precisam deste serviço é geralmente mais complexo do que o nosso. A abstinência de álcool ou outras drogas é uma “bomba-relógio”; é preciso espaço e comida também para os cães; as e os utentes devem sair dos quartos durante a limpeza que é feita ao longo da manhã; a medição da temperatura e o rastreio é feito duas vezes em cada dia; os banhos têm de ser feitos em grupos pequenos para minimizar conflitos; é preciso garantir que as pessoas que tomam medicação não se esquecem de a tomar; ter cigarros no bolso é útil para conversar com utentes; as e os utentes precisam de roupas com as quais gostem de se vestir. Tudo tem de ser pensado. Tudo tem de ser feito.