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Que é feito da "empresária" Isabel dos Santos?

Uma "grande empresária", assim foi tratada Isabel dos Santos desde que aqui começou a investir a fortuna do petróleo angolano.
Isabel dos Santos. Foto Tiago Petinga

Proença de Carvalho, advogado de negócios e pivot da articulação dos capitais luso-angolanos, assegurava em 2013 que "não é por ser filha do presidente que [Isabel dos Santos] teve o sucesso que está a ter" (RTP, 28.8.2013). Proença de Carvalho foi, como tantos outros advogados, gestores e políticos portugueses, administrador de empresas controladas por capitais angolanos associados à esfera da cleptocracia dirigida por José Eduardo dos Santos. O agora seu sócio, Jorge Brito Pereira, é chairman da Nos e presidente da Assembleia-Geral da Efacec e dos bancos BIC e BFA, onde Isabel dos Santos detém participações. Brito Pereira controla ainda a Matter Business Solutions, uma empresa-fachada de Isabel dos Santos criada para desviar fundos da Sonangol, petrolífera estatal angolana, para o Dubai.

Com a saída de José Eduardo dos Santos da presidência, a "empresária" caiu em desgraça, e não tardará a surgir quem se apresente surpreendido com o escândalo. Mas há décadas que a família dos Santos, os seus amigos e generais pilham o povo angolano e usam Portugal para reciclar as fortunas da corrupção com a complacência de todos os governos e quase todos os partidos políticos, do PCP ao CDS. A exceção foi o Bloco de Esquerda que, ao longo de 20 anos, denunciou este conluio e os seus protagonistas. Eles estavam no BES, através do BESA e da ESCOM; estavam no BIC gerido por Mira Amaral (PSD) e Teixeira dos Santos (PS), na Finertec, por onde passaram Miguel Relvas (PSD) e Marcos Perestrello (PS); no Finibanco Angola e no obscuro BNI Europa, envolvidos no escândalo Montepio; no BPI e no Millenium Angola, que abrigou o ex-presidente do PSD Fernando Nogueira e também Martins da Cruz, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros do PSD que há dois anos pedia "bom senso" e "recato" na condução do processo contra o vice-presidente de Eduardo dos Santos, Manuel Vicente.

Isabel dos Santos é o expoente da burguesia angolana formada na drenagem da riqueza do país sob o regime comandado pelo seu pai. E a relação dessa burguesia com Portugal mantém uma forte marca na nossa economia, da Banca à indústria, passando pela Comunicação Social, e das famílias políticas aos negócios de família, como os dos grupos Amorim, Mello e Sonae.

Agora, espera-se que o "bom senso" leve a justiça portuguesa a julgar os crimes económicos desta elite e que os estados português e angolano definam soluções justas que protejam o futuro das empresas portuguesas de que Isabel dos Santos se apropriou à custa do povo angolano.

Artigo publicado no “Jornal de Notícias” a 21 de janeiro de 2020

Sobre o/a autor(a)

Deputada. Dirigente do Bloco de Esquerda. Economista.
política: 
Luanda Leaks
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Neste dossier:

Luanda Leaks: a queda de Isabel dos Santos

Os “Luanda Leaks” vieram expor a forma como Isabel dos Santos e Sindika Dokolo construíram o seu império financeiro, em boa parte graças ao financiamento público resultante da influência política de José Eduardo dos Santos. Os negócios, ruinosos para o Estado angolano, serviram para criar a primeira bilionária africana. Dossier organizado por Luís Branco.

Perfil: José Eduardo dos Santos, o déspota discreto

Falecido esta sexta-feira, Eduardo dos Santos chegou ao poder porque era, dos presidenciáveis, o mais fraco. Nos primeiros anos, não “mexeu uma palha”. Mas demonstrou a capacidade de adaptação suficiente para sobreviver à queda do Muro de Berlim, abraçar o capitalismo mais selvagem e ainda enriquecer-se e à sua família. Artigo de Luís Leiria, publicado em dezembro de 2015 no dossier Angola: a ditadura que o mundo não quer ver.

Miguel Relvas, Paulo Portas, Carlos César e Jerónimo de Sousa. Em fundo: José Eduardo dos Santos

Que diziam os partidos sobre a cleptocracia instalada em Angola?

No final da guerra civil, Angola tornou-se uma terra de grandes oportunidades para alguns. Nessa altura, as críticas da direita e do PS ao regime do MPLA foram substituídas pelos convites ao investimento da elite económica angolana. O PCP manteve-se fiel ao MPLA e só o Bloco apontou sempre o dedo aos cleptocratas do regime. Artigo de Luís Branco.

Sede da PwC em Toronto

Empresas de auditoria de novo no centro da fraude

PwC, Delloite, Ernst & Young, KPMG e Boston Consulting são algumas das grandes consultoras que ajudaram Isabel dos Santos e Sindika Dokolo a montarem o seu império de mais de 400 empresas em 41 países, incluindo vários paraísos fiscais.

Quem são os ex-governantes portugueses nos negócios angolanos?

Além de mobilizar redes de influência, a contratação de ex-governantes portugueses permitiu ao regime de Luanda exibir as credenciais de responsáveis democráticos de Portugal. Não foram só advogados e consultores a apoiar e beneficiar do roubo sistemático do povo de Angola. Artigo de Jorge Costa.

Afinal, de onde vêm os Luanda Leaks?

Os mais de 715 mil documentos sobre os negócios de Isabel dos Santos publicados pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação foram entregues por uma plataforma fundada por William Bourdon, advogado que defendeu Assange e defende agora Rui Pinto.

Atuais sociedades de Isabel dos Santos com grandes grupos económicos portugueses.

Os laços de Isabel dos Santos com a elite económica portuguesa

Só explicável pelas características e dificuldades dos próprios processos de formação e acumulação da burguesia portuguesa, este caso é único. Para compreender o Portugal de hoje, é necessário conhecê-lo. (Trechos do livro Os Donos Angolanos de Portugal, de Jorge Costa, Francisco Louçã e João Teixeira Lopes, 2014).

Que é feito da "empresária" Isabel dos Santos?

Uma "grande empresária", assim foi tratada Isabel dos Santos desde que aqui começou a investir a fortuna do petróleo angolano. Artigo de Mariana Mortágua.