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IVA da luz: mais razão, menos ameaças

Na mesa das negociações, o Bloco propôs que, caso a Comissão não aceite a descida por escalões, o IVA da luz deve descer da mesma forma para todos.

Em Portugal paga-se caro pela eletricidade, é sabido. Uma boa parte da fatura é por conta das rendas atribuídas por anteriores governos às grandes empresas elétricas. Em cima disso, Vítor Gaspar colocou 17 pontos de IVA, ao passar a taxa de 6% para 23%.

Porque a eletricidade é um bem essencial, porque a pobreza energética em Portugal é alta e porque os rendimentos da generalidade das famílias são baixos, o Bloco sempre se opôs a este aumento. O PS também, mas depois mudou de ideias.

No ano passado o Bloco levou às negociações para o Orçamento o retorno da taxa de IVA aos 6% e o PS recusou. Apresentamos então outra solução: a descida da taxa de forma faseada, consoante o escalão de consumo. O Governo respondeu-nos que era impossível, que a Comissão Europeia nunca aceitaria. Este ano, face à crescente pressão sobre o tema, é o Governo que apresenta um escalonamento que meses antes tinha garantido que era impossível.

Diz o PS que o faz porque uma descida do IVA para 6% teria um custo orçamental insuportável e impactos ambientais negativos.

Comecemos pelo ambiente. Está estudado que o consumo de eletricidade varia muito pouco com o preço. As pessoas consomem o que precisam e, se puderem poupar na luz, irão gastar noutra coisa. Logo, a questão do aumento desenfreado do consumo elétrico não se coloca. Acresce ainda que, no que parece ser a proposta do Governo, o escalonamento é feito, não pelo consumo, mas por potência contratada. Ora, mais potência permite mas não obriga a consumos maiores. O potencial de injustiça é grande.

Vamos então à questão orçamental. Para começar, devemos ter em conta que a folga orçamental do Governo foi sempre muito superior ao que tinha sido declarado no momento das negociações. Por outro lado, todos os anos se repetem as ameaças de descalabro financeiro por medidas que, como o IVA, custariam cerca de 700 milhões de euros. Mas todos os anos o Estado paga valores semelhantes pelo Novo Banco, por conta da garantia pública de €3900 milhões assinada por Mário Centeno. Mantenhamos em mente então que, nestes assuntos, há sempre dois pesos e duas medidas.

Mas se restassem preocupações, haveria compensações orçamentais possíveis, sim. A subida do IVA dos hotéis, que está na taxa mínima, rende o equivalente à descida do IVA da luz. E, só para recordar, a despesa fiscal do injustificado regime dos residentes não habituais (que deixa os pensionistas estrangeiros isentos de impostos) é de 600 milhões de euros.

Na mesa das negociações, o Bloco propôs que, caso a Comissão não aceite a descida por escalões (de consumo), o IVA deve descer da mesma forma para todos. Caso contrário, os anúncios do Governo seriam uma inconsequente brincadeira de mau gosto. A redução (até aos 6%) pode ser faseada no tempo para mitigar o impacto orçamental.

Texto publicado a 24 de dezembro no Jornal de Notícias.

Sobre o/a autor(a)

Deputada. Dirigente do Bloco de Esquerda. Economista.
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