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Crise da habitação agravou-se em Portugal

O preço das rendas e do valor das casas nas grandes cidades continuou a subir acima das possibilidades das famílias portuguesas. Expansão do alojamento local, benefícios fiscais a não residentes e financeirização da habitação estão por detrás de um problema que o governo parece não querer resolver tão cedo.
Foto de Paulete Matos.

A dificuldade de conseguir pagar uma renda de casa nas grandes cidades portuguesas agravou-se nos últimos anos e não parece ter fim à vista. A subida dos preços do imobiliário não é um exclusivo português e há governos europeus a optarem pela via do controlo de preços do arrendamento. Um estudo do Observatório sobre as Crises e as Alternativas sobre a financeirização da habitação detalhou a evolução do fenómeno em Portugal, a partir da intervenção da troika e da “lei dos despejos” de Assunção Cristas que deram o tiro de partida para a transfornação da habitação num ativo financeiro transacionável, passando pela influência de medidas como os “vistos gold”, o regime fiscal para residentes não habituais ou as isenções fiscais aos fundos imobiliários. 

Em cidades como Lisboa e Porto, o crescimento do turismo e a proliferação do alojamento local contribuíram para expulsar milhares de residentes dos bairros históricos, que viram as suas casas entrarem no mercado do alojamento de curta duração. Os movimentos pelo direito à habitação continuaram a juntar pessoas e organizar vários protestos contra os despejos. 

O impacto do alojamento local sobre os moradores da capital é superior ao de cidades como Barcelona ou Paris e obrigou à imposição de medidas para alargar as zonas de contenção, interditas à abertura de novos estabelecimentos. No Porto, a autarquia continua a dar rédea solta aos promotores e a contrariar as propostas para evitar que o centro da cidade se transforme numa Disneylândia 

Em 2019, a Assembleia da República aprovou uma Lei de Bases de Habitação que pretende responder a esta dificuldade, reforçando o papel do Estado na garantia da função social da habitação. Embora não vá tão longe quanto a proposta inicial, abre caminho à criação de um parque habitacional público e a medidas de proteção dos inquilinos, dando um sinal político da responsabilidade do Estado face à crise que se instalou nos últimos anos.

A resposta à crise da habitação foi um tema presente na campanha eleitoral para as legislativas, e o PS incluiu no seu programa a promessa de erradicar as carências de habitação até 2024. O problema foi quando se descobriu, no debate entre Catarina Martins e António Costa, que os socialistas pretendiam fazê-lo gastando apenas 600 milhões de euros, um valor que não cobre sequer metade da despesa necessária… Prevê-se que o impacto possa ser semelhante ao do programa de renda acessível lançado pelo governo, desenhado para famílias com rendimentos acima da média e que teve uma procura residual nos primeiros meses de existência, quer por parte de senhorios quer de inquilinos interessados. 

Estes números voltarão ser discutidos nas próximas semanas durante o debate do Orçamento do Estado para 2019. O Bloco de Esquerda leva as propostas de acabar com os regimes de privilégio como os vistos gold e os benefícios fiscais a residentes não habituais, e aumentar o investimento público em habitação, por exemplo recuperando património do Estado para o arrendamento a preços acessíveis.    

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